Nunca se viram tantos falcões-de-pés-vermelhos em Portugal

Desde a semana passada estamos a receber a visita inesperada de falcões-de-pés-vermelhos, espécie migradora observada em Portugal apenas uma dúzia de vezes nos últimos 30 anos. Desde a última semana já foram observados cerca de 100. Não perca a passagem sem precedentes desta raridade no nosso país.

Eis o que precisa saber sobre o falcão-de-pés-vermelhos (Falco vespertinus), antes de agarrar nos binóculos ou no telescópio e ir para o campo. Gonçalo Elias, especialista em aves, dá uma ajuda.

 

Como é este falcão:

O falcão-de-pés-vermelhos é uma pequena ave de rapina que mede entre os 28 e os 31 centímetros e que tem uma envergadura de asa entre os 65 e os 75 centímetros. Pesa entre 130 e 197 gramas.

O macho e a fêmea têm uma aparência muito diferente. Segundo Gonçalo Elias, os machos são inconfundíveis, com a sua plumagem cinzenta e patas e bicos vermelhos. O anel orbital, em redor dos olhos, também é vermelho. As fêmeas são mais claras, chamando a atenção a sua cabeça alaranjada.

 

Falcão-de-pés-vermelhos. Fotografia: Gonçalo Elias
Falcão-de-pés-vermelhos. Fotografia: Gonçalo Elias

 

O que está a acontecer?

Desde 13 de Maio, “este falcão surgiu em Portugal em números anormalmente elevados”, diz Gonçalo Elias, responsável pelo portal Aves de Portugal. “Numa estimativa grosseira poderemos apontar para um total de 80 a 100 indivíduos diferentes”, destacando-se o caso de um bando com 21 falcões-de-pés-vermelhos, vistos perto de Beja no dia 14 de Maio.

As maiores concentrações foram observadas no Alentejo (regiões de Beja, Castro Verde e Mértola) e Algarve (nas zonas de Silves, Faro e Vila do Bispo). Mas a espécie também foi vista no litoral norte (Ponte de Lima), no litoral centro (Peniche), no estuário do Tejo (perto de Vila Franca de Xira e Seixal), nos Açores (ilha de São Miguel) e na Madeira (Machico).

E a comunidade ornitológica portuguesa tem estado bem atenta. Por exemplo, no grupo do Facebook Aves de Portugal Continental, que conta com mais de 10.300 membros, entre as fotografias de aves mais comuns – como o pardal, o tentilhão ou o chapim-azul – têm sido publicadas várias fotografias do falcão-de-pés-vermelhos.

 

Esta espécie está apenas de passagem por Portugal?

O falcão-de-pés-vermelhos passa o Inverno na África Austral – nomeadamente África do Sul, Angola, Botswana, Namíbia, Tanzânia, Zâmbia e Zimbabwe – e nidifica ao longo de uma faixa que se estende desde o Norte de Itália até à Ásia Central. Na Europa nidifica em 12 países do Leste, estando as populações mais importantes na Rússia, Ucrânia, Roménia e Hungria.

O mais provável é que estes animais que estão de visita a Portugal estejam de passagem migratória entre África e a Europa de Leste, diz o especialista.

 

Por que é uma raridade em Portugal?

A espécie pode ser considerada raridade em Portugal, uma vez que o nosso país está fora da área geográfica normal de ocorrência desta espécie, explica. Normalmente a espécie migra pelo Mediterrâneo oriental e por isso não é muito frequente no nosso país.

Uma das hipóteses que tem sido apontada para justificar o aparecimento destas aves em Portugal é que os falcões tenham sido desviados da sua rota normal, devido a factores meteorológicos, nomeadamente ventos de leste. Já no início da semana passada tinha sido registado o aparecimento de um grande número destes falcões em Marrocos.

 

Falcão-de-pés-vermelhos. Fotografia: Gonçalo Elias
Falcão-de-pés-vermelhos. Fotografia: Gonçalo Elias

 

Qual é o estatuto da espécie?

O falcão-de-pés-vermelhos é relativamente frequente na região onde ocorre habitualmente, ou seja, não é uma espécie rara a nível global. No entanto, a população europeia está em declínio continuado há várias décadas. Por isso, a organização BirdLife International atribuiu a esta espécie o estatuto de “Vulnerável”. Isto significa que, embora a espécie não esteja em risco imediato de extinção, o seu estatuto de conservação é desfavorável.

A nível mundial, o estatuto é “quase ameaçada”, ou seja, globalmente está menos ameaçado que na Europa, mas ainda assim tem um estatuto desfavorável.

 

Então onde é aconselhável ir para ver o falcão?

Gonçalo Elias sugere, principalmente, as lezírias do Tejo e a zona de Castro Verde, que são as áreas onde tem havido mais observações.

[divider type=”thin”]Viu algum falcão-de-pés-vermelhos? Conte-nos a sua história. Escreva para o email [email protected].

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.