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Foto: Equipa de Biogeografia NOAA CMA

Grupo internacional de 39 ONGs exige fim da mineração dos fundos marinhos

Um apelo mundial para que se ponha um travão ao interesse comercial na exploração mineira dos fundos marinhos foi lançado esta sexta-feira na Conferência da ONU sobre Oceanos, por 39 organizações de defesa do ambiente, no último dia do encontro em Nova Iorque.

 

“A mineração dos fundos marinhos não é necessária num mundo que está comprometido com uma produção e consumo sustentáveis, ao abrigo da Agenda 2030”, discursou Monica Verbeek, directora-executiva da Seas at Risk, uma organização internacional que junta 34 ONG (organizações não governamentais) que lutam pela protecção do ambiente marinho na Europa e a nível internacional.

“A menos que paremos para refletir arriscamo-nos a arruinar um dos nossos ecossistemas mais valiosos que tem um papel vital na saúde do nosso planeta, em prol de um sonho obsoleto de crescimento ilimitado”, acrescentou ainda a directora da Seas at Risk, na Conferência da ONU sobre Oceanos.

Nesta campanha que quer colocar um travão à mineração dos fundos marinhos, participam ainda outras quatro entidades – Mission Blue, BLOOM, Deep Sea Mining Campaign e Earthworks.

“Cerca de 90% do lixo electrónico mundial é ilegalmente comercializado ou descartado. Todos os anos na União Europeia, 100 milhões de telemóveis ficam inutilizados, dos quais se reciclam menos de 10%”, refere um documento conjunto assinado pelas 39 ONGs, que apontam para “uma enorme quantidade de ouro e outros metais que são desperdiçados”.

“Estes valores indicam que há um enorme potencial nas políticas de aumento da eficiência de recursos a nível mundial e a importância de nos centrarmos por exemplo na mineração urbana, em vez da mineração nos fundos marinhos”, acrescentam.

O mar profundo representa 90% dos mares e oceanos e funciona como um importante regulador da biosfera. “Muitas das espécies ali residentes têm baixa produtividade e são extremamente vulneráveis aos distúrbios causados por humanos.”

 

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Recifes de coral. Foto: NOAA

 

Em contrapartida, a procura por matérias-primas está a despertar um interesse comercial crescente, devido ao potencial que os fundos marinhos podem ter na exploração de sulfidos polimetálicos, nódulos de manganês, zonas ricas em cobalto, hidratos de metano e fosfato.

“A mineração coloca potencialmente riscos significativos aos sítios propriamente ditos e à coluna de água que fica acima, como foi indicado entre outros pelo projecto de investigação Midas, financiado pela União Europeia”, sublinham as ONG, que receiam a destruição irreversível de ecossistemas e a perda de biodiversidade.

Até hoje, por todo o mundo, cerca de 1,2 milhões de quilómetros quadrados de fundo marinho foram licenciados para exploração na área internacional marinha, ocupando um espaço quase do tamanho da Europa.

Nas áreas de mar profundo sem jurisdição nacional, consideradas ‘herança comum da humanidade’, a mineração é governada pela International Seabed Authority (ISA), criada em 1982 no âmbito da ONU. A ISA concede licenças para a pesquisa e também para exploração de minérios.

 

Quantas licenças já foram concedidas?

 

Até hoje, foram concedidas licenças a 26 países para pesquisarem a existência de minérios (‘exploration licenses’), entre os quais Brasil, Bélgica, Cuba, França, Alemanha, Singapura e Reino Unido. Para já, a ISA não emitiu contratos de exploração.

Por outro lado, ao nível dos governos foram entregues duas licenças para pesquisa: uma pela Papua Nova Guiné e outra pela Arábia Saudita e Sudão. “A mineração ainda não começou  mas estão em curso planos para uma fase piloto”, adianta a Seas at Risk.

A organização apelou à ISA, à União Europeia, à ONU e a todos os países para colocarem um ponto final na exploração dos recursos minerais marinhos, apostando em vez disso na economia circular.

“Portugal tem sob a sua jurisdição enormes áreas de grandes profundidades, o que faz do nosso país um dos guardiões a nível mundial dos valiosos e frágeis ecossistemas que aí existem”, declarou Gonçalo Carvalho, presidente da Sciaena, ONG da Seas at Risk,onde estão também a Quercus, a Liga Portuguesa para a Natureza e o Geota.

“Temos que apostar na investigação e no conhecimento do mar profundo, mas também temos a oportunidade de liderar nas indústrias emergentes ligadas à economia circular e às novas tecnologias relacionadas com as renováveis”, concluiu.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.