Tartaruga de Blanding. Foto: Andrew C./Wiki Commons

Projecto no Canadá trava morte de centenas de tartarugas na estrada

Long Point Causeway, uma estrada na região do Ontario, no Canadá, já foi considerada uma das mais mortíferas do mundo para as tartarugas. Agora, um novo projecto comunitário está a salvar grande parte destes animais, incluindo espécies raras.

 

Desde 1979, num troço de estrada com duas faixas e 3,6 quilómetros de comprimento, um total de 10.000 animais, de 100 espécies diferentes, eram mortos por atropelamento todos os anos, estimam os investigadores.

Os mais afectados, em grande número, eram os anfíbios, mas a morte das tartarugas era a maior preocupação. Há várias espécies de tartaruga que se reproduzem na Big Creek National Wildlife Area, reserva natural onde se situa esta estrada. Muitas só atingem a maturidade sexual até 20 anos depois de nascerem, o que dificulta a sua conservação.

Em 2003, Long Point tinha arrecadado a quarta posição no top dos locais do mundo onde morrem mais tartarugas na estrada (a seguir a dois sítios na Florida e um no Montana). Entre as espécies afectadas estão a tartaruga de Blanding, a tartaruga-víbora (Chelydra serpentina) e ainda a tartaruga-pintada (Chrysemys picta).

 

Tartaruga de Blanding. Foto: Andrew C./Wiki Commons

 

O projecto de melhoramento da estrada, que custou quase 2 milhões de euros, foi lançado em 2006, num encontro de residentes locais e de grupos comunitários preocupados com a situação. Foi financiado por associações locais, pelo estado de Ontario, pelo governo canadiano e ainda por uma associação ambientalista dos Estados Unidos.

Objectivo? Testar várias formas de travar as mortes das tartarugas, e também das cobras, em Long Point Causeway.

 

Condutores acertavam de propósito

 

Os responsáveis pelo projecto descobriram, por exemplo, que os sinais de aviso colocados na estrada deixavam de ter a atenção dos condutores passado pouco tempo.

Melhor resultado deram os ecrãs com avisos electrónicos colocados no Verão, entre Maio e Setembro, na época em que costumavam ocorrer mais atropelamentos. “É muito comum agora as pessoas pararem e ajudarem uma tartaruga a atravessar a estrada em vez de lhe passarem por cima”, afirmou à BBC o coordenador do projecto, Rick Levick.

Todavia, outros testes com tartarugas e cobras de borracha colocadas na estrada, a imitar os animais verdadeiros, mostraram que alguns condutores acertavam de propósito nos animais.

Procuraram-se então formas de evitar que as tartarugas e as cobras atravessassem a estrada. Para isso, os responsáveis construíram várias eco-passagens debaixo da estrada e colocaram vedações ao longo da via rodoviária para obrigar os animais a utilizarem os caminhos subterrâneos – o que por vezes foi difícil, devido ao terreno pantanoso.

Um estudo sobre os resultados deste projecto – feito por investigadores da McMaster University, em Ontario, e agora publicado no Wildlife Society Bulletin – descobriu que as vedações ao longo da estrada têm de estar correctamente colocadas e totalmente seladas. Caso contrário, um grande número de animais acabam por passar, através dos poucos espaços disponíveis, para cima da estrada.

Outro dos desafios foi o material usado nas passagens subterrâneas, uma vez que o cimento é demasiado frio para estes répteis. A escolha foi um material plástico mais quente, com as passagens projectadas de forma a ver-se a luz do dia do outro lado. Conceberam-se também vários tamanhos e larguras para os caminhos.

Os investigadores descobriram ainda que a distância entre estas aberturas não pode ser superior a 150 metros, para as tartarugas não desistirem de passar para o outro lado.

A última passagem foi instalada já no princípio deste ano, em Janeiro. E para já, os resultados do projecto estão a ser animadores.

“O número médio de tartarugas que se aventuram na estrada caiu em 89% e os números de cobras reduziram-se em 28%”, explicou uma bióloga da McMaster University, Chantel Markle.

Já o coordenador do projecto, Rick Levick, congratulou-se pelo sucedido. “Todos concordámos que era tempo de colocar um ponto final nesta carnificina.”

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.