flores amarelas num fundo preto

Lista Vermelha 2016: há mais de 24 mil espécies ameaçadas no planeta

A nova Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), organização sediada na Suíça, foi divulgada ontem em Cancún (México). Em 2016 há pelo menos 24.307 espécies ameaçadas de animais, plantas e fungos. Entre as boas notícias desta lista mundial está o priôlo dos Açores.

 

O priôlo (Pyrrhula murina) – ave com 30 gramas, cabeça, asas e cauda pretas e que só vive num cantinho montanhoso da ilha de São Miguel – encabeça os exemplos das boas notícias de 2016 na Lista Vermelha da UICN. Este instrumento nasceu em 1964 para ser o indicador da saúde da biodiversidade mundial. Todos os anos dá informação e analisa o estatuto, tendências e ameaças às espécies, para incentivar a conservação da biodiversidade.

Estima-se que hoje existam 1.250 priôlos em todo o planeta. Mas em 2003 eram apenas 400. Esta pequena ave açoriana passou do estatuto de Ameaçada, que tinha no ano passado, para apenas Vulnerável, o mais baixo para espécies em risco de extinção. A razão da mudança foi uma “genuína alteração de estatuto” da espécie e não por causa de uma revisão taxonómica ou do aparecimento de novos dados. Segundo a UICN, “a sua população recuperou do limiar da extinção, graças aos incansáveis esforços de conservação”.

A recuperação desta espécie começou em 2003, numa altura em que a espécie estava classificada como Criticamente Ameaçada de extinção por causa da falta de alimento. A floresta Laurissilva estava a recuar e as espécies exóticas ganhavam terreno. Em 2010 passou a ser “apenas” uma espécie Em Perigo, graças aos projectos de melhoria do seu habitat. Actualmente está a decorrer o terceiro projecto de conservação da ave – LIFE Terras do Priôlo -, que termina em 2018.

“Esta melhoria, resultante de um intenso trabalho de conservação desenvolvido pela Spea – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves, Governo dos Açores e mais parceiros há mais de 14 anos, não significa que o priolo esteja fora de perigo e é necessário muito trabalho para garantir a sobrevivência desta espécie única dos Açores”, escreve a Spea em comunicado.

Mas há outras espécies de aves que não têm tido a mesma sorte do priôlo, ou da rola-Santa-Helena (Charadrius sanctaehelenae) e da felosa-de-olho-branco das Seychelles (Zosterops modestus), outros exemplos de boas notícias de 2016.

Este ano, a Lista Vermelha avaliou um total de 85.604 espécies de animais, plantas e fungos. O grande objectivo é chegar às 160.000 em 2020. Se este número parece grande, é na verdade pequeno, se pensarmos que há hoje 1.736.081 espécies descritas pela Ciência. Este ano, a Lista Vermelha avaliou apenas 5%.

Das 85.604 espécies avaliadas, 24.307 estão ameaçadas, incluindo 5.210 Criticamente Ameaçadas de extinção.

Um dos exemplos realçados pela UICN é a icónica girafa (Giraffa camelopardalis). O animal terrestre mais alto está agora ameaçado de extinção. Esta espécie passou de Pouco Preocupante para Vulnerável, com um dramático declínio de 36% a 40%. Em 1985 existiam entre 151.000 e 163.000 girafas; em 2005 eram apenas 97.562. “O aumento da população humana está a ter um impacto negativo em muitas subpopulações de girafas. A caça ilegal, a perda de habitat e alterações por causa da agricultura e actividade mineira e conflitos civis estão a empurrar a espécie para a extinção”, escreve a UICN em comunicado.

Das nove subespécies de girafas, três têm populações a crescer, uma está estável e cinco estão a diminuir. Em Setembro, o Congresso Mundial para a Conservação adoptou uma resolução para apela à acção para reverter o declínio das girafas.

“As girafas são facilmente vistas em safaris, nos media e em zoos. Por isso, as pessoas – incluindo os conservacionistas – não se apercebem que estes animais majestosos estão a viver uma extinção silenciosa”, disse Julian Fennessy, do Grupo Especialista em Giragas e Okapis da UICN.

Outra espécie bem conhecida de todos também preocupa a comunidade internacional e mostra como algumas das aves mais populares podem desaparecer da natureza. É o papagaio-cinzento-africano (Psittacus erithacus), ameaçado pela perda de habitat e tráfico. Esta espécie nativa da África Central passou de Vulnerável a Ameaçada. Um estudo da Birdlife International descobriu que, em algumas regiões do continente, as populações deste papagaio registaram declínios de 99%.

Uma das novidades da Lista Vermelha de 2016 é a revisão taxonómica das as espécies de aves do planeta. Hoje sabe-se que existem, pelo menos, 11.121. Foram avaliadas 742 novas espécies de aves, muitas das quais eram consideradas até agora subespécies de outras espécies. 11% delas estão ameaçadas. Como a carriça Thryophilus sernai, descoberta em Março de 2010 na Colômbia e descrita como nova espécie em 2012. Esta entrou para a Lista como Ameaçada, uma vez que mais de metade do seu habitat pode ser destruído por causa da construção de uma barragem, já prevista.

Treze das espécies de aves agora reconhecidas entram para a Lista como Extintas. Várias desapareceram nos últimos 50 anos, especialmente em ilhas como as Galápagos e Bermuda. “Infelizmente, reconhecer mais de 700 ‘novas’ espécies não quer dizer que o mundo das aves está a melhorar”, disse Ian Burfield, coordenador para a Ciência mundial na Birdlife. “À medida que aprofundamos o nosso conhecimento, as nossas preocupações confirmam-se: a agricultura não sustentável, o abate de florestas, as espécies invasoras e outras ameaçadas – como o comércio ilegal – ainda estão a empurrar muitas espécies para a extinção.”

“Muitas espécies estão a escapar por entre os nossos dedos antes mesmo de as conseguirmos descrever”, comentou Inger Andersen, a directora-geral da UICN, em comunicado. “Esta actualização da Lista Vermelha mostra que a escala da crise mundial da extinção de espécies pode ser maior do que aquilo que pensámos.”

 

[divider type=”thick”]Saiba mais. Aqui ficam alguns números importantes sobre a Lista Vermelha 2016:

Espécies Criticamente Em Perigo (5.210):

Mamíferos: 204 (menos 5 do que em 2015)

Aves: 225 (mais 7 do que em 2015)

Répteis: 237 (mais 57 do que em 2015)

Anfíbios: 546 (mais 18 do que em 2015)

Peixes: 461 (mais 15 do que em 2015)

Insectos: 226 (mais 50 do que em 2015)

Moluscos: 586 (mais 10 do que em 2015)

Outros invertebrados: 211 (mais 2 do que em 2015)

Plantas: 2.506 (mais 159 do que em 2015)

Fungos: 8 (mais 3 do que em 2015)

Espécies Ameaçadas: 7.781

Espécies Vulneráveis: 11.316

Espécies Ameaçadas em Portugal (282):

Mamíferos: 13

Aves: 14

Répteis: 4

Anfíbios: 1

Peixes: 63

Moluscos: 76

Outros invertebrados: 27

Plantas: 82

Fungos: 2

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.