A família Rainho está a recuperar a floresta no Barreiro

A Reserva Natural Local do Sapal do rio Coina e Mata da Machada, com 800 hectares, é um refúgio de biodiversidade no Barreiro. A invasão de árvores e plantas exóticas é um problema para o qual foi arranjada uma solução. E a família Rainho quis fazer parte dela.

Desde o final do ano passado que qualquer pessoa pode adoptar talhões de floresta e livrá-los das exóticas. É este o principal objectivo do projecto LIFE Biodiscoveries, iniciativa do município do Barreiro, que começou em Julho de 2014, e conta com co-financiamento europeu.

“O nosso primeiro talhão fica na primeira mancha de acácia à direita, perto da entrada na Mata da Machada”, diz-nos Cristina Rainho, 46 anos. “O segundo talhão é numa área de pinheiro bravo, onde o chorão-da-praia se desenvolve, sobretudo na área limítrofe”, acrescenta.

Cristina é técnica de normalização de dispositivos médicos numa associação empresarial em Miraflores e é a primeira vez que faz voluntariado pela natureza. “Foram vários os motivos que me levaram a querer participar”, conta-nos. “O primeiro foi o querer fazer regularmente algo que me dê prazer e que esteja ligado à minha escolha de formação, Produção Florestal, apesar de não a exercer”. Mas não só. “Quero educar os meus filhos a não pensarem só em si próprios e desejo mantê-los em contato com ambientes naturais e saudáveis”.

Além de Cristina, os outros voluntários da família são o seu pai José, 73 anos, a irmã Ana, 43 anos, e os filhos Catarina, 17 anos, e André, dez anos.

O Biodiscoveries está apenas no início dos seus cinco anos de trabalho. Até ao momento foram adoptados cerca de 30 talhões naquela reserva natural, diz-nos Cátia Correia, do Centro de Educação Ambiental do Barreiro e uma das pessoas a trabalhar no projecto. “A maioria dos adoptantes são famílias que vivem no Barreiro, apesar de também termos várias entidades”, como associações de cariz social e escuteiros, acrescenta. “Mas ainda temos imensos talhões disponíveis” para quem quiser, mesmo que não resida naquele concelho.

Estes talhões cobrem uma área total de 20 hectares, o que corresponde a cerca de metade da área com invasão mais grave de acácias. “Estes talhões resultam de um levantamento que fizemos antes do arranque do projecto para identificar quais as áreas prioritárias para a intervenção”.

Voluntários arrancam chorões e descascam acácias

Aquilo que os voluntários fazem é o arranque dos chorões e o descasque das acácias. “Este descasque corta os nutrientes que alimentam a árvore, o que faz com que acabe por morrer”, explica Cátia Correia. Trabalhos mais pesados, como a limpeza de silvas e de árvores caídas ou a aplicação de processos químicos, quando necessários, ficam a cargo de técnicos florestais.

A família Rainho começou a trabalhar na primeira semana de Dezembro. “A nossa única dificuldade é que as acácias… não se deixam controlar. Devido ao frio, a casca das acácias não se solta facilmente do tronco. Além de dificultar imenso o nosso trabalho, o impacto é quase nulo. Passado mês e meio, as acácias têm uma folhagem de aspecto igual às que não sofreram intervenção”, desabafa Cristina. Por isso, decidiram interromper a intervenção naquele talhão. “Logo que regresse o tempo quente, contamos acabar o nosso trabalho”, promete.

Ainda assim, o esforço compensa. “Este voluntariado permite-me contribuir para um bem maior, que é proteger a natureza, nomeadamente as espécies autóctones num espaço que muito aprecio, perto de casa. Além disso, é uma importante ‘desculpa’ para poder roubar semanalmente duas a três horas à minha agenda para poder usufruir de um valioso e belíssimo espaço verde que temos no nosso concelho”. E como recompensa, “melhoro a minha saúde e a da minha família e ainda promovemos o convívio entre nós”.

“Hoje em dia vivemos num corrupio para cumprir listas intermináveis de tarefas, tanto a nível profissional como familiar. Pouco tempo nos resta para dar atenção ao que é realmente importante.”

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.

Pode ajudar os cientistas a conhecer qual a distribuição das espécies exóticas invasoras em Portugal. Para isso, registe as suas observações no Mapa de Avistamentos do projecto Exóticas Invasoras, uma parceria da Escola Superior Agrária de Coimbra e do Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra. Lá encontrará fichas de identificação das espécies a procurar e informação sobre como fazer para as registar no mapa.

E esta é uma excelente altura para começar. As acácias estão a entrar em floração e os investigadores vão precisar da ajuda de todos para as colocar no mapa.

E se viver perto do Barreiro, pode adoptar um talhão, inscrevendo-se aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.