(Mais) Uma manhã à procura do “raro” tartaranhão-pálido

António Heitor decidiu tentar, mais uma vez, encontrar o tartaranhão-pálido, uma ave de rapina rara em Portugal. Em plena Lezíria do Tejo, tentou a sua sorte. Será que conseguiu?

 

O tartaranhão-pálido (Circus macrourus) é uma ave de rapina migradora, que nidifica no sul/sudeste da Europa e passa o Inverno no sudeste asiático, principalmente na Índia. É uma ave de ocorrência rara no nosso país, o que não significa que a sua observação em terras lusitanas seja impossível.

Nos últimos meses tem sido registado de forma constante um tartaranhão-pálido juvenil da Lezíria do Tejo, mais concretamente na Ponta da Erva. Por várias vezes lá fui mas a sorte não esteve do meu lado. Começava a acreditar que esta espécie se iria juntar à lista daquelas que nada querem comigo. Mas não me apetecia desistir. Tendo conhecimento de observações regulares no final de Janeiro, decidi que iria tentar mais uma vez. No domingo, dia 24 de Janeiro, já lá estava ao nascer do Sol.

 

 

A primeira hora de procura parecia igual às outras tentativas anteriores. No entanto, se o tartaranhão continuava escondido, o mesmo não se poderia dizer de outras rapinas. As primeiras aves que vi foram rapinas de médio porte mais comuns. Nos arrozais, muitos deles com água, as “suspeitas do costume”: muitas limícolas, patos e bandos de passeriformes diversos. Passei por bandos de maçarico-de-bico-direito (Limosa limosa), de pato-trombeteiro (Anas clypeata) e de borrelhos, que tiravam proveito dos campos alagados para procurarem alimento ou para simplesmente descansarem.

 

 

Mas não podia esquecer o objectivo da visita, o tartaranhão. Passando pelo “poiso da águia-pesqueira” reparo numa grande silhueta no cimo do poste. A identificação tornou-se difícil pois a ave estava do lado errado na luz. Aproximei-me e a ave levantou voo, possibilitando a sua identificação pelo padrão característico das asas e cor creme. Uma águia-de-Bonelli (Aquila fasciata) imatura que, ao afastar-se, faz levantar um grupo de garças-reais (Ardea cinerea). A águia “picou” na direcção de uma delas. As duas grandes aves desapareceram por entre a vegetação.

Sigo em direcção do local que tinha em mente. Uma pequena silhueta distrai-me da estrada. É uma rapina, mas bem mais pequena do que procurava. Um mocho-galego (Athene noctua) voa para um buraco na parede de uma casa agrícola ficando apenas visíveis dois grandes olhos.

 

 

Ao mesmo tempo, outra pequena ave pousa num poste de uma cerca. Um peneireiro-de-dorso-malhado já “velho conhecido”.

 

 

A coisa parecia estar a animar. Num eucalipto à distância, um vulto grande merecia uma observação mais atenta. Mais uma vez, em contraluz, não consegui perceber se eram folhas ou uma ave. Decidi fazer exactamente ao contrário das regras. Arranquei e parei o carro mesmo por baixo da árvore, peguei na máquina, saí a correr do carro, ainda ligado e com a porta aberta, e aponto a objectiva para as “supostas” folhas. Imediatamente percebi que tinha reencontrado uma “velha conhecida”, uma águia-de-Bonelli imatura. Será a do início da manhã? Será o juvenil que vi nos finais do Verão ? Quando levantou voo, reparei no seu papo cheio. Talvez a pobre garça-real não tenha tido muita sorte.

 

 

Parece que incomodei a digestão da grande águia. Com um voar pesado, aproveitei para a ver melhor pelos binóculos. Enquanto ela desaparecia no horizonte reconheci um vulto nos postes de uma vedação. Seria desta? Entrei no carro e ao chegar perto da ave o colar creme do pescoço confirmou que tinha encontrado o famoso tartaranhão-pálido. Apesar de ser um imaturo não deixa de ser uma ave interessante e de ter uma magnífica cor arruivada no peito.

 

 

Valeu a persistência. Mas não só. A indicação do Marcus Carvalho foi preciosa. Obrigado Marcus pelas dicas.

 

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