Que espécie é esta: nemerte Cerebratulus marginatus

O leitor José Carlos Martins encontrou este animal na praia da ilha da Armona, Olhão, a 6 de Março de 2010 e pediu para confirmar a espécie. Roberto Martins responde.

“Chamo-me José Carlos Martins e em 2010 encontrei este bichinho numa praia da Ilha da Armona, Olhão. Coloquei-o num alguidar com água do mar e fotografei-o. Na altura não sei se já existia a Wilder ou não, eu não conhecia, mas teria sido bom se existisse ou se eu a conhecesse, é que tinha-me poupado muito tempo de perguntar aqui e ali o que era isto. Foi um cientista nas Canárias que o identificou, pois aqui na Universidade do Algarve não o conheciam, embora me tivessem dito a qual filo poderia pertencer, mas sem garantir. É um Cerebratulus marginatus, vulgarmente conhecido aqui por tripa (termo de origem espanhola porque tal como la tripa (barriga) pode-se distender e contrair) ou também por correia devido ao aspeto. É muito usado como isco de pesca desportiva e tem um muco muito perigoso, causador de forte reação alérgica quando em contacto com a pele, os olhos ou a boca”, escreveu o leitor à Wilder.

“Na busca pela espécie descobri o mundo dos nemertíneos, um filo que quase nunca vem nos livros e enciclopédias mas que, curiosamente, contém o animal mais comprido do mundo. Há um nemertíneo destes que, segundo as informações, pode distender-se a comprimentos de mais de 50m – Lineus longissimus.”

Trata-se do nemerte Cerebratulus marginatus.

Espécie identificada e texto por: Roberto Martins, biólogo marinho e investigador do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar, da Universidade de Aveiro.

Efetivamente, de acordo com a checklist de espécies ibéricas de 2015, parecia-me ser a Cerebratulus marginatus.

Para ter certeza, contactei um especialista, o Dr. Fernando A. Fernández-Álvarez, investigador na National University of Ireland, Galway (Irlanda) que teve a gentileza de confirmar que, efetivamente, parece ser um fragmento (sem a cabeça!) do nemerte Cerebratulus marginatus.

Tal como os anelídeos, estes vermes têm tendência a fragmentar-se como mecanismo de defesa.

A título de curiosidade esta espécie é considerada um complexo críptico de espécies, pelo que ninguém sabe exatamente a qual delas o nome realmente se refere, uma vez que, de acordo com Verder et al. (2021) não se conhece um espécime-tipo e, portanto, não existem sequências de DNA dos organismos da localidade-tipo, isto é, onde foi descrita pela primeira vez  (norte do Mar Adriático) para que se possam fazer comparações morfológicas e/ou moleculares.  

De qualquer forma, importa mencionar que os nemertes são um filo de invertebrados com mais de 1.300 espécies descritas e que ocorrem em praticamente todos os ecossistemas bentónicos (i.e. vivem nos sedimentos) do litoral costeiro ou plataforma continental.

No caso particular do C. marginatus, tende a viver em fundos arenosos ou lodosos até aos 150 metros de profundidade. Pode atingir uns espantosos 100 centímetros de comprimento e 2.5 centímetros de largura com coloração variável de verde-acastanhado, verde-acizentado, ou castanhos com margens laterais tipicamente claras ou transparentes como se vê na foto.

O investigador Roberto Martins agradece ao Dr. Fernando A. Fernández-Álvarez pela preciosa ajuda nesta identificação.


Agora é a sua vez.

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Explore a série “Que espécie é esta?” e descubra quais as espécies que já foram identificadas, com a ajuda dos especialistas.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.