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O que procurar na Primavera: o zambujeiro ou oliveira-brava

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O zambujeiro (Olea europaea subsp. europaea var. sylvestris) é também vulgarmente conhecido como oliveira-brava, zambujo-bravo, azambujeiro e oliveira.

É uma espécie nativa em Portugal, com grande representatividade na bacia do Mediterrâneo e que possui uma grande longevidade, pois pode atingir mais de 3000 anos. Em Portugal são conhecidos vários espécimes milenares desta espécie.

Uma espécie nativa, autóctone ou silvestre é assim chamada por ser natural de um determinado ecossistema ou região. Já uma espécie que não habita no seu local natural, ou seja, que foi introduzida num território por acção humana, é considerada uma espécie exótica.

As plantas nativas, como acontece com o zambujeiro, evoluíram ao longo de milhões de anos procurando estabelecer um equilíbrio com a flora e a fauna das regiões onde ocorrem. Estas plantas estão mais bem adaptadas ao clima e ao solo locais e são mais resistentes a fatores externos agressivos, como a ausência de precipitação ou longos períodos de seca, por exemplo. Podem também mitigar o consumo de nutrientes do solo, permitindo o equilíbrio e sustentabilidade de outras espécies vegetais. Por outro lado, são recursos valiosos para a obtenção de alimento e proteção de inúmeros animais.

O zambujeiro

O zambujeiro pertence à família Oleaceae, que engloba outras espécies nativas bem conhecidas, como o freixo-comum, o jasmim-do-monte, o alfeneiro e o lentisco.

É uma pequena árvore ou arbusto perene, com crescimento lento, que pode atingir até 15 metros de altura. A copa é larga, arredondada e com ramificação abundante. Os ramos inferiores são por vezes espinhosos. O tronco é geralmente grosso e bastante tortuoso, com ritidoma (casca) cinzento, rugoso e fendilhado.

As folhas são persistentes, rígidas, de consistência coriácea, margem inteira e com pecíolo curto. Apresentam uma forma elíptica a ovada, podendo ser mucronadas ou não – ou seja, por vezes terminam numa extremidade curta, que pode ser dura. A página superior das folhas é verde-escuro acinzentada e brilhante, e a página inferior é branco-prateada devido à densa cobertura de pelos, de onde sobressai a nervura principal.

Foto: ZTA / Pixabay

A floração desta espécie ocorre durante a primavera, entre os meses de março e junho. As flores são regulares, aromáticas, hermafroditas (femininas e masculinas) e encontram-se reunidas em racimos – cachos densos, de 10 a 20 flores, nas axilas das folhas – no ângulo formado entre estas e os ramos. O cálice é pequeno, em forma de taça, e a corola é constituída por 4 pétalas branco-amareladas, estreladas e soldadas na base.

O fruto desta árvore é vulgarmente conhecido como zambujinho. É uma drupa pequena (azeitona), elipsóide, pouco carnosa, com caroço, verde na fase inicial de formação e negro e brilhante quando maduro. O caroço é duro, castanho e liso, ligeiramente estriado. A frutificação ocorre a partir dos 10 anos de idade. A maturação dos frutos acontece no outono, entre outubro e dezembro.

Etimologicamente, esta espécie é fácil de interpretar. A designação genérica Olea deriva do latim e significa óleo, que é produzido pelo seu fruto. A designação europaeae é o nome latino que menciona a sua origem. O termo sylvestris, relativo à variedade, deve-se à forma selvagem que apresenta.

Espécie mediterrânica

O zambujeiro é uma espécie tipicamente mediterrânica. Cresce espontaneamente em toda a região mediterrânica até ao Médio Oriente. É uma espécie abundante na Península Ibérica, especialmente nas regiões do sul.

Em Portugal cresce livremente um pouco por todo o território continental, normalmente no estrato arbóreo das florestas esclerófilas – compostas por espécies arbóreas e arbustivas providas de folhas rígidas – especialmente em montados de sobro e azinho. É também comum em zonas de matos altos xerofílicos, que contêm espécies adaptadas a climas mais secos, e em locais rochosos e secos no Interior Norte e no Centro e Sul do país. Por vezes estas árvores possuem a aparência de moitas densas, formando bosquetes e bosques chamados de zambujais.

Foto: Ana Júlia Pereira / Flora-On

O zambujeiro é uma árvore florestal que tem preferência por locais com boa exposição solar, climas e terras soalheiras com baixa pluviosidade. Cresce habitualmente em solos pobres, esqueléticos e pedregosos, o que faz dele uma espécie muito importante no repovoamento florestal. Prefere no entanto solos profundos, com pH básico e ricos em nutrientes.

É uma espécie muito rústica, resistente à seca e ao calor. Aguenta muito bem o transplante e o corte, embora não suporte elevados níveis de humidade nem temperaturas extremamente baixas.

Por outro lado, tem múltiplas utilizações. É muito utilizado como planta ornamental, geralmente isolada, sendo as árvores mais antigas, com idade mais avançada, as mais procuradas e apreciadas. Além da sua beleza natural, a rusticidade e facilidade de adaptação são outros motivos que levam à escolha desta espécie ornamental.

A madeira do zambujeiro possui uma elevada resistência e uma cor ocre amarelado, por vezes avermelhada ou esverdeada, que depois de polida adquire um brilho bonito, servindo para fabricar pequenos utensílios domésticos, peças de marcenaria e marchetaria. Também é utilizada como lenha e para carvão.

