Armando Frazão. Foto: Inês Machado

Armando fez um guia de campo para nos mostrar as orquídeas da Arrábida

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É em Março e Abril que a maioria das orquídeas silvestres estão em flor e agora procurá-las na serra da Arrábida tornou-se mais fácil. Saiba tudo sobre o “Guia de Campo Orquídeas Silvestres da Arrábida” nesta conversa com o autor, Armando Frazão.

WILDER: Porque escolheu a Arrábida para o seu livro? É uma zona especialmente rica em espécies de orquídeas silvestres?

Armando Frazão: Escolhi a Arrábida por dois factores fundamentais. Por um lado, pela proximidade geográfica já que moro em Lisboa e as deslocações são rápidas e relativamente baratas. Nos dois primeiros anos de preparação “a sério” do livro cheguei a fazer uma média de perto de 3 saídas de campo por semana durante o pico da época de floração das orquídeas. O custo e a distância podiam ser proibitivos numa situação deste estilo. Até essa altura eu até pensava que já conhecia a Arrábida! Mas era uma ilusão. Agora acho que já conheço mais um pouco. Por outro lado, efectivamente a Arrábida é única no país, já que neste espaço geográfico relativamente confinado existem habitats variados e neles cerca de metade de todas as espécies portuguesas. A fazer um trabalho destes, tendo restrições geográficas, dificilmente poderia haver uma escolha melhor.

Orchis italica. Foto: Armando Frazão

W: Qual o seu objectivo com este guia de campo?

Armando Frazão: Não tenho só um objectivo e é difícil eleger um principal. O livro tem como um dos objectivos fazer a ponte entre o leigo e a Ciência: usar uma linguagem simples e descritiva de modo a poder ser entendido por todos, mas que ainda continue a ser cientificamente correcto, mesmo que sem um nível de profundidade extremo. O outro objectivo é ser apelativo e não apenas para os aficionados no tema; ser muito mais que um “catálogo” de espécies e descrições. O leitor, qualquer leitor, tem que gostar do que vê e ter vontade de ver mais. Ora isto não é um objectivo só por si com grande interesse ou seria “só” um livro de fotografia. Isto vem junto com o objectivo de incutir paixão por estas plantas nas pessoas, de as fazer perceber a sua fragilidade e de saberem o que devem fazer para as proteger ou o que não fazer para as prejudicar. Quer, sem moralizar, incutir um espírito ambiental de preservação. Veja-se justamente a citação que faço nas primeiras páginas: “No final, vamos preservar apenas o que amamos, vamos amar apenas o que entendemos, e vamos entender apenas o que nos for ensinado”. Houve também um grande objectivo pessoal de aprender mais sobre o tema, de sistematizar os dados que já vinha recolhendo durante anos. Alguém me disse que a melhor maneira de aprender é ensinar.

Armando Frazão. Foto: Inês Machado

W: Quantas espécies estão referidas no guia de campo? 

Armando Frazão: Sigo uma sistemática relativamente conservadora, a WCSP (World Checklist of Selected Plant families) gerida pela Royal Botanic Gardens, Kew. Dentro desta sistemática apresento 30 espécies, mais duas subespécies, mais cerca de 25 formas e variantes, 2 híbridos que se reproduzem autonomamente e próximos das especiação, e ainda 8 híbridos (3 deles que não eram, e ainda não são, conhecidos em mais local nenhum do país). São muitas plantas diferentes! Em sistemáticas menos conservadoras isto traduz-se em mais de 40 espécies.

W: E que tipo de informação podem as pessoas encontrar no livro?

Armando Frazão: No início há enquadramentos específicos sobre a Arrábida e a segunda parte, a maior parte, é o guia de campo das orquídeas da Arrábida. Mas é um livro sobre orquídeas silvestres e isso aplica-se às orquídeas de todo o país. Aliás, aplica-se a quase todas as orquídeas silvestres da Europa. As primeiras secções seguem uma estrutura didáctica para as pessoas terem oportunidade de aprender mais sobre todos os aspectos mais relevantes da biologia das orquídeas. Tudo em secções pequenas, ilustrado sempre que possível e tendo o cuidado de usar uma linguagem simples. Isto é muito mais do que se encontra num guia de campo “normal”. Enquanto esta primeira parte seja “opcional” e a parte de guia de campo possa ser usada autonomamente, ler o que está aqui ajuda muito a compreender melhor o que depois se apresenta na parte do guia. Ah! E todo o livro é bilingue, português e inglês.

W: Para quem fez este guia de campo?

