lobo ibérico
Lobo ibérico conservado no Museu de História Natural, Lisboa. Foto: Joana Bourgard

ONGA apreensivas quanto à nova estratégia nacional de conservação

Seis organizações ambientalistas apresentaram hoje ao Governo a sua opinião sobre a Estratégia Nacional da Conservação da Natureza e da Biodiversidade, em consulta pública até 30 de Setembro. Dizem-se “apreensivas” e lamentam que o documento seja “mais do mesmo”.

 

A conservação da natureza em áreas privadas não é reconhecida explicitamente pela Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e da Biodiversidade, denuncia a Coligação C6, coligação portuguesa de Organizações Não Governamentais de Ambiente formada pelo GEOTA, FAPAS, LPN, Quercus, SPEA e WWF em Portugal.

A consequência disto? Só quem tem terrenos em áreas de Rede Natura 2000 ou na Rede Nacional de Áreas Protegidas pode ter benefícios das medidas de conservação da natureza que implementar. A C6 sugere o envolvimento, “desde o início”, das “partes interessadas nestes processos através de planos de co-gestão ou de gestão participativa”.

Esta é uma das propostas que os ambientalistas gostariam de ver integradas neste documento de 89 páginas que revê a Estratégia Nacional, em consulta pública desde 12 de Junho.

São 30 objectivos a implementar até 2025, traduzidos em 100 medidas para melhorar a conservação de espécies e habitats e promover o reconhecimento do património natural e a apropriação da biodiversidade. A nova Estratégia vem preencher um vazio desde que a versão anterior, aprovada em Conselho de Ministros a 20 de Setembro de 2001, deixou de estar em vigor, em 2008.

Em geral, a C6 considera que “este é um texto muito descritivo de instrumentos e infraestruturas existentes sem, todavia, concretizar medidas e acções específicas”. Em comunicado, lamenta, por exemplo, que não haja uma “identificação clara das necessidades e das fontes de investimento público para a sua concretização” nem “compromissos concretos e ambiciosos sobre financiamento”.

A C6 vai mais longe e diz que este “documento revela a confirmação do continuado desinvestimento público na gestão dos recursos naturais”.

Para tentar resolver este “calcanhar de Aquiles”, a coligação sugere a programação dos próximos instrumentos de investimento público regional e a definição de Programas Específicos de Valorização das Áreas Protegidas e que aí se concentrem os investimentos. Além disso, propõe que o próximo POSEUR assente em Programas de Investimento em Conservação de Espécies ou Habitats e que o Fundo Ambiental “invista realmente em conservação da natureza”.

Além da questão do investimento em conservação, a C6 aponta outras melhorias para que, no seu entender, a revisão da Estratégia “contribua verdadeiramente para a protecção do capital natural nacional”.

Uma das alterações propostas diz respeito à municipalização da gestão das Áreas Protegidas. Ainda que as organizações reconheçam a importância das autarquias e entidades locais na conservação, contestam a desresponsabilização do Governo. Esta situação irá levar à “diminuição do investimento público directo (recursos humanos e orçamento) na conservação da natureza” e à “potenciação dos riscos (…) de atentados aos valores naturais praticados por autarquias”. Isto pode acontecer no âmbito dos planos directores municipais ou em processos de licenciamento, muitas vezes claramente violando a Lei.

Além disso, a C6 lembra que “a esmagadora maioria das autarquias não possui quadros técnicos ou competências adequadas e independentes para assegurar a isenção e o rigor necessários às exigências de uma gestão activa e comprometida com a conservação”.

A C6 propõe ainda a definição clara da forma como se podem integrar as políticas que têm um efeito forte na conservação da natureza. No documento, “as referências a áreas como a agricultura, a floresta ou a cinegética são bastante relativas e diminutas”.

“As ONGA da C6 consideram que este é um ponto crítico para o sucesso de qualquer Estratégia de Conservação da Natureza e da Biodiversidade já que a política da conservação da natureza depende muito mais da estratégia e afirmação de outras políticas do que dela própria.”

As organizações defendem ainda medidas concretas e modelos de pagamento dos Serviços de Ecossistemas, algo que a estratégia aborda mas não especifica.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Conheça aqui 10 objectivos da Estratégia Nacional.

Consulte aqui o documento integral da Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade e os respectivos anexos.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.