Wisdom voltou e está a incubar o seu ovo aos 66 anos

Os albatrozes começam a chegar ao atol de Midway, no Havai, no início de Outubro. Depois de muitos meses no oceano Pacífico, este é o único momento em que regressam a terra, para se reproduzir. Aos 66 anos, Wisdom voltou mais uma vez. No meio de centenas de milhares de ninhos, está a incubar o seu ovo.

 

Ao longo das últimas semanas, Wisdom – a ave reprodutora a viver na natureza com mais idade do mundo – já era tema de conversa entre os funcionários do Refúgio Nacional de Vida Selvagem do Atol de Midway, no Havai. Este Atol é a maior colónia de albatrozes do mundo, com cerca de 70% da população mundial de albatrozes-de-Laysan (Phoebastria immutabilis) e quase 40% de albatrozes-de-patas-pretas (Phoebastria nigripes).

 

Wisdom
Wisdom. Foto: USFWS – Pacific Region

 

Os albatrozes começam a chegar no final de Outubro e, no final de Novembro, há centenas de milhares por todo o atol. Em Dezembro de 2015, voluntários do Serviço norte-americano de Pescas e Vida Selvagem contaram 470.000 ninhos ocupados; uma vez que cada ninho representa dois adultos, a população total reprodutora em Midway era de 940.000 aves.

Uns acreditavam que Wisdom iria regressar a terra para se reproduzir e aguardavam a sua chegada. Outros especulavam que talvez Wisdom quisesse tirar um ano de “férias”, como fazem muitos albatrozes, e em vez de se reproduzir, optasse por investir o seu tempo e energia na mudança das penas. Para uma espécie que voa tanto, penas robustas são cruciais.

 

Wisdom e o companheiro
Wisdom e o companheiro. Foto: USFWS – Pacific Region

 

Esta espécie passa grande parte da vida (quase 90%) no oceano Pacífico à procura de alimento, e só vem a terra uma vez por ano, sempre para o mesmo ninho.

Kristina McOmber, responsável pelo programa de voluntários do Refúgio, estava a regressar de um censo à população de patos-de-Laysan (Anas laysanensis) a 3 de Dezembro quando descobriu Wisdom. Lá estava a sua anilha vermelha na pata direita (Z333), segundo um comunicado divulgado a 9 de Dezembro.

“Quando fui almoçar percebi que alguma coisa estava a acontecer”, conta Charlie Pelizza, coordenador de projectos no Atol de Midway. “A equipa estava muito entusiasmada com notícia de que Wisdom tinha regressado e estava a incubar. É espantoso como uma boa notícia pode melhorar o nosso dia.”

 

Wisdom e a sua cria, em 2013
Wisdom e a sua cria, em 2013. Foto: USFWS – Pacific Region

 

Wisdom estava a aguardar a chegada do seu companheiro, Akeakamai (palavra havaiana que significa amante de sabedoria) e entre os dois vão-se revezando para incubar o ovo. Quando Akeakamai regressar, Wisdom parte para o oceano para se alimentar e recuperar energias.

Wisdom está prestes a quebrar o seu próprio recorde da ave reprodutora com mais idade a viver na natureza. Desde 2006, quando tinha 55 anos, Wisdom teve pelo menos mais oito crias, e os registos indicam que teve pelo menos 40 desde que ela própria nasceu. No ano passado teve uma cria, Kukini (que quer dizer mensageiro), que o Refúgio espera voltar a ver nos próximos anos.

O total de milhas voadas também é assombroso, sublinham os cientistas: mais de três milhões de milhas (cerca de 4,8 milhões de quilómetros), desde que esta ave foi pela primeira vez registada no atol, em 1956. No total, esta distância equivale a seis viagens de ida e volta entre a Terra e a Lua.

 

Wisdom
Wisdom. Foto: USFWS – Pacific Region

 

O próprio biólogo que anilhou Wisdom quando ela era uma jovem ave nidificante, em 1956, tem hoje 98 anos de idade e continua a trabalhar no atol, sempre que pode, fazendo aquilo de que gosta. Chama-se Chandler Robbins e calculou que a ave teria pelo menos cinco anos, quando a observou pela primeira vez.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.