lobo ibérico
Lobo ibérico conservado no Museu de História Natural, Lisboa. Foto: Joana Bourgard

Poderíamos ter 14.000 km2 de áreas para a vida selvagem

No Dia Internacional da Vida Selvagem, que hoje se celebra em todo o mundo com o tema “O Futuro da Vida Selvagem está nas nossas mãos!”, as organizações portuguesas Zero e FAPAS propõem um novo modelo de áreas protegidas. Nas suas contas, Portugal poderia ter 14.000 quilómetros quadrados de áreas para a wilderness.

 

O modelo tradicional das áreas protegidas chegou a Portugal no início dos anos 70 do século passado. Hoje são 46 as áreas protegidas, entre elas um parque-nacional, 13 parques naturais, nove reservas naturais e uma área protegida privada.

Agora, a Zero – Associação Sistema Terrestre Sustentável e o FAPAS – Fundo para a Protecção da Vida Selvagem acrescentam um novo modelo ao propor a criação de áreas para a vida selvagem (wilderness) em zonas de baixo valor económico mas com elevada aptidão para a conservação. Com base em trabalhos científicos, os conservacionistas estimam que Portugal tem potencial para criar cerca de 14.000 quilómetros quadrados de wilderness.

Estas são “áreas isoladas onde o acesso e influência humana é, em regra, limitado” e têm, “pelo menos, 2.000 hectares”, escrevem as associações em comunicado. Nestas novas áreas, os processos ecológicos desenvolvem-se sem intervenção humana “e com elevada aptidão para a vida selvagem e para a promoção de serviços de ecossistema”.

Além de contribuírem para a protecção do solo, para manter a qualidade e quantidade de água, para regular o clima, o ciclo da água e dos nutrientes, a renaturalização do território “é fundamental para preparar a potencial chegada ao nosso país do urso-pardo (Ursus arctos arctos) ou para consolidar a população de lobo-ibérico (Canis lupus signatus).

Para que isto aconteça, as suas associações pedem a reconfiguração da Rede Natura 2000, a revisão do Regime Florestal (para garantir o fornecimento de serviços dos ecossistemas) e a reformulação da Lei dos Baldios (para cumprir fins de conservação da natureza). Além disso, seria uma forma de promover uma nova geração de jovens cuidadores da paisagem e da biodiversidade.

A Zero e o FAPAS acreditam que nestas novas áreas há condições para “novas actividades e negócios compatíveis com a conservação da biodiversidade e dos ecossistemas”, como a criação de infraestruturas verdes ou a produção e comercialização de produtos locais.

E em Portugal já existem dois exemplos que adoptaram esta linha de pensamento. A Associação Transumância e Natureza (ATN), através da iniciativa europeia Rewilding Europe, está a apoiar a renaturalização de áreas abandonadas nos vales dos rios Côa e Águeda (na Reserva da Faia Brava), através da reintrodução de cavalos, vacas, corços e cabras-montês e de sistemas seminaturais de pastoreio.

O outro exemplo é o Parque Nacional da Peneda-Gerês, com uma extensa área sem intervenção humana.

As duas associações consideram crucial o envolvimento activo do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) neste processo e realçam a “necessidade de investimento na conservação da biodiversidade e dos ecossistemas em Portugal, de forma a gerar mais emprego e melhor qualidade de vida”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.