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O que procurar no Inverno: zimbro-bravo

Início

O inverno chegou, mas ainda há muitas plantas para nos continuar a surpreender. Os zimbros estão agora repletos de frutos de várias cores, dependendo da fase de maturação em que se encontram.

Os zimbros, nome vulgar para as árvores e arbustos do género Juniperus, são das coníferas mais comuns e versáteis, utilizadas em jardins e outros espaços verdes. Podem ser vistos agora repletos de frutos de várias cores, dependendo da fase de maturação em que se encontram, que são o ingrediente base de uma bebida apreciada por muitos.

Género Juniperus

O género Juniperus pertence à família Cupressaceae e compreende 68 espécies reconhecidas e aceites em todo o mundo, com distribuição restrita ao hemisfério norte. A excepção é o Juniperus procera, cuja ocorrência se estende também para o hemisfério sul.

Em Portugal são seis as espécies nativas do género Juniperus, todas elas com distribuições bem distintas pelo território nacional.

Vamos conhecer um pouco melhor o zimbro-bravo, uma das mais bonitas e desconhecidas árvores de Portugal.

Zimbro-bravo

O zimbro-bravo (Juniperus oxycedrus subsp. oxycedrus) – também vulgarmente conhecido como zimbro, zimbro-galego, cedro-de-espanha, zimbro-vermelho, cedro-espinhoso, zimbro-espinhoso ou oxicedro – é uma pequena árvore que pode crescer até 12 metros, mas que raramente ultrapassa os 8 metros.

Foto: Luis Fernández García/WikiCommons

É uma espécie de crescimento lento, podendo viver até cerca de 200 anos.

Possui uma copa ampla, bastante ramificada, apresentando geralmente uma forma cónica ou oval, ainda que por vezes possa adquirir formas irregulares.

A casca é cinzenta a castanho-avermelhada e desprende-se em tiras estreitas.

As folhas são perenes, simples, lineares, pontiagudas, rígidas e aciculares – em forma de agulha. A folhagem apresenta uma coloração verde glauca devido à presença de duas faixas estomáticas esbranquiçadas na página superior, separadas por uma nervura verde. A página inferior da folha é toda verde.

As folhas surgem dispostas em verticilos de três por cada nó. São muito semelhantes entre si, podendo cada folha medir até 2,5cm de comprimento.

Foto: Krysztof Ziarnek/WikiCommons

O zimbro-bravo floresce no final do inverno, prolongando-se a época de floração até ao final da primavera. É uma espécie dióica, com flores masculinas e femininas, separadas em plantas diferentes.

As flores são minúsculas e pouco decorativas, de cor amarelada a acastanhada e surgem na axila das folhas.

As coníferas não possuem verdadeiros frutos. Neste caso concreto, a designação correta para essa estrutura de frutificação – ou estrutura reprodutora, que também encerra as sementes – é designada de gálbula.

As gálbulas do zimbro-comum, são frutificações pequenas, com 8 a 15 mm de diâmetro, indeiscentes, globosas a piriformes, carnudas, esverdeadas na fase inicial, tornando-se vermelhas, púrpuras ou castanho-avermelhadas no final da maturação. As gálbulas podem apresentar-se, na fase final da maturação, pruinosas ou não. Desde a formação até à maturação são necessários dois anos. Cada gálbula contém uma a três sementes ovóides, de cor castanha.

A designação científica do Juniperus oxycedrus deve-se em particular às características morfológicas da espécie. O nome em latim para o zimbro – Juniperus – deriva do celta ieneprus que significa áspero, muito em particular pelas suas folhas pontiagudas.

O termo genérico Juniperus, também poderá derivar da combinação de dois termos latinos iunio (jovem) e parere (produzir), muito provavelmente porque estas plantas perenes, produzem novos frutos enquanto os frutos da época anterior ainda estão a amadurecer.

O restritivo específico oxycedrus deriva da combinação do prefixo grego oxys-, que significa agudo ou pontiagudo e do género –Cedrus (cedro), pela semelhança das folhas entre as duas plantas.

