Abutre-do-egipto libertado no Douro Internacional

Um abutre-do-egipto (Neophron percnopterus) foi libertado esta sexta-feira no Douro Internacional. A Wilder falou com Julieta Costa, do projecto LIFE Rupis, sobre a história desta ave e sobre o que está a acontecer no terreno para conservar esta espécie de abutre Em Perigo de extinção em Portugal.

 

A libertação deste abutre-do-egito, também conhecido como britango, realizou-se esta tarde no miradouro de Penedo Durão, em Freixo de Espada à Cinta.

 

Foto: Life Rupis

 

É uma ave adulta que foi encontrada por uma habitante de Poaires no passado domingo. “O abutre estava debilitado e com pouco peso, cerca de 1.200 gramas”, disse Julieta Costa. Por isso foi levado para o Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens (CERVAS), em Gouveia. Ali foram feitas várias análises, incluindo um despiste de contaminação por chumbo, que teve um resultado negativo.

O abutre, ao qual foi dado o nome de Poiares, foi alimentado, ganhou peso e passou pelo túnel de voo do CERVAS. “Agora está bem de saúde” e, por isso, foi libertado, numa acção onde estiveram presentes a população local, o presidente da Câmara de Freixo de Espada à Cinta, elementos da Junta de Freguesia de Poiares, do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), da GNR e da Junta de Castela e Leão.

Antes de ser devolvida à natureza, a ave recebeu um emissor GPS para permitir aos técnicos do Life Rupis – Conservação do britango e da águia-perdigueira no vale do rio Douro (2015-2019) conhecer os seus movimentos no Douro. “O Poiares vai ser o segundo britango marcado, depois do Rupis”, lembrou Julieta Costa. Esta ave, hoje com quatro anos de idade, foi marcada em Julho do ano passado, no âmbito do mesmo projecto de conservação desta espécie e da águia-perdigueira. Ontem, o Rupis estava a Norte de Miranda do Douro, bem perto da fronteira.

Estas aves passam o Inverno em África e, depois de uma viagem em que têm de sobrevoar os obstáculos do deserto do Saara e do Estreito de Gibraltar, chegam a Portugal em Abril para se reproduzir. Ficam por aqui até princípio de Setembro.

O Douro Internacional alberga o maior núcleo de abutre-do-egito em Portugal e é um dos mais importantes da Península Ibérica.

Este é o mais pequeno dos abutres ibéricos. Tem até 65 centímetros de comprimento e uma envergadura de asa de entre 1,55 e 1,70 centímetros. Pode pesar até cerca de dois quilos. A sua plumagem é essencialmente branca e preta; tem face amarela e cauda longa.

O britango alimenta-se de carcaças de outras aves e mamíferos e de fruta e vegetais já em estado de decomposição. Por vezes, pode caçar animais debilitados. Por dia, este abutre pode viajar 80 quilómetros em procura de alimento. Segundo a Spea, esta é uma das aves mais “inteligentes”. Por exemplo, consegue usar pedras para partir ovos de avestruz para se alimentar, quando está em África.

Segundo o censo de 2016, existem actualmente 121 casais confirmados e outros 14 possíveis na área do projecto LIFE Rupis, que inclui o Parque Natural do Douro Internacional (cerca de 95.000 hectares) e o Parque Natural de Arribes del Duero (107.000 hectares). “Foram identificadas quatro zonas com territórios abandonados, ou seja, que os britangos deixaram de usar há três anos, e três zonas com casais novos”, acrescentou a responsável.

Nesta altura do ano, os abutres estão a alimentar as suas crias nos ninhos. “Estas deverão começar a voar em meados ou fins de Junho.”

De acordo com a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (Spea), nos últimos 40 anos a população de britangos na Europa tem sofrido um declínio de cerca de 50%. “As principais ameaças são a redução de disponibilidade alimentar, o uso ilegal de veneno, a perturbação dos locais de nidificação, a colisão com linhas elétricas e a electrocussão”, explica a organização.

O projecto de conservação transfronteiriço tem várias medidas a decorrer no terreno para ajudar estas aves. “Temos já seis campos de alimentação geridos no âmbito do Life Rupis para fazer um reforço da alimentação”, disse Julieta Costa. Além disso, os técnicos fazem um controlo da eventual perturbação em redor dos ninhos, a pesquisa de venenos, a correcção de linhas eléctricas e a reactivação de pombais, uma vez que os pombos são uma das presas da águia-perdigueira.

O Life Rupis foi lançado em Julho de 2015, em território português e espanhol na zona do Douro Internacional para ajudar a reforçar as populações de águia-perdigueira (Hieraaetus fasciatus) e de britango, através da redução da mortalidade e aumento do sucesso reprodutor destas espécies. O projecto dura até 2019 e é co-financiado por por fundos comunitários do Programa LIFE.

A coordenação está entregue à Spea, que tem mais oito entidades parceiras, como a Associação Transumância e Natureza, a Palombar, o ICNF, a Junta de Castela e Leão, a Fundación Patrimonio Natural de Castilla y Léon, a Vulture Conservation Foundation, a EDP Distribuição e a GNR.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.