Foto: José Prego/Wiki Commons
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O que procurar no Inverno: o lírio-de-amor-perfeito

Com a ajuda de Carine Azevedo fique a conhecer esta linda e delicada planta que por estes dias inicia o seu período de floração, podendo manter-se assim até ao fim da estação.

O outono e o inverno são as estações mais frias e mais sombrias.

A maioria das plantas entra em período de repouso vegetativo e reduz a sua atividade metabólica de forma a garantir um menor dispêndio de energia, já que as condições ambientais são desfavoráveis ao seu crescimento.

Porém, também existem espécies que não sofrem com as condições ambientais do outono e do inverno e que por isso florescem nestas estações do ano.

O lírio-de-amor-perfeito (Iris planifolia) é uma dessas plantas que inicia agora o seu período de floração, podendo manter-se em flor até ao final do inverno.

Iridaceae

A família Iridaceae, a que pertence o lírio-de-amor-perfeito, compreende 69 géneros botânicos e aproximadamente 2500 espécies, muitas das quais economicamente importantes.

As espécies dos géneros Gladiolus, Sparaxis, Iris, Freesia, Crocosmis, Tigridia e Crocus, são muito procuradas como plantas ornamentais de jardim, ou como flores de corte, em arranjos florais.

Para além do uso ornamental, muitas espécies são reconhecidas pelo seu aroma e propriedades terapêuticas, sendo muito utilizadas em perfumaria e medicina.

É dos estigmas das flores do Crocus sativus que é extraído o açafrão, a especiaria mais cara do mundo, indispensável em vários pratos da cozinha tradicional do Médio Oriente e Mediterrâneo.

A família Iridaceae tem uma distribuição quase mundial, embora seja mais abundante e diversificada em África.

As plantas desta família são maioritariamente herbáceas, perenes, que se desenvolvem a partir de bolbos, cormos ou rizomas. Possuem folhagem linear e flores grandes, de cores vivas.

Em Portugal, esta família está representada por 22 taxa, dos quais se destacam alguns bem conhecidos como o açafrão-bravo (Crocus serotinus), o lírio-amarelo (Iris pseudacorus), o lírio-do-Gerês (Iris boissieri), a espadana-dos-montes-de-folhas-largas (Gladiolus illyricus) e a Romulea columnae – a única espécie desta família que também é nativa nos arquipélagos da Madeira e dos Açores.

Lírio-de-amor-perfeito

O lírio-de-amor-perfeito (Iris planifolia) é uma planta perene, bolbosa, que pode crescer cerca de 10 a 15 centímetros de altura. Possui um bolbo subterrâneo, ovóide, com cerca de três centímetros de diâmetro, protegido por uma túnica castanha e com inúmeras raízes brancas, cilíndricas e carnudas.

Foto: Sergei Gussev/Wiki Commons

As folhas são verdes e brilhantes e desenvolvem-se junto ao solo, escondendo o caule curto que se forma a partir do bolbo. São lineares a lanceoladas e têm cerca de 10 a 35 centímetros de comprimento, com limbo recurvado e agudo no ápice.

As folhas mantêm-se numa posição vertical, uma característica distintiva do género Iris, para aproveitarem o máximo de luz solar disponível.

O lírio-de-amor-perfeito é considerado como tendo uma das maiores flores do género Iris. A floração pode começar em dezembro e prolongar-se até março, embora o período em que a flor se mantém aberta seja muito curto.

As flores são ligeiramente perfumadas, surgem solitárias ou em grupos de duas, têm cerca de seis a sete centímetros de diâmetro e são azul-violeta.

As tépalas externas são geralmente mais escuras, com veios brancos intercaladas por veios azuis e, no centro, são formadas por uma mancha amarelo-brilhante. São ligeiramente recurvadas nas pontas.

As tépalas internas são mais claras, de cor azul-pálido e mantêm-se numa posição mais vertical.

As flores são suportadas por pedicelos curtos e florescem normalmente acima das folhas densas.

O fruto é uma cápsula oblonga, de secção mais ou menos circular, deiscente, ou seja, que se abre quando está madura expondo as numerosas sementes, que se encontram geralmente dispostas em fileiras.

As sementes são castanhas e globosas, do tamanho aproximado das ervilhas.

Origem

A área de distribuição natural desta espécie está compreendida entre a região oeste e central do Mediterrâneo, ocorrendo em países como Portugal, Espanha, Grécia, Creta, Sardenha, Sicília, Argélia, Marrocos e Tunísia.