Ecologia e distribuição

O zimbro-bravo é uma espécie nativa da Bacia do Mediterrâneo, presente em países como Portugal, Espanha, França, Itália, Marrocos, Argélia, Tunísia, Sardenha, Baleares e Córsega.

Em Portugal ocorre nas zonas de maior continentalidade, sobretudo nas regiões do interior norte e centro do território. Pode encontrar-se em Trás-os-Montes, Beira Interior, Bacia do Alto-Tejo, Estremadura e Alentejo.

Habita preferencialmente bosques de perenifólios de carvalhos, geralmente azinhais, ou zonas de matagal, onde por vezes é a espécie dominante, formando zimbrais.

Foto: Javier Martin/WikiCommons

Tem preferência por locais quentes, secos e soalheiros e é pouco tolerante à sombra. Do ponto de vista edáfico, pode crescer em qualquer tipo de solo, desde que solto, fino e bem drenado, com preferência por substratos ácidos, embora tolere outros tipos de pH do solo. Não tolera solos encharcados, mas suporta bem a salinidade.

O zimbro-bravo é muito resistente à seca, ao frio e às geadas, podendo suportar até -18ºc.

Ecologicamente, o zimbro-bravo é uma espécie particularmente importante. A densa folhagem fornece cobertura para a nidificação e a proteção contra predadores.

Algumas borboletas e mariposas usam os zimbros como plantas alimentares de larvas e para deposição de ovos.

As folhas são também um excelente alimento para inúmeros animais, como os veados, cabras e ovelhas.

Os “frutos” carnudos de zimbro são especialmente importantes como alimento no inverno para aves, como tentilhão e o tordo, e pequenos mamíferos, como o coelho-bravo. Estes animais, assim como o vento, são importantes agentes de dispersão das sementes desta espécie.

Uma árvore cheia de qualidades

O zimbro-bravo é uma pequena árvore, bastante vistosa e de aroma agradável, que fica bem em qualquer jardim ou espaço verde, seja como espécime isolado ou em grupos, em jardins residenciais ou em espaços públicos.

Foto: David Gaya/WikiCommons

A madeira de zimbro-bravo é escura, perfumada, durável, dura e difícil de trabalhar e pode ser usada em ebanisteria. Em tempos, por ser compacta, utilizou-se para vigas e postes, com utilização na construção, para esteios para as vinhas e no fabrico de lápis.

O óleo essencial extraído da madeira e das folhas, conhecido como “óleo de cade” ou “óleo empireumático” têm múltiplas aplicações:

É muito usado na medicina, na dermatologia humana e veterinária no tratamento de doenças de pele, como eczema, psoríase ou sarna. Este óleo tem também propriedades antiparasitárias, queratolíticas e antipruríticas. Noutros tempos usou-se como antisséptico e anti-helmíntico.

Também tem aplicação como repelente de parasitas e como incenso.

O óleo de cade é também usado como componente de fragrâncias em perfumes, sabonetes, detergentes, cremes e loções.

Outros registos etnobotânicos apontam que o zimbro-bravo também atuará ao nível do aparelho respiratório, no tratamento de doenças como tuberculose, bronquite e pneumonia, e que também terá sido usado no tratamento da obesidade.

Já as gálbulas têm aplicação no tratamento de infeções urinárias e articulações calcificadas e, em associação com as folhas, no tratamento de doenças parasitárias externas.

O zimbro e o gin

A gálbula de zimbro, conhecida por muitos como “baga de zimbro” é muito aromática. É utilizada como especiaria e como aromatizante e corante na confecção de bebidas destiladas, pelo seu sabor frutado e apimentado, muito semelhante à resina do pinheiro.

A utilização mais conhecida do zimbro é como matéria-prima do “vinho de zimbro”, que deu lugar, à zimbrada, mais conhecida como “Gin”. São as “bagas” do zimbro-comum (Juniperus communis) as mais utilizadas para esse fim. Existem também muitos fabricantes de bebidas espirituosas que também colhem “bagas de zimbro” para fazer vários tipos de aguardente.

A utilização de “bagas de zimbro” também é popular na confecção e tempero de vários pratos de carne, nomeadamente de caça (rola, faisão e coelho-bravo) e de vitela. A sua utilização deve ser ponderada, pois grandes quantidades podem ter um efeito negativo nos rins. Basta uma pequena dose destas “bagas” para que se sinta o aroma de zimbro.

