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O que procurar no Outono: o loureiro

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Como o loureiro (Laurus nobilis) é facilmente reconhecido pelo cheiro característico das folhas quando maceradas, fica o desafio de o procurarem no Outono, cheio de frutos.

O loureiro (Laurus nobilis) é uma das espécies relíquia da floresta Laurissilva, também conhecida como floresta húmida subtropical. A floresta Laurissilva cobriu parte da bacia do Mediterrâneo, quando o clima da região era mais húmido e ameno. No entanto, e em consequência das alterações climáticas, esta floresta ocupa atualmente os arquipélagos da Madeira, Açores, Canárias e Cabo Verde.

Loureiro. Foto: David J. Stang/WikiCommons

A floresta Laurissilva, cujo nome deriva da combinação dos termos Laurus + silva (Laurus significa árvore da família lauraceae ou loureiro e silva floresta ou bosque) é formada por árvores maioritariamente pertencentes à família Lauraceae.

É na ilha da Madeira, nas regiões altas do norte, que se encontra uma das maiores e mais bem preservadas manchas (cerca de 15.000 hectares) remanescentes de um coberto florestal primitivo de floresta Laurissilva, considerada, em 1999, Património da Humanidade pela UNESCO.

Lauraceae

A família Lauraceae constitui uma família botânica relativamente grande, representada por 56 géneros e mais de 2.000 espécies, algumas das quais bem conhecidas, como o loureiro (Laurus nobilis), o abacateiro (Persea americana), a caneleira (Cinnamomum verum) e a canforeira (Cinnamomum camphora).

Esta família engloba maioritariamente espécies de porte arbóreo ou arbustivo, geralmente de folhagem persistente. No entanto, existem também alguns indivíduos caducifólios e algumas espécies trepadeiras.

Em Portugal, são três os géneros botânicos representados: Ocotea, Persea e Laurus, e seis as espécies nativas, maioritariamente presentes nas regiões insulares da Madeira e dos Açores, tais como o barbusano (Persea barbujana), o til (Ocotea foetens), o vinhático (Persea indica) e o loureiro (Laurus nobilis, Laurus azorica e Laurus novocanariensis).

O loureiro

O loureiro é também conhecido como louro, loureiro-comum, loureiro-dos-poetas sempre-verde, loureiro-continental, entre outros, e pode atingir idades entre os 80 e os 100 anos.

É uma pequena árvore que raramente ultrapassa os 10 metros de altura, de tronco direito, casca lisa, castanho-esverdeada e copa densa e irregular.

As folhas são perenes, coriáceas e aromáticas. São glabras, verde-escuras na página superior e verde-pálido na inferior. Possuem forma de lança, margem inteira, ligeiramente ondulada e nervuras secundárias pouco salientes, curvas e que não atingem a margem.

Folhas do loureiro. Foto: Kenraiz Krzysztof Ziarnek/WikiCommons

A floração ocorre entre fevereiro e maio e as flores perfumadas surgem dispostas em inflorescências masculinas e femininas, em grupos de 4 a 6 flores, que surgem nas axilas das folhas. As flores masculinas são amarelas e as femininas são branco-amareladas.

O fruto é uma drupa carnuda, de formato ovóide, semelhante a uma azeitona. Possui cor verde-brilhante na fase inicial de formação, tornando-se negra na maturação, que ocorre no início do outono, habitualmente entre final de setembro e novembro. Cada fruto contém uma semente. O fruto persiste na árvore durante o inverno mas não é comestível.

Os louriçais

O loureiro é uma espécie nativa da região mediterrânica e em Portugal surge espontaneamente um pouco por todo o território continental, sendo mais abundante na faixa do litoral das regiões do Centro e Norte. Também está presente em algumas ilhas do Arquipélago dos Açores, onde terá sido introduzida.

Embora classificado como uma árvore de plena luz, o loureiro também suporta condições de sombra. Requer clima ameno, sem secura estival ou períodos de geada prolongadas. É pouco exigente quanto ao tipo de solo, sendo indiferente ao pH, ainda que prefira os solos não calcários, férteis, leves, frescos e soltos. Mas é comum em terrenos secos e pedregosos.

É uma espécie moderadamente resistente ao frio, que necessita de precipitações ou rega nos meses mais quentes de verão e que é intolerante a uma exposição marítima excessiva. É uma árvore altamente resistente a pragas e doenças e rebenta facilmente de toiça e raízes.

O loureiro surge habitualmente em matagais, sebes, bosques e galerias ripícolas, em associação com muitas outras espécies nativas, como os amieiros, freixos, salgueiros, carvalhos, medronheiros, entre outras.

Sebe de loureiros. Foto: Fausta Samaritani/WikiCommons

Em determinados territórios, o loureiro é a espécie dominante, estabelecendo formações arbustivas altas e densas denominadas de louriçais, que integram uma elevada diversidade florística de outras espécies vegetais, nomeadamente espécies trepadeiras e outras plantas de porte herbáceo. 

Ornamental, condimentar e medicinal

O loureiro é uma espécie com grande potencial ornamental e paisagístico, sendo frequentemente utilizado com sucesso para formar sebes ou como elemento isolado em jardins, parques e outros espaços verdes.