Foto: Miguel Porto / Flora-On

Hoje em dia, o caroço de zambujinho, assim como a azeitona da “oliveira cultivada”, depois de limpo, juntamente com o bagaço – o resíduo sólido que sobra do caroço durante o processo de extração do azeite – têm aplicação como biomassa. Esta é uma fonte de energia renovável, que pode ser utilizada no aquecimento das habitações sob a forma direta de caroço limpo, ou sob a forma de pellets ou de briquetes.

Os frutos, ainda que pequenos, podem ser utilizados para consumo inteiro e contêm uma grande quantidade de substâncias oleaginosas, de onde se obtém o azeite, um alimento muito precioso na cozinha mediterrânica. Os frutos também são uma fonte de alimento muito importante para várias espécies de animais, principalmente estorninhos, tordos, pegas, raposas e coelhos que ajudam à sua dispersão por vários locais.

As folhas possuem inúmeras propriedades medicinais, pois são diuréticas, hipotensoras, emolientes, laxativas, entre outras qualidades. O azeite é rico em nutrientes, ajuda a desenvolver o equilíbrio das gorduras no corpo e possui propriedades de defesa no sistema digestivo. É também benéfico para a pele, tendo inúmeras aplicações na cosmética.

Esta planta selvagem tem uma óptima capacidade de se autorregenerar, sendo fácil a obtenção de novos rebentos que poderão dar origem a uma nova planta. É por isso também muito utilizada como porta-enxertos para diversas variedades e cultivares de oliveira.

A “oliveira cultivada”

O interesse desta espécie motivou sucessivos cruzamentos com o objetivo de obter frutos de maior tamanho, dando origem à forma cultivada, a “oliveira cultivada” (Olea europaea subsp. europaea var. europaea).

A oliveira cultivada tem uma distribuição nativa e condições edafo-climáticas semelhantes à variedade sylvestris e tem a particularidade de suportar melhor as geadas e as baixas temperaturas, podendo ocorrer em altitudes mais elevadas. Também é tolerante aos ventos marítimos.

Ambas constituem duas variedades da mesma subespécie. O património genético do zambujeiro é sem dúvida muito rico, continuando a ser um importante recurso genético para a obtenção de novas variedades e cultivares. Em Portugal, as cultivares de maior relevância são a Galega, a Carrasquenha, a Cordovil, a Cobrançosa e a Verdeal.

Símbolo da agricultura, a Olea europaea subsp. europaea, domesticada na Idade do Bronze, tem sido “cultivada” até aos dias de hoje. Segundo registos históricos, foram os romanos, os visigodos e os árabes que mais contribuíram para o seu desenvolvimento e cultivo.

Durante a época romana, a unção com azeite tinha a função de um banho da juventude.

Os gregos atribuíram-lhe origem divina, símbolo de paz, de vitória e castidade. É por isso que deuses, heróis, reis e gladiadores usavam uma coroa com ramos desta espécie. Os vencedores dos jogos olímpicos também eram condecorados com essas coroas.

A espécie também está associada a crenças cristãs, sendo costume levar um raminho para benzer no domingo de ramos para ser abençoado. Na Bíblia aparece como símbolo de paz e de esperança, quando a pomba enviada por Noé trouxe um ramo de zambujeiro ou de oliveira anunciando o fim do Dilúvio.

Para os Celtas, esta espécie constitui um dos quatro pilares do tempo do ano solar, juntamente com o carvalho, a bétula e a faia, onde as características naturais das árvores eram utilizadas para as associar a determinadas situações.

Oliveira de Mouchão

A oliveira mais antiga da Península Ibérica (Olea europaea subsp. europaea var. europaea) pode ser vista nas Mouriscas, freguesia do concelho de Abrantes. Plantada há cerca de 3.350 anos, contemporânea de Jesus Cristo, passou por três milénios de história e terá sido uma testemunha silenciosa das vivências de celtas, lusitanos, celtiberos, romanos, visigodos, árabes e muitos outros que por ali passaram.

Oliveira do Mouchão. Foto: Câmara Municipal de Abrantes

Esta árvore milenar é uma das árvores mais antigas do mundo. O seu tronco oco possui uma altura de mais de 3 metros e o seu perímetro à altura do peito é de 6,5 metros. Apesar da idade avançada, esta oliveira continua a produzir azeitonas.

 Agora que já conhecem algumas das particularidades desta espécie, explorem e procurem-na na natureza e tentem descobrir se estão perante a forma silvestre ou a forma cultivada.


Dicionário informal do mundo vegetal:

Ritidoma – camada externa do caule das plantas, formada por tecidos mortos (casca)

Coriácea – que tem uma textura semelhante à casca da castanha ou do couro

Elíptica – folha com forma que lembra uma elipse, mais larga no meio e com o comprimento duas vezes a largura

Ovada – folha com a forma de um ovo mais larga perto da base

Mucronada – ápice da folha terminando numa ponta curta, por vezes aguda e rígida

Ápice – Ponta terminal ou vértice da folha ou de qualquer outro órgão

Racimo – Inflorescência agrupada cujas flores se inserem ao longo de um eixo comum – cacho

Florestas esclerófilas – Florestas compostas por espécies arbóreas e arbustivas providas de folhas rígidas, recobertas por uma cutícula protetora

Xerofílico – planta adaptada aos climas secos, a períodos de seca mais ou menos prolongada. Que consegue viver com pequenas quantidades de águas


Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos desta autora.

Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

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