As pessoas que já sofrem de doença renal devem mesmo evitar a sua utilização.

Outros zimbros de Portugal

Além do zimbro-bravo (Juniperus oxycedrus subsp. oxycedrus), em Portugal continental podemos encontrar mais algumas espécies nativas.

O zimbro-comum (Juniperus communis), que pode surgir sob a forma de duas subespécies: o zimbro-anão ou zimbro-rasteiro (J. communis subsp. alpina) mais comum em zonas de montanha, na faixa litoral norte e centro. E o J. communis subsp. hemisphaerica, mais frequente na região centro, na faixa continental, em bosques de montanha.

O piorro (Juniperus navicularis) é outra espécie nativa, endémica da Península Ibérica. Em Portugal a sua distribuição encontra-se restrita à região do estuário do Sado e à Península de Setúbal. Consta da lista das espécies Quase Ameaçadas em Portugal continental, segundo a IUCN – International Union for Conservation of Nature.

Outra das espécies nativas é a sabina (Juniperus turbinata), também conhecida como sabina-da-praia, zimbreira, zimbreiro, zimbro-das-areias. Como o nome comum indica é uma espécie presente na zona litoral, em zonas de dunas e arribas do litoral, mas também pode ser vista no interior. É comum no centro e sul de Portugal, do Cabo Mondego às bacias do Sado e do Guadiana, até à Serra do Caldeirão.

Nos Açores surge o cedro-do-mato (Juniperus brevifolia), árvore dominante das florestas húmidas de altitude. É uma espécie endémica do Arquipélago do Açores, presente em todas as ilhas do Açores, com exceção para a Ilha Graciosa. Na ilha de Santa Maria encontra-se quase extinta.

O cedro-do-mato está classificado como Vulnerável (VU) de acordo com os critérios da Lista Vermelha da IUCN. As populações desta espécie tendem a diminuir e a fragmentar de forma significativa. Observando-se um elevado declínio contínuo de indivíduos maduros.

Segundo a IUCN, “árvores de tamanho considerável agora são raras e a espécie é representada em grande parte por indivíduos do tamanho de um arbusto.”

O cedro-do-mato está protegido internacionalmente pelo Apêndice I da Convenção sobre a Conservação da Vida Selvagem e Habitats Naturais Europeus (Convenção de Berna).

O cedro-da-madeira (Juniperus cedrus) é uma espécie endémica do Arquipélago da Madeira, que também ocorre naturalmente nas Ilhas Canárias. O cedro-da-madeira está classificado como Ameaçado (Endangered – EN) de acordo com os critérios da Lista Vermelha da IUCN. Há apenas o registo de 600 indivíduos maduros em todo o mundo. No Arquipélago da Madeira estimam-se apenas cerca de 40 indivíduos.

Esteja na cidade, no campo ou na serra, na sua próxima saída esteja atento a estas pequenas árvores e arbustos. Durante o próximo gin, já pode contar a história da espécie que lhe deu origem.


Dicionário informal do mundo vegetal:

Acicular – em forma de agulha.

Faixa estomática – os estomas são estruturas que se encontram na epiderme da maioria dos órgãos aéreos das plantas, cuja principal função são as trocas gasosas. Normalmente os estomas estão dispostos aleatoriamente, no entanto, em algumas espécies, podem formar faixas.

Dióica – espécie que apresenta flores unissexuadas, femininas e masculinas, ocorrendo em indivíduos diferentes.

Gálbula – frutificação ou estrutura reprodutora, arredondada, pequena, em regra lenhosa, de algumas plantas (ex. cipreste e o zimbro) = Pseudocarpo = Gálbulo

Indeiscente – fruto que não se abre naturalmente quando maduro, não libertando as sementes.

Piriforme – em forma de pera.

Pruinosa – que esta revestido de pruína (cera em forma de pó muito fino, que confere um tom glauco)

Bosque perenifólio – formado por plantas com folhagem que persiste, na árvore, ao longo de todo o ano.


Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos desta autora.

Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

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