Ricardo Guerreiro. Foto: D.R.

“A Costa das Cegonhas” traz de volta à TV Luís Quinta e Ricardo Guerreiro e a natureza do Sudoeste Alentejano

Estreia neste domingo, dia 15 de Agosto, no espaço “Vida Selvagem” na SIC, o mais recente documentário de Luís Quinta e Ricardo Guerreiro, “A costa das cegonhas – retrato natural do Sudoeste Alentejano”. A Wilder falou com esta dupla de naturalistas e documentaristas sobre o seu novo filme de História Natural.

WILDER: Como surgiu a ideia de fazer este documentário?

Ricardo Guerreiro: Este filme foi um pedido da Rota Vicentina (RV), com o objectivo muito concreto de promover a região Sudoeste no que toca à sua História Natural. A região sofre muitas pressões que a ameaçam a vários níveis e a RV pretendia ter um documento que capitalizasse meditaticamente a região. Um filme de História Natural é uma ferramenta mais do que comprovada para este fim. Eu e o Luís conhecemos bem aquele território e já não nos era estranha a ideia de trabalhá-la deste ponto de vista, pelo que do pedido inicial da RV à realização do projecto foram “apenas” questões processuais.

Ricardo Guerreiro. Foto: D.R.

Luis Quinta: Ao contrário de outras obras em que trabalhamos, este filme “A Costa das Cegonhas” tem muitas colaborações. A Música é toda original do Avelino Santollala, o texto do Sandro William Junqueira e a narração do Miguel Guilherme. 

W: Qual é o vosso objectivo com este novo filme?

Ricardo Guerreiro: Podemos dizer que, de forma geral, o nosso objectivo é o mesmo que nos filmes anteriores: enaltecer a História Natural de uma região através da exaltação da beleza das suas histórias de vida, geologia, etc. Continuamos a acreditar numa linha de sensibilização pela beleza e reforço positivo do que a região tem, mais do que pôr muita carga nas coisas negativas e ameaças. Apesar disso, neste filme abordamos alguns dos problemas que pairam sobre o Sudoeste mas de forma inclusa na narrativa geral e não como uma sequência concreta de chamada de atenção.

W: Como está organizado este documentário, que tem 52 minutos de duração? Qual a linha narrativa?

Ricardo Guerreiro: Tanto quanto possível quisemos que as cegonhas fossem a espinha dorsal deste filme, e delas partir para histórias “adjacentes” e/ou complementares de toda a região. Portanto, o filme segue uma narrativa em que as cegonhas vão avançando na sua época de reprodução e, com alguns elementos que façam “cola” com outras histórias, ir saindo por esses “ramos da árvore” para depois, também quando possível, regressar ao tronco principal com alguma lógica e ligação de novo às cegonhas.

Ricardo Guerreiro. Foto: D.R.

Optámos por este tipo de estrutura porque funcionalmente pensamos que resulta bem. A escolha das cegonhas para protagonistas, no caso concreto do Sudoeste, fazia todo o sentido pois acho que mais lugar nenhum do mundo poderia ser apelidado de “Costa das Cegonhas”, já que, de facto, este é o único lugar do mundo onde elas nidificam em arribas marítimas. É isto que as torna especiais, ou pelo menos a região especial no que toca à presença desta espécie.

W: Quando e onde aconteceram as filmagens?

Luis Quinta: Começámos a filmar na Primavera de 2018 na Costa Alentejana. Tínhamos uma base logística na aldeia do Cavaleiro (Cabo Sardão). Ao longo de meses percorremos toda aquela costa (uns bons quilómetros para norte e para sul).  No final do verão estivemos a trabalhar mais a Sul já no Algarve (muitos detalhes geológicos e os temas marinhos/cetáceos). Em 2019 ainda voltámos ao terreno para completar algumas histórias e sequências.

Luís Quinta. Foto: D.R.

W: Que técnicas e material usaram?

Luis Quinta: Em termos de equipamentos usámos diversas câmaras de ultra alta definição (4k), desde micro câmaras, super teleobjectivas, caixas-estanques (imagens subaquáticas), câmaras remotas, etc. Mesmo muito equipamento e diverso. A Canon Portugal foi um importante parceiro deste projecto, pois disponibilizou bastante equipamento, muito especifico, para alguns planos difíceis de captar, nomeadamente grandes teleobjectivas! 

A cinematografia é sempre uma grande preocupação nos nosso filmes, desta forma tentamos usar técnicas e uma linguagem visual, apelativa, bonita e cativante para o espectador.

W: O que mais vos surpreendeu e fascinou neste trabalho?

Luis Quinta: Conhecemos este território razoavelmente bem, mergulho na zona há mais de 40 anos e tenho fotografado toda a costa vicentina ao longo dos últimos 25 anos. Apesar de tudo, há sempre situações novas que nos enchem os olhos! A geologia é deslumbrante, há sempre mais uma formação rochosa que nos aparece à frente e não conhecíamos. Ou uma determinada luz que produz reflexos e sombras distintas de outras vezes que visitámos certos locais, entre outros detalhes. Já conhecia alguma flora da região, mas neste projecto conheci muitas das plantas endémicas da Costa Vicentina. Os charcos temporários são sempre locais mágicos; há muitas criaturas surpreendentes, bizarras e belas. Existem naqueles planos de água histórias de vida notáveis…

Luís Quinta e Ricardo Guerreiro. Foto: D.R.

W: Quais os maiores desafios durante as filmagens?

Luis Quinta: Há sempre muitos desafios, depende do nosso grau de exigência e até que escala queremos “descer”. Se vamos filmar animais de poucos milímetros é sempre uma boa “dor de cabeça” pois não é fácil focar, iluminar e controlar tudo! Algumas aves podem permanecer afastadas dos nossos abrigos e equipamentos de filmagens. Nestas situações temos de usar grandes teleobjectivas. Neste documentário filmámos várias vezes com uma objectiva 800mm + conversor 2x para termos um enquadramento em que o sujeito ocupava uma área considerável do enquadramento. Alguns mamíferos não são fáceis de filmar em estado selvagem em Portugal, outros estão mais tímidos (na região) e não aparecem como gostaríamos.
Descemos e subimos por muitos trilhos de pescadores e mariscadores para chegar a locais muito bonitos. 

Ricardo Guerreiro. Foto: D.R.

O documentário de História Natural “A costa das cegonhas – retrato natural do Sudoeste Alentejano” estreia a 15 de Agosto, às 12h00, no espaço “Vida Selvagem” da SIC.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.