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O que procurar no Outono: o açafrão-bravo

Esta semana, numa das minhas caminhadas, encontrei um pouco por todo o lado o açafrão-bravo (Crocus serotinus) a pintar com os tons de azul e lilás das suas flores as bermas dos caminhos que percorri.

Sempre gostei de caminhadas pela natureza. São inúmeros os benefícios de passear por sobreirais, pinhais, montanhas, pastagens, etc. O ar livre faz-me sentir bem, a calma e a serenidade destes locais, ajudam-me a descontrair, a baixar os níveis de stress e, segundo dizem os especialistas, contribuem para a melhoria global do meu sistema imunitário.

Estas caminhadas incentivam à observação do meio e proporcionam uma grande interação com a natureza, levando a explorar tudo o que nos rodeia, desde a flora à fauna.

Esta semana, numa das minhas caminhadas encontrei um pouco por todo o lado o açafrão-bravo (Crocus serotinus) a pintar com os tons de azul e lilás das suas flores as bermas dos caminhos que percorri.

Açafrão-bravo num pinhal na Nazaré. Foto: Júlio Reis/WikiCommons

O açafrão-bravo

Esta espécie, também vulgarmente conhecido como cebolinhas ou pé-de-burro, é uma planta perene bolbosa que surge habitualmente após as primeiras chuvas de outono.

A designação científica desta espécie surge da particularidade de apresentar uma floração tardia. O nome do género Crocus deriva do grego – krókos – que significa “açafrão” e serotinus do latim que significa “tarde”, ou seja, que floresce mais tarde.    

Pertence à família das Iridaceae, que engloba outras espécies de monocotiledóneas bastante conhecidas como o íris, os gladíolos e as frésias, e que ostentam flores de cores muito vivas. O nome desta família surge do grego – Iridos – que significa “arco-íris”. Segundo a lenda, a Deusa grega Iris caminhava através de um arco-íris sempre que transportava mensagens de Olimpo para a Terra. Ao longo desse percurso levava consigo pedaços de arco-íris nos pés e quando caminhava na terra, das suas pegadas resultavam flores bastante coloridas e de todas as cores.

O açafrão-bravo é uma pequena planta, com cerca de 6 a 12 cm de altura, aparentemente sem caule. Do bolbo, que se encontra enterrado, surgem diretamente várias folhas longas e finas de cor verde e pequenas hastes florais de cor lilás azulado. As flores surgem geralmente primeiro que as folhas, de forma isolada ou em pequenos conjuntos de 2 a 3 flores por bolbo. A contrastar com a cor das tépalas, no centro da flor surgem 3 longos estames amarelos e um estilete ramificado de cor alaranjada.

Endemismo ibérico

O açafrão-bravo é uma planta endémica da Península Ibérica, ou seja, ocorre naturalmente apenas em Portugal, um pouco por todo o país e em Espanha, na região de Castela e Leão. Aparece preferencialmente em terrenos secos, pedregosos, áridos, frequentemente ácidos, em zonas de matos abertos, pinhais, carvalhais e prados.

Açafrão-bravo. Foto: Meneerke Bloem Meneerke bloem

Um endemismo (do grego – endemos – que significa “indígena”) é uma espécie que se desenvolve numa área biogeográfica muito restrita onde não foi introduzida pelo Homem. Este fenómeno acontece devido à atuação de determinadas barreiras físicas, biológicas e climáticas que levam à separação das populações de determinadas espécies. Os indivíduos passam a reproduzir-se em regiões diferentes, dando origem, muitas vezes, a novas espécies, que pelas suas características próprias apresentam uma distribuição geográfica muito limitada.

Muito utilizado como planta ornamental, o açafrão-bravo divide-se em três subespécies, todas presentes em Portugal Continental. O Crocus serotinus subsp. serotinus que corre no litoral centro e sul de Portugal, preferencialmente em zonas de pastagens secas e em clareiras de pinhais. Prefere solos arenosos. As folhas desta subespécie surgem parcialmente desenvolvidas durante o período de floração. O Crocus serotinus subsp. clusii ocorre na região centro de Portugal, em zonas de pastagens e prados e em áreas montanhosas. Adaptado a todo o tipo de substrato desde que não muito seco. As folhas surgem apenas após a floração. O Crocus serotinus subsp. salzmannii ocorre na região norte, em zonas de prados de montanha, clareiras de pinhais, orlas de bosques de carvalho e matos. Prefere terrenos secos e pedregosos. As folhas surgem apenas após a floração.

Crocus sativus e Curcuma longa

O açafrão-bravo é do mesmo género que o açafrão-verdadeiro (Crocus sativus), de onde é extraída uma das mais caras e delicadas especiarias do mundo – o açafrão.

Planta nativa da Ásia menor e dos Balcãs, o açafrão-verdadeiro apresenta igualmente uma floração outonal, mas já não se encontra em estado selvagem. É uma planta cultivada, pouco exigente em água, prefere solos soltos de granito, ligeiramente ácidos e pobres.

É cultivada para produção de flor. Cada bolbo produz anualmente uma ou mais flores de cor violeta azulada. O verdadeiro açafrão (especiaria) corresponde à parte feminina da flor de Crocus sativa, ou seja, o estigma e partes finais do estilete que apresentam uma alaranjada a vermelho. Para produzir um grama desta especiaria são necessários 200 a 300 destes filamentos, o que corresponde entre 150 a 250 flores. Todo o trabalho envolvido na colheita desta especiaria é realizado de forma manual.

O açafrão tem um aroma e sabor fortes e é um corante natural amarelo. Muito utilizado como aromatizante, também é usado para fins medicinais e em perfumaria.

O açafrão-verdadeiro não deve ser confundido com o açafrão-da-índia (Curcuma longa), também conhecido como açafrão-da-terra, gengibre-amarelo ou curcuma. Planta arbustiva trepadeira, da família das Zingiberaceae, nativa da floresta asiática. Do seu rizoma (caule subterrâneo, semelhante a uma raiz) seco e moído obtém-se uma especiaria de cor amarelo intenso muito utilizada em culinária como condimento ou corante. Também tem aplicações medicinais.

Dispersas um pouco por toda a parte, as plantas estão por toda a parte. Se estivermos atentos descobrimos em cada caminhada que fazemos, na berma de estradas e nos campos uma diversidade enorme de plantas que nunca tínhamos reparado antes.