Na medicina tradicional é utilizado como estimulante, antisséptico, sedativo e sudorífero, sendo particularmente interessante no tratamento de problemas digestivos e no alívio de dores articulares.

A infusão de folhas, por exemplo, facilita a digestão e o óleo extraído das bagas e das folhas, é utilizado para aliviar dores articulares, além de também ser usado em aromaterapia, em massagens terapêuticas e na indústria de perfumes.

Estudos relativamente recentes evidenciam a presença de uma substância química (lauroside B isolado) inibidora da proliferação das células do melanoma humano (cancro da pele) nas folhas de loureiro.

As suas folhas também são utilizadas verdes ou secas, como condimento alimentar, especialmente para aromatizar molhos, sopas, marinados e refogados e temperar pratos de carne e peixe em geral. Depois de colhidas, a conservação das folhas não deve ir além de um ano, uma vez que perdem o aroma característico a louro.

O fruto seco e o óleo essencial obtido das folhas também podem ser utilizados como aromatizantes de alimentos.

A madeira de louro possui pouca longevidade, para além de raramente atingir porte arbóreo. No entanto, é muito procurada em marchetaria por ser dura, pesada, pela sua tonalidade branco-rosa e possuir um aroma agradável.

O loureiro é também um excelente inseticida natural, protegendo as plantas circundantes de insectos indesejados.

Laureados

Esta espécie está associada, desde antiguidade, à sabedoria, proteção e paz.

É também símbolo de vitória e de louvor, tendo sido utilizado por Gregos e Romanos para distinguir méritos individuais de heróis, atletas, poetas, imperadores, artistas, doutores, sábios e campeões, por meio da atribuição de uma coroa de folhas de louro.

O título de bacharel reflete esse costume, uma vez que essas coroas de folhas de louro eram muitas vezes complementadas pelos próprios frutos (Bacca-laureatus = premiado com a “baga do louro”).

O termo laureado que hoje em dia é utilizado para atribuir uma distinção ou prémio a uma personalidade tem também origem nestas tradições.

Já para o Cristianismo o louro é um símbolo de prosperidade e simboliza a ressurreição de Cristo. No início da Era Cristã, os mortos eram cobertos de folhas de louro para simbolizar a vida eterna, pois a planta permanecia sempre verde.

Loureiro. Foto: David J. Stang/WikiCommons

Para muitos outros, o louro é reconhecido por ter “poderes mágicos” e por ter capacidade de atrair dinheiro, havendo quem o use como amuleto dentro da carteira.

Os Laurus de Portugal

O nome genérico desta planta Laurus, deriva do latim “laus” que significa “louvor”, para destacar as suas propriedades curativas e o restritivo específico nobilis, deriva do adjetivo latino nobilis – e que significa “ilustre, importante, famoso”.

Para outros, o nome do género deriva do celta “laur”, que significa “verde”, porque as folhas se mantêm sempre verdes.

Já para os Gregos, Laurus é o nome clássico em Latim da árvore sagrada de Apolo, a que chamavam de Daphne em virtude da lenda que viu a ninfa Dafne, filha do Deus Peneu, transformada num loureiro, para escapar ao “amor obsessivo” de Apolo, Deus da medicina, da arte e da música. Esta espécie ficou associada ao mais belo e luminoso Deus do Olimpo, como símbolo do seu amor pela ninfa Dafne.

Perante tal transformação, Apolo declarou: “Já que não podes ser minha esposa, serás a minha planta preferida e eternamente me acompanharás. Usarei as tuas folhas sempre verdes como coroa e participarás em todos os meus triunfos, consagrando com a tua verdura perfumada as frontes dos heróis.”

Além do Laurus nobilis, o loureiro-continental, existem outras duas espécies nativas do género em Portugal:

O Laurus azorica, vulgarmente conhecido como loureiro, loureiro-dos-açores, louro-da-terra, louro-bravo ou louro-macho, cuja distribuição nativa está restringida ao arquipélago dos Açores, podendo encontrar-se em todas as ilhas dos Açores.

O Laurus novocanariensis, vulgarmente conhecido como loureiro da Madeira, é uma espécie endémica da Ilha da Madeira e das Ilhas Canárias.

As três espécies são muito semelhantes, no entanto existem diferenças genéticas, morfológicas e fisiológicas que permitem distingui-las, além de se encontrarem em habitats distintos.

E como o loureiro é facilmente reconhecido pelo cheiro característico das folhas quando maceradas, fica o desafio de o procurarem agora cheio de frutos e, mais tarde, na primavera, com as suas belas e perfumadas flores.


Dicionário informal do mundo vegetal:

Coriácea – que tem uma textura semelhante à casca da castanha ou do couro.

Glabra – sem pelos.

Drupa – Fruto carnudo que contém uma única semente, protegida por um caroço duro.


Todas as semanas, Carine Azevedo dá-lhe a conhecer uma nova planta para descobrir em Portugal. Encontre aqui os outros artigos desta autora.

Carine Azevedo é Mestre em Biodiversidade e Biotecnologia Vegetal, com Licenciatura em Engenharia dos Recursos Florestais. Faz consultoria na gestão de património vegetal ao nível da reabilitação, conservação e segurança de espécies vegetais e de avaliação fitossanitária e de risco. Dedica-se também à comunicação de ciência para partilhar os pormenores fantásticos da vida das plantas. 

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