Nova série de televisão portuguesa traz-nos o Estuário do Tejo selvagem

Noites a dormir ao relento, 30.000 quilómetros percorridos de carro e situações surpreendentes fazem parte dos bastidores da série de três episódios Estuário – as marés selvagens do Tejo que estreia neste domingo na SIC.

 

Durante dois anos, Pedro de Carvalho, 49 anos, Maria de Lurdes Carvalho, 52, e a sua equipa percorreram, sobrevoaram e navegaram o Estuário do Tejo, um dos maiores e mais importantes da Europa Ocidental. O resultado de tantas horas de trabalho são três episódios de 45 minutos cada um, que vão passar na SIC nos dias 8, 15 e 22 de Maio (aos domingos), às 12h10.

 

Pedro de Carvalho a captar imagens no estuário

 

“Queremos mostrar o que acontece no Estuário do Tejo e onde acontece. A ideia é criar empatia nas pessoas em relação a esta zona natural”, disse Pedro de Carvalho, à Wilder. “Somos indiferentes àquilo que não conhecemos. Mas se soubermos que, por exemplo, ali há uma espécie rara e que vêm pessoas de fora para a observar até ficamos orgulhosos”, acrescentou.

Estes três episódios são assim como um guia para nos orientar nos cerca de 34.000 hectares do Estuário do Tejo, a maior zona húmida do país e uma das mais importantes da Europa.

 

Pedro de Carvalho com vigilante da natureza

 

O primeiro episódio apresenta o estuário, porque é importante para peixes, crustáceos e invertebrados marinhos e conta as histórias de algumas aves que ali passam o Inverno, como a águia-pesqueira e o alfaiate, símbolo da Reserva Natural do Estuário do Tejo, criada há 39 anos.

O segundo episódio mostra-nos o estuário no Outono, no Inverno e no início da Primavera. “É fascinante assistir à nidificação das aves, à competição pelos locais para construir os ninhos e aos jogos entre diferentes espécies”, contou Pedro de Carvalho. Este produtor não esquece aves como as íbis, os colhereiros, garças-vermelhas ou os abelharucos.

 

Lurdes Carvalho a captar imagens
Lurdes Carvalho a captar imagens

 

O terceiro e último episódio passa-se na Primavera e Verão. “É a sequência do episódio anterior a aqui mostramos a eclosão dos ovos, as crias e as aves nocturnas como os noitibós e as corujas.” A série termina no Outono, quando as aves estivais se vão embora e chegam novamente as invernantes. “Quisemos fazer todo o ciclo do estuário, perceber o que há ao longo do ano.” As aves, residentes e migradoras, são as grandes protagonistas, mas há espaço também para peixes, mamíferos, invertebrados e habitats como os sapais, mouchões, salinas, zonas ribeirinhas e florestas de transição.

Pedro de Carvalho admite que vai ter saudades do estuário. “Divertimo-nos muito a fazer este documentário.” Para sempre ficam os momentos em que assistiram à eclosão de crias de perdiz-do-mar ou às estratégias de caça das corujas-das-torres. Ou quando uma cria de borrelho se abrigou do sol à sombra do equipamento que tinham deixado no campo.

 

Cria de perdiz-do-mar
Cria de perdiz-do-mar

 

Este foi o documentário onde Pedro e Lurdes mais investiram. Ambos têm outras ocupações – Pedro é informático e Lurdes é contabilista – e os documentários de natureza são feitos nos tempos livres. “Não nos vemos a fazer outra coisa com o nosso tempo livre”, disse-nos Pedro. Desde 2011 fizeram cinco documentários para a televisão, mais concretamente para a SIC: sobre o paínho de Monteiro (a mais pequena ave marinha dos Açores), a ilha de Santa Maria, o mar dos Açores (dois episódios) e sobre Almada.

 

Flamingos no estuário
Flamingos no estuário

 

Sempre gostaram de natureza. “Passámos toda a vida na natureza, gostamos de mergulho e caminhadas e deparamo-nos com coisas giríssimas”, contou Pedro. Aprendeu a editar e a operar câmaras nos anos que trabalhou na agência de notícias Reuters.

O Estuário do Tejo surgiu um pouco por acaso. “Escolhemos o estuário por questões de proximidade, já que estamos em Lisboa, mas principalmente porque é fascinante e porque percebemos que não havia nada que mostrasse decentemente o estuário e o que lá acontece”, explicou.

 

Lurdes Carvalho a captar imagens
Lurdes Carvalho a captar imagens

 

Durante a fase inicial, de levantamento, o objectivo foi “compreender o estuário, onde acontece e o que acontece ao longo do ano. Foi essencial a ajuda de Maria José Costa, que estuda o estuário há 30 anos”. Depressa se aperceberam de duas coisas: que o estuário começa lentamente a recuperar e que “nem 10 episódios bastariam para mostrar a riqueza do que ali existe, mesmo à nossa porta”. Para Pedro, “foi o fascínio total. Depois disto, decidimos avançar”.

Pelo caminho tiveram surpresas. Como o momento em que descobriram uma raposa a levar uma carpa na boca. “Nunca tinha visto uma coisa assim, é uma situação que não é muito usual. Foi gravado em Abril, Maio, uma época em que há muitas crias e escassez de alimento.”

Ainda hoje Pedro tem a sensação de que podiam ter feito mais. “O estuário é muito grande, tem espécies lindíssimas. Há tanto que ficou por mostrar”.

A série vai ter várias reposições e passará também na SIC Internacional. Está prevista a comercialização de um DVD duplo, ainda sem data marcada.

 

Ficha técnica:

Título: Estuário – As marés selvagens do Tejo

Ano de produção: 2014 a 2016

Género: Documentário – natureza e vida selvagem

Realização: Pedro de Carvalho

Produção: Maria de Lurdes Carvalho, Pedro de Carvalho

 

[divider type=”thick”]Agora é a sua vez.

Pedimos a Pedro de Carvalho para lhe fazer três sugestões para uma visita naturalista ao Estuário do Tejo:

Abelharucos na região de Pancas (Benavente): Pedro e Lurdes estiveram três dias a observá-los antes de começar a gravar. “Fazem ninhos no chão em terrenos de pastos e passam completamente despercebidos. Têm um comportamento social giríssimo.”

Perdiz-do-mar nas lezírias: esta é uma espécie que tem vindo a perder habitat. Está a decorrer um projecto com vigilantes do ICNF e voluntários para ajudar a contar e a detectar ninhos em locais próprios. Além disso, alguns proprietários de terrenos onde estas aves nidificam suspendem as actividades agrícolas em determinadas zonas nos meses mais críticos para proteger as crias.

Aves limícolas nas salinas de Alverca e do Samouco: Pedro e Lurdes ficaram fascinados com as salinas ao longo do estuário. Sugerem estes locais para desfrutar calmamente do que por lá vai acontecendo, observando à distância, com binóculos, rituais de acasalamento e nascimento das crias.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.