Desvendadas as rotas migratórias e as zonas de invernada da águia-calçada

Esta semana foram reveladas as rotas migratórias e os locais de invernada das águias-calçadas que nidificam em Espanha, informação útil para conservar esta ave de rapina, avança a Sociedade Espanhola de Ornitologia (SEO/Birdlife).

 

Durante sete anos, 21 águias-calçadas foram seguidas, através de GPS, pelos técnicos do Programa Migra, da SEO/Birdlife e da Fundación Iberdrola España. Este trabalho resultou em mais de 83.000 localizações, desvendando mais de 194.000 quilómetros percorridos por estas aves nas suas migrações.

 

Águia-calçada. Foto: Juan Lacruz/Wiki Commons

 

A águia-calçada (Aquila pennata) é uma ave rapina migradora que nidifica nas florestas de toda a Espanha. Em Portugal, esta ave pode ser vista, principalmente, de Março a Setembro, segundo o portal Aves de Portugal. É mais fácil de ver no Alentejo, Ribatejo e na Beira interior. “Alguns indivíduos permanecem entre nós durante a estação fria, maioritariamente junto à faixa costeira.”

Os dados da marcação destas 21 aves revelaram que as águias passam cerca de dois meses em migração, cinco meses nas zonas de reprodução e pouco mais de cinco meses nas zonas de invernada. “Estes dados reforçam a necessidade de uma gestão global do habitat em diferentes países ao longo de todo o ano para a conservação da espécie”, defende a organização, em comunicado. “A cooperação internacional é fundamental na altura de criar zonas seguras para as águias-calçadas.”

A maioria destas águias são migradoras transaarianas. Durante a sua migração concentram-se no Estreito de Gibraltar para cruzar o mar e chegar a África. Segundo disse à agência de notícias espanhola EFE Vicente Urios, director do grupo de investigação zoológica de vertebrados da Universidade de Alicante, as águias-calçadas aguardam as condições meteorológicas apropriadas no Estreito para o atravessar, “como se fossem peões num semáforo”.

Depois, atravessam o deserto do Saara. As zonas de invernada situam-se a 2.400 – 3.400 quilómetros de distância das suas zonas de reprodução e abrangem oito países: Mauritânia, Mali, Níger, Burkina Faso, Guiné, Serra Leoa, Nigéria e Chade. Aqui, as aves procuram zonas cobertas por vegetação herbácea e terras de cultivo.

A migração outonal prolonga-se desde o início de Agosto ao início de Outubro, com uma duração média de 23 dias. A migração da Primavera vai desde 25 de Fevereiro a 21 de Março e dura 28 dias. “Estas diferenças devem-se ao facto de no Outono as rotas serem significativamente mais rectas e os dias de paragem menos frequentes”, explica a SEO/Birdlife.

No Outono, a distância diária do voo é maior (143-253 quilómetros/dia) do que na Primavera (136-234 quilómetros/dia). Mas há aves com mais de 400 quilómetros percorridos por dia. As águias-calçadas voam em migração a velocidades entre os 40 e os 70 quilómetros/hora.

Desde a década de 1980 tem havido um aumento das aves que permanecem na Península Ibérica durante o Inverno. Isto “mostra que as aves são bons indicadores das alterações climáticas”, salienta a SEO/Birdlife. Duas das 21 águias marcadas com GPS não migraram para África e decidiram passar o Inverno na albufeira de Valência, a apenas 300-450 quilómetros dos seus ninhos. “Ali se alimentaram em zonas de arrozal e cultivos de regadio entre laranjais, muito diferentes do habitual habitat de invernada da espécie em África.”

Os dados, apresentados nesta quarta-feira, resumem sete anos de trabalho e fazem parte de uma série de publicações do Programa Migra. Esta série têm como objetivo “conhecer a ecologia espacial, movimentos e migração das aves de Espanha”.

“Esta é a primeira monografia que aborda uma espécie alvo do Programa Migra desde o seu começo”, em 2011, comentou Asunción Ruiz, directora da SEO/ Birdlife. “Agora será possível conservar a águia-calçada com maior conhecimento sobre as zonas e habitats que ocupa ao longo de todo o ano e gerir o meio com mais segurança.”

O seguimento das águias-calçadas contou com a colaboração de vários especialistas em rapinas da Universidade de Alicante, Valência, Múrcia, Fundación Migres e da SEO/BirdLife.

Actualmente, o Programa Migra conta com 783 aves marcadas de 32 espécies. Contribuem para este programa mais de 300 colaboradores de 50 entidades em Espanha e no estrangeiro.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais sobre a águia-calçada em Portugal no portal Aves de Portugal.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.