Ave da Amazónia quebra recorde para animal que emite som mais alto

O canto dos machos da araponga-da-Amazónia, ave que vive nas montanhas no Norte do Brasil, na região da Amazónia, é o mais alto alguma vez registado para um animal, revelou um novo estudo científico.

Investigadores afirmam, num artigo científico publicado na revista Current Biology a 21 de Outubro, que os machos da araponga-da-Amazónia (Procnias albus) têm o canto mais alto alguma vez documentado para um animal, com uma intensidade de 125 decibéis.

Os chamamentos são bem mais elevados do que os feitos pelo capitão-do-mato (Lipaugus vociferans), ave da família Cotingidae, que agora passou a ser a segunda ave que canta mais alto.

Na verdade, os chamamentos da araponga-da-Amazónia são tão altos que os investigadores se perguntam como é que as fêmeas os ouvem, a curta distância, sem ficarem com danos permanentes na sua audição.

“Ao observar arapongas-da-Amazónia, tivemos a sorte de ver fêmeas a juntar-se aos machos nos ramos onde estes estavam empoleirados a fazer a sua corte”, disse Jeff Podos da Universidade de Massachusetts, em comunicado. “Nestes casos, vimos que os machos cantam apenas as suas canções mais barulhentas. E não só isso, eles rodam durante esses cantos, para que as notas finais sejam feitas directamente para as fêmeas.”

Jeff Podos disse que “gostaria muito de saber porque as fêmeas estão dispostas a permanecer tão perto dos machos quando eles estão a cantar tão alto”, acrescentou. “Talvez estejam a tentar avaliar os machos de perto, apesar de correrem riscos de danificar o seu sistema auditivo.”

Os investigadores dizem que é difícil descrever o quão alto é o som destas aves porque é difícil fazer comparações entre sons ouvidos a distâncias diferentes. Podos diz que os sons dos macacos-uivadores e dos bisontes são muito altos mas nem de perto tão altos como os da araponga-da-Amazónia. E isto é impressionante por causa do pequeno tamanho desta ave em comparação com aqueles mamíferos. As arapongas pesam apenas um quarto de quilograma.

Tudo começou quando, em expedições anteriores às montanhas da Amazónia, Mario Cohn-Haft, co-autor do estudo e investigador do Instituto Nacional brasileiro de Pesquisas da Amazónia não pôde deixar de reparar nas arapongas. As aves tinham características anatómicas intrigantes, incluindo músculos abdominais anormalmente desenvolvidos. O especialista suspeitou que isso estivesse relacionado com o canto. Mas não havia quaisquer informações na literatura científica. Não se sabia quase nada sobre estas aves e como elas cantavam.

Por isso, Cohn-Haft e Podos decidiram registar os cantos desta ave eles próprios.

Foi uma surpresa descobrir que os machos de araponga-da-Amazónia cantam mais alto do que qualquer outra espécie de ave conhecida, mas os autores também ficaram a saber que há um senão. À medida que os cantos se tornam mais altos, também se tornam mais curtos em duração. Os investigadores sