Há um lince-ibérico no Norte de Portugal vindo de Espanha

O lince-ibérico Kentaro, que nasceu em Silves e tinha sido reintroduzido em Espanha em Novembro passado, entrou nesta terça-feira em Portugal, estando agora a Norte de Vimioso, distrito de Bragança, revelou esta tarde o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

 

Kentaro nasceu no Centro Nacional de Reprodução do Lince-ibérico (CNRLI), em Silves, e foi libertado a 26 de Novembro de 2014 nos Montes Toledo (em Castela-La Mancha). Este foi um dos locais escolhidos para tentar criar quatro novas populações desta espécie (com cinco fêmeas por área) – em Portugal, na Extremadura espanhola, Castela-La Mancha e continuar o trabalho na Andaluzia – no âmbito do programa ibérico Iberlince (2011-2016). O objectivo é recuperar a distribuição histórica do lince (Lynx pardinus).

Agora existem 12 linces-ibéricos registados e a ser seguidos em Portugal.

Kentaro é irmão de Kahn, o lince-ibérico que entrou em Portugal em finais de Maio, após percorrer mais de 1.500 km. Kentaro tinha, então, percorrido praticamente a mesma distância, mas em sentido oposto.

“Os dois têm sido a prova da grande capacidade de dispersão desta espécie”, escreve o ICNF em comunicado. Tudo isto se sabe por causa das informações fornecidas por colares de GPS, que os animais transportam. “Kahn e Kentaro viajaram distâncias maiores do que as registadas até agora para a espécie, superando amplamente os 2.500 km em movimento.”

Kentaro, ao contrário de seu irmão, permaneceu mais tempo na área em que foi solto. Em Janeiro iniciou o movimento de dispersão, mas em sentido contrário, até ao rio Tejo, na Barragem de Castrejon. Desse local, deslocou-se até às proximidades da cidade de Toledo e mais tarde, utilizando o corredor do rio Tejo, entrou nas províncias de Madrid, Cuenca e Guadalajara até às barragens das cabeceiras da bacia deste rio. Aqui cruzou o rio em direção a Norte. Mais tarde, explorou as províncias do sul de Soria e Zaragoza, voltando novamente para Soria, conseguindo chegar à região de La Rioja. Daí, deslocou-se para oeste, pela região de Zamora, tendo entrado em Portugal, a norte de Vimioso nesta terça-feira.

Actualmente, Kahn encontra-se no concelho de Ourique.

O instituto salienta a “notável” capacidade de sobrevivência dos dois linces. Ambos “têm alternado as suas áreas de dispersão, com diferentes densidades de coelho-bravo, substituindo a sua principal fonte de alimento por outras, alternativas, como roedores e cervídeos, comportamento documentado em outras áreas da presença deste felino, principalmente grandes machos”.

Hoje há duas populações estáveis em Espanha, mais concretamente Doñana-Aljarafe e Cardena-Andújar. Além destas têm sido reintroduzidos linces em quatro outras regiões para tentar criar novas populações: Guadalmellato (Córdova) e Guarrizas (Jaén), ambas na Andaluzia, Hornachos-Valle del Matachel (Extremadura espanhola), Campo de Calatrava e Montes de Toledo (Castela-La Mancha) e no Vale do Guadiana (Portugal).

Segundo o mais recente Censo às Populações Andaluzas de Lince-ibérico, relativo ao ano de 2014, existem hoje 327 linces-ibéricos na natureza, dos quais 97 são fêmeas e 71 crias.

O trabalho feito na conservação da espécie – in-situ (no terreno, como por exemplo melhoria do habitat e sensibilização das populações) e ex-situ (como a reprodução em cativeiro) – conseguiu retirar este felino da linha da frente da extinção. A 23 de Junho deste ano, a União Internacional de Conservação da Natureza (UICN) entendeu estarem reunidas as condições para reduzir a categoria de ameaça de “Criticamente em Perigo” para “Em Perigo”.

Mas é preciso cautela, disse na altura à Wilder Urs Breitenmoser, o co-presidente do Grupo de Especialistas em Felinos da UICN. “Apesar de esta reclassificação ser um primeiro grande passo e um grande sucesso conservacionista, temos de enfatizar que o lince-ibérico ainda está Em Perigo. De forma alguma esta é uma categoria satisfatória. Os esforços de conservação precisam mesmo de continuar.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.