Em Portugal tem uma distribuição relativamente restrita, ocorrendo apenas na Beira Litoral, no Alto e Baixo Alentejo e no Algarve, sendo comum em pastagens e clareiras de matos.

O lírio-de-amor-perfeito tem preferência por locais de exposição solar plena. Pode tolerar locais de meia-sombra, mas sem luz suficiente, poderá não florir. A nível edáfico tem preferência por solos frescos, bem drenados e bem nutridos.

É resistente a temperaturas negativas, mas não é tolerante ao solo húmido e encharcado.

Foto: José Prego/Wiki Commons

O lírio-de-amor-perfeito é uma planta interessante para qualquer jardim, sendo um belo complemento para canteiros de flores ou em bordaduras, ou mesmo para ser cultivada em vasos e floreiras grandes para permitir o máximo de espaço para as raízes.

É necessário algum cuidado com esta planta, uma vez que todas as suas partes são tóxicas para os animais domésticos. A maior concentração de toxinas está presente no bolbo.

Símbolos, inteligência e sabedoria

Iris é o nome da deusa grega, mensageira dos deuses do Olimpo, deusa do arco de luz – arco-íris – que une o céu com a terra. Segundo a mitologia grega, a deusa Iris assegurava a comunicação entre o mundo dos deuses e o mundo dos homens.

A denominação científica para o nome do género Iris adequa-se perfeitamente já que as flores são intensamente coloridas, marcadas por um maravilhoso espectro de cores.

O restritivo específico planifolia deriva do grego e significa “com folhas planas” devido ao tipo de folhas desta planta.

As flores destas plantas simbolizam a pureza, a virgindade, a beleza e a renovação espiritual.

As flores dos lírios são as flores favoritas de muitos pintores, como Van Gogh, que as retratou em várias pinturas. Em 1987, uma das suas obras “Irises” de 1889, atingiu valores elevadíssimos, tendo sido o quadro mais caro vendido até então. 

A Iris é a flor-de-lis, elemento constante na heráldica da monarquia francesa desde o século XII, particularmente relacionada com o rei de França. É um símbolo oficioso daquele país, representando poder, soberania, lealdade e honra.

Esta flor também identifica a cidade de Florença, fazendo parte do seu brasão e gonfalão desde o século XI.

Foto: Por los caminos de Malaga/Wiki Commons

A flor-de-lis surge também associada à sabedoria, fazendo parte do símbolo da pedagogia, e também está frequentemente relacionada com a coruja, em virtude da associação que essa ave faz à sabedoria. O símbolo da Pedagogia é, na verdade, um caduceu com uma flor de lis à frente.

Além de símbolo da sabedoria, é igualmente um símbolo religioso. Para os cristãos representa a virgindade de Maria, a pureza do anjo Gabriel, bem como a Santíssima Trindade. 

No passado foi utilizada em cartas náuticas, representando o Norte com a sua ponta, exercendo a mesma função da rosa dos ventos, sendo por isso também considerada símbolo de orientação.

A flor-de-lis é o principal símbolo dos escoteiros e do escotismo mundial, pois representa os três pilares da promessa escoteira e a direção que os escuteiros devem seguir.

Com tanto simbolismo a envolver as espécies do género Iris, o lírio-de-amor-perfeito não podia ter melhor nome comum.

Procure o lírio-de-amor-perfeito pois começa agora a florir. E aproveite esse momento para fotografar as suas belas flores e partilhe-as connosco nas redes sociais com #oqueprocurar #plantasdeportugal #floranativa e #àdescobertadasplantasnativas. 


Dicionário informal do mundo vegetal:

Perene – planta que tem um ciclo de vida longo e que viver três ou mais anos.

Bolbosa – planta que produz um bolbo – caule subterrâneo, que contêm substâncias nutritivas de reserva e que se mantém ativo ao longo de todo o ano, ainda que a parte aérea seja renovada anualmente.

Túnica – membrana que reveste e protege o bolbo.

Linear – folha estreita e comprida (comprimento é 6 a 12 vezes mais do que a largura), com margens quase paralelas.

Lanceolada – folha com limbo que apresenta a forma de lança.

Limbo – parte larga de uma folha normal.

Tépala – peça floral não diferenciada em pétala ou sépala, que rodeia e protege os órgãos reprodutores da flor.

Pedicelo – “pé” que sustenta a flor.

Cápsula – fruto seco, com várias sementes, que abre e deixa as sementes cair quando maduro.

Deiscente – fruto que, quando maduro, se abre naturalmente para libertar as sementes.


Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos desta autora.

Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

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