Acidificação dos oceanos está a calar estes camarões

Os oceanos podem estar a tornar-se mais silenciosos. Cientistas da Universidade de Adelaide descobriram que a acidificação dos oceanos pode estar a calar os camarões-pistola, um dos invertebrados mais ruidosos dos mares.

 

Num estudo publicado hoje na revista Proceedings of the Royal Society B, os investigadores mostram que, até ao final deste século, o som dos camarões vai ser reduzido substancialmente por causa dos níveis previstos de dióxido de carbono (CO2) nos oceanos.

Este silêncio terá consequências profundas para muitas espécies que dependem de pistas sonoras para localizar alimento, abrigo, parceiros e distinguir potenciais predadores.

“Os recifes costeiros estão longe de ser ambientes calmos, estão cheios de sons e estalidos altos”, diz Tullio Rossi, da Escola de Ciências Biológicas da Universidade de Adelaide, na Austrália, em comunicado.

“Os ‘coros’ dos camarões podem ser ouvidos vários quilómetros mar adentro e são importantes porque podem ajudar à navegação de jovens peixes para as suas casas. Mas a acidificação dos oceanos está a colocar esse processo em risco”, acrescentou.

O estalido feito por estes camarões é o som mais comum e alto produzido por animais marinhos nos ecossistemas costeiros. Estes conseguem produzir sons até aos 210dB através de bolhas, formadas pelo rápido fechar das suas pinças. Fazem-no para afugentar predadores e quando estão eles próprios a caçar.

Rossi e os colegas mediram o som feito por camarões perto de aberturas vulcânicas naturais, que libertam CO2, em três localizações no oceano e no laboratório. Descobriram reduções substanciais nos níveis de som e na frequência com que os camarões accionavam as suas pinças. Pode ouvir aqui a diferença nos sons.

“Os nossos resultados sugerem que isto é causado por uma alteração de comportamento e não por uma impossibilidade física”, comentou Ivan Nagelkerken, da mesma universidade. “Este resultado é muito inquietante. O som é uma das pistas de orientação mais fiáveis no oceano porque pode viajar centenas de quilómetros com poucas alterações, enquanto as pistas visuais e os cheiros podem ser afectados pela luz, claridade da água e turbulência”, acrescentou.

Os investigadores deixam um alerta. “Se as emissões de CO2 emitidas pelos humanos continuarem a este ritmo, a acidificação dos oceanos daí resultante vai transformar recifes cheios de vida e sonoros em habitats silenciosos. E, tendo em conta o papel importante dos sons naturais para os animais nos ecossistemas marinhos, estas não são boas notícias para a saúde dos nossos oceanos”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.