Sobreiro classificado Foto: ATN
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Estas pessoas estão a proteger do fogo a maior mancha de sobreiros da Guarda

Durante todo o ano, várias dezenas de pessoas trabalham para proteger dos incêndios a maior e mais antiga mancha de sobreiros do distrito da Guarda. Desde as crianças que cuidam de um viveiro de árvores na sua escola, à primeira área protegida privada do país e a dezenas de proprietários florestais.

 

O projecto de gestão desta floresta está a decorrer no âmbito da Zona de Intervenção Florestal (ZIF) de Vale de Afonsinho/Algodres, uma área com 2.670 hectares. Aqui, 70% da área está coberta por floresta, especialmente por sobreiros e azinheiras. Esta missão reúne dezenas de proprietários florestais e é gerida pela Associação Transumância e Natureza (ATN), a entidade responsável pela primeira área protegida privada do país, a Reserva da Faia Brava (com cerca de 1.000 hectares nos concelhos de Pinhel e Figueira de Castelo Rodrigo). Há 10 anos que a área protegida faz parte da ZIF.

A Faia Brava, uma das nove áreas piloto do projecto europeu Rewilding Europe – Making Europe a Wilder Place, é assim como um laboratório para a gestão de habitats, especialmente para prevenção de incêndios. “Tem-se feito um grande investimento na Faia Brava para criarmos um modelo de gestão local sustentável de recursos naturais”, através de “projetos para uma conservação a longo-prazo”, explica à Wilder Pedro Prata, coordenador-executivo da ATN.

 

Manada de cavalos garranos em estado semi-selvagem Foto: ATN
Manada de cavalos garranos em estado semi-selvagem
Foto: ATN

 

A estratégia na Reserva da Faia Brava é variada. Passa por campanhas de vigilância contra incêndios, um programa anual de silvicultura preventiva, iniciativas de reflorestação e sensibilização das populações locais.

O ano de 2003 foi de viragem em termos de aposta na preservação da Reserva da Faia Brava. “Nesse ano houve um grande incêndio com graves danos para a região do Vale do Côa. Arderam muitas árvores e o número de sobreiros com mais de 50 anos diminuiu 30%”, recorda Pedro Prata.

Desde então, o compromisso com as florestas saiu reforçado. “A partir daí foi desenvolvido um programa ativo de vigilância”. Todos os anos, desde o calor de maio até às primeiras chuvas de meados de outubro, a reserva é vigiada.

Outra medida foi a integração da Reserva na ZIF de Vale de Afonsinho/Algodres, já que parte da Faia Brava ocupa a mais antiga mancha de sobreiral da Guarda. “Desde 2006, como medida de proteção e prevenção, integrámos a Faia Brava na Zona de Intervenção Florestal (ZIF) responsável pela gestão sustentável do sobreiral.”

 

Sobreiro classificado Foto: ATN
Sobreiro classificado. Foto: ATN

 

A partir desta organização associativa de proprietários na ZIF, Pedro Prata conta que são coordenadas diversas ações preventivas de silvicultura, nomeadamente desmatações para limpeza, criação de barreiras de floresta nativa, coordenação de sistemas de alerta, manutenção de acessos e criação de contactos com a Proteção Civil e com os Bombeiros.

 

Controlo de matos Foto: ATN
Controlo de matos. Foto: ATN

Factor importante é o peso económico da cortiça. “Caso se registe alguma ocorrência, todos os proprietários têm muito a perder. Portanto, a união de esforços contra os incêndios acaba por resultar”.

“Importa ressalvar o trabalho de permanente cooperação que é desenvolvido com esta associação de proprietários florestais”, enfatiza o coordenador da ATN.

 

E já tem sido necessário testar o funcionamento deste modelo. De acordo com Pedro Prata, “vários focos de incêndio foram rapidamente circunscritos graças à ativação desta grande rede de contactos”, a funcionar desde o soar do alerta até à chegada dos bombeiros ao local.

Segundo Pedro Prata, o planeamento de estratégias de proteção e vigilância das florestas tem-se revelado bastante vantajoso para a Reserva da Faia Brava. “Além dos voluntários, temos um contacto efetivo com as autoridades e com os meios de combate a incêndios e, até agora, já foram apanhados vários incendiários em flagrante”.

Curiosamente, admite que o exemplo dos que são apanhados talvez seja uma das melhores formas para desencorajar futuras tentativas por parte dos mesmos ou de outros cidadãos. “Tenho vindo a verificar que o exemplo funciona”.

 

Vista do Pombal da Bicha para o Vale do Rio Côa Foto: ATN
Vista do Pombal da Bicha para o Vale do Rio Côa
Foto: ATN

 

Mas o trabalho da ATN é pensado a longo prazo. “A nossa estratégia não é apenas direcionada para apagar fogos. Há um importante programa de educação ambiental que visa sensibilizar a população e formar as gerações futuras”, sublinha.

Pedro Prata destaca o trabalho que é desenvolvido junto da comunidade. “São organizadas várias ações de recrutamento de voluntários para diversas atividades como, por exemplo, iniciativas de reflorestação ou a recolha e a preparação das sementes no viveiro florestal da ATN”.

 

Viveiro Foto: ATN
Viveiro. Foto: ATN

 

A comunidade escolar é envolvida de uma forma especial, pois é dentro de uma escola que está o viveiro da associação. “O facto de as crianças acompanharem o crescimento das plantas e poderem participar nas sementeiras acaba por cativá-las”.

 

Viveiro Foto: ATN
Viveiro. Foto: ATN

 

Por outro lado, continua em curso a campanha “Um Milhão de Sementes para o Vale do Côa”, iniciada em 2008 no âmbito do projeto “Bosques da Faia Brava”. Trata-se de uma iniciativa de voluntariado para a conservação do bosque autóctone.

Freixos, sobreiros e azinheiras são algumas das espécies que estão na lista das árvores a plantar. “O objetivo é incentivar todos os participantes a recolher e a semear o maior número possível de sementes de árvores autóctones. Um milhão, como meta a atingir, acaba por funcionar como um número inspirador”.

 

Vista para o Vale do Côa a partir do lado de Cidadelhe Foto: ATN
Vista para o Vale do Côa a partir do lado de Cidadelhe
Foto: ATN

 

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Este texto foi editado por Helena Geraldes.

 

[divider type=”thick”]Série Wilder Cuidadores de Florestas

Nesta época crítica para as florestas, marcada por incêndios, não vamos falar de área ardida nem tentar explicar as causas desta calamidade. Queremos antes mostrar os portugueses que estão a cuidar das florestas ao longo de todo o ano. Nesta série falámos com os responsáveis por alguns dos melhores projectos de prevenção de fogos e de enriquecimento de florestas e ouvimos as histórias de cidadãos que arregaçam as mangas pelas árvores. Estes são os Cuidadores de Florestas.