Armando Frazão: O público-alvo é o leigo interessado na natureza e ambiente, até quem não olharia assim tanto para este tema. Sabia que iria também ter muitos interessados dentro dos aficionados pelas orquídeas. Surpreendeu-me um pouco perceber que a comunidade científica/académica também tem um interesse razoável no livro. E o turista da natureza, particularmente pelo aspecto bilingue.

Ophrys lutea. Foto: Armando Frazão

W: As orquídeas silvestres são fáceis de encontrar na Arrábida? Pode dar alguns exemplos de locais para as procurar e quais as melhores alturas do ano?

Armando Frazão: Sim, é fácil encontrar uma variedade de espécies de orquídeas na Arrábida desde que se saiba o que procurar e na época certa. O género Ophrys, por exemplo, cresce em quase todas as zonas arrelvadas de prados, campos de cultura abandonados e bermas de estrada. O problema é que, popularmente, as orquídeas não são conhecidas como tal mas sim como “ervas” (Erva-abelha, Erva-vespa, Moscardo-fusco, etc) e por isso não são reconhecidas. O pico da floração, em que mais espécies estão floridas, é em Março e Abril. Zonas boas para observar facilmente orquídeas são, por exemplo, o Vale dos Barris e serras circundantes da região de Palmela e as Terras do Risco.

Ophrys tenthredinifera. Foto: Armando Frazão

W: Pode destacar uma ou duas espécies que mais goste de observar/fotografar? E porque as escolheu?

Armando Frazão: Uma espécie que sempre me fascinou é a “ficalhoana”. Dependendo da sistemática usada pode ser considerada espécie (Ophrys ficalhoana), subespécie (Ophrys tenthredinifera subsp. ficalhoana) ou uma simples variedade de Ophrys tenthredinifera. A minha opinião é que devia ser, pelo menos, considerada subespécie e não digo isto pelo fascínio, mas por informação recolhida sistematicamente em campo. É uma orquídea muito vistosa na sua forma normal, com capacidade de crescer um pouco mais do que a média das outras Ophrys e por vezes com muitas flores. Também é relativamente rara, tanto na Arrábida em que só a conheço numa área específica, como a nível nacional onde se conhece em poucos outros locais. E quando há uns anos descobri num local a forma de sépalas brancas desta orquídea, então aí o fascínio foi completo. Apesar das inúmeras fotos que tenho dela, nunca resisto a tirar mais umas quando a encontro.

W: Desde quando se começou a interessar por orquídeas silvestres? E como começou este seu fascínio por estas plantas?

Armando Frazão: Tudo começou com o Alcino que me convidou para fazer parte do seu “Passeio Anual das Orquídeas”, talvez há uns 20 anos. É uma caminhada informal de amigos para observar orquídeas. Depois da primeira vez nunca mais falhei. Já tinha alguma experiência a fotografar artrópodes e essa experiência permitiu-me muito facilmente começar a captar os pormenores das orquídeas que não se veêm à distância. Como com outras áreas, a fotografia começou a criar a necessidade pessoal de aprender mais sobre o que estava a fotografar e a coisa foi evoluindo num ciclo entre fotografia e pesquisa/aprendizagem. Antes sem grandes objectivos, há uns 6 ou 7 anos comecei a sistematizar o acervo fotográfico e veio a primeira ideia de um livro, mas talvez fosse apenas um livro de fotografias de orquídeas. A tal parte da aprendizagem ditou que afinal tinha que ser mais que isso. O Alcino, um pouco mais velho que eu, deixou de ter capacidade física de conduzir o passeio das orquídeas, mudou-se da área de Lisboa e acabei eu por herdar a tarefa. Exceptuando o ano passado, por questões sanitárias, o “Passeio Anual das Orquídeas” fez-se sempre, “nem que chovam picaretas”. Este livro é dedicado, com todo o mérito, ao Alcino.


Orquídeas silvestres – Arrábida, guia de campo

Por Armando Frazão

Editora: Prime Books

Data de publicação: Janeiro de 2021

Pontos de venda: o livro está disponível nas principais plataformas digitais (Wook, Bertrand e FNAC), bem como no website da editora (Prime Books) e o próprio Armando Franzão tem exemplares que tem muito gosto em distribuir a título pessoal. Fisicamente o livro está disponível na livraria Hemus em Setúbal e, se/quando as condições sanitárias o permitirem, estará nos postos de turismo de Palmela, Setúbal e Sesimbra. A LPN (Liga para a Protecção da Natureza), outro dos parceiros desta publicação, também terá ainda alguns exemplares.

Preço: €16 (Podem haver descontos regulares, especialmente nos canais online).

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.