lobo ibérico
Lobo ibérico conservado no Museu de História Natural, Lisboa. Foto: Joana Bourgard

Conservação do lobo-ibérico em Portugal tem novo regime jurídico

A partir de 1 de Janeiro de 2017 entra em vigor o novo regime jurídico da conservação do lobo-ibérico, nomeadamente a proibição do abate, captura ou perturbação da espécie e a destruição dos seus habitats, bem como o regime de indemnizações em caso de ataques de lobo. Mas o decreto-lei, publicado a 25 de Agosto, merece algumas críticas dos conservacionistas.

 

Hoje em dia não se sabe ao certo quantos lobos-ibéricos (Canis lupus signatus) vivem em Portugal. O mais recente censo nacional, de 2002/2003, identificou 63 alcateias (51 confirmadas e 12 prováveis) no Norte e Centro do país. A população de lobo-ibérico em Portugal foi, então, estimada entre 220 e 430 animais. Mais tarde, estudos compilados entre 2003 e 2014 deram conta da existência de 47 alcateias (41 confirmadas e seis prováveis).

Há 28 anos que esta é uma espécie protegida em Portugal, desde que a Lei nº90/88, de 13 de Agosto, estabeleceu pela primeira vez as bases para a protecção do lobo-ibérico. Em 2005 foi classificado com o estatuto de Em Perigo (Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal).

Agora, o Decreto-lei nº54/2016, de 25 de Agosto, desenvolve os princípios da protecção e conservação do lobo-ibérico, consagrados há 28 anos. O documento diz que é proibido abater, capturar e perturbar lobos e destruir as suas áreas de reprodução e repouso. As excepções requerem licença do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

Além disso, em caso de danos provocados pelo lobo, fixa quais as espécies de animais passíveis de indemnização, estabelece os requisitos exigidos para que seja reconhecido o direito a essa indemnização e introduz um mecanismo de cálculo do montante a indemnizar. De acordo com o decreto-lei, as indemnizações por danos causados pelo lobo não podem exceder os 15.000 euros ao longo de três anos.

Os objectivos e ações concretas para conservar a espécie estarão num plano de acção que o ICNF deverá elaborar, no prazo máximo de um ano após a entrada em vigor deste decreto-lei, que será a 1 de Janeiro de 2017. A proposta desse plano terá de ser aprovada por despacho dos membros do Governo das áreas da conservação da natureza e da agricultura.

 

Zero e FAPAS pedem aprovação imediata do Plano de Acção

 

A reacção das associações Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável e FAPAS (Fundo para a Protecção dos Animais Selvagens) a este decreto-lei chegou a 30 de Agosto. As organizações acolhem este “importante instrumento” com “satisfação” e destacam como positivo a explicitação das actividades proibidas, a clarificação do que se deve fazer em caso de dano em animais por ataques de lobo e o pagamento dos prejuízos “apenas e se os rebanhos forem guardados por pastor ou por cão de protecção de rebanho ou quando os animais estão confinados em locais com estruturas adequadas de defesa contra eventuais ataques de lobo”.

As organizações saúdam ainda a diminuição progressiva dos pagamentos para “evitar a fraude e garantir que os proprietários de gado tomam as precauções adequadas”.

Ainda assim, a Zero e o FAPAS dizem estar estupefactos com o facto “de se remeter para daqui a um ano a elaboração do Plano de Acção para a Conservação do Lobo-ibérico quando o mesmo já se encontra finalizado”. As organizações referem-se ao PACLobo 2015-2020, que esteve em consulta pública de 20 de Novembro a 18 de Dezembro de 2015.

O decreto-lei merece um “sinal menos” das organizações por permitir, de forma pouco clara, excepções na proibição de abate ou perturbação de lobos. Ambas as organizações apontam o dedo também à não definição de prazos para a verificação dos danos em animais e conclusão do processo para apurar e indemnizar o proprietário.

Além disso, esta legislação “dá pouca importância ao seu incumprimento”, salientando a Zero e o FAPAS que “faz desaparecer a carga social negativa que até agora era atribuída ao abate de lobos”. O abate de um exemplar desta espécie é considerado “uma simples contraordenação resolúvel com o pagamento de uma multa”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.