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Maçarico-de-bico-direito. Foto: Frank Vassen

Conheça o estranho caso da ave que ganha com as alterações climáticas

Uma equipa coordenada por um investigador da Universidade de Aveiro descobriu que os maçaricos-de-bico-direito (Limosa limosa) estão a beneficiar com a antecipação do período mais quente do ano.

 

Também conhecidas por milherangos, estas aves podem ser observadas em Portugal nos meses de Inverno, em estuários e zonas húmidas como a Ria de Aveiro e o Estuário do Sado.

Mas quando chega o tempo mais quente, partem para latitudes mais elevadas, como é o caso da Islândia, onde costumam nidificar.

Agora, um estudo publicado em Março na revista científica Ecology and Evolution, onde foi capa, revelou “que o aquecimento que se verifica nos territórios de nidificação – especialmente na Islândia, onde decorreu o estudo – e que está associado às alterações climáticas, tem provocado a antecipação das posturas desta espécie”, indicou em comunicado a Universidade de Aveiro (UA).

 

Um dos maçaricos objecto do estudo coordenado pela Universidade de Aveiro. Foto: JAA

 

A equipa de cientistas foi coordenada por José Alves, investigador do Departamento de Biologia da UA e do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM). 

Como estão a nascer mais cedo, os maçaricos acabam por ter mais tempo para se prepararam para as migrações, “originando um aumento do número de efectivos”, concluiu o artigo agora publicado, no qual colaboraram também investigadores das universidades da Islândia e de East Anglia e Cambridge, estas duas últimas no Reino Unido.

Os cientistas analisaram os dados das temperaturas na Islândia desde 1845, onde as Primaveras com temperaturas acima da média têm acontecido cada vez mais nas últimas décadas. Ao mesmo tempo, o número de maçaricos-de-bico-direito na ilha tem estado a aumentar cada vez mais. 

 

investigador debruçado junto a um lago
Análise de um ninho de maçarico encontrado na Islândia. Foto: UA

 

“No início do século XX, esta população reproduzia-se numa área restrita na costa sudoeste da Islândia e estima-se que compreendia apenas 5.000 indivíduos”, explicou José Alves no comunicado. “O aumento da temperatura média desde então permitiu aos indivíduos nestes locais produzir descendência cada vez com maior sucesso, colonizando progressivamente praticamente toda a área costeira do país”. 

Hoje em dia, calcula-se que o número destas aves  aumentou para mais de 50.000 em todo o território islandês, referiu também o investigador da UA.

Conclusão? “O benefício retirado do aquecimento é algo expectável para uma população que se encontra no limite norte da sua área de distribuição e potencialmente limitada pelas baixas temperaturas que ocorrem a estas latitudes.”

Ainda assim, ressalvou, muitas espécies não têm as mesmas capacidades de adaptação às alterações climáticas, tendo em conta por exemplo os  impactos nos insectos de que se alimentam e que dão a comer às suas crias. “Devemos, por isso, continuar e aprofundar os esforços na redução das emissões de carbono e na minimização do aquecimento global”, sublinhou o cientista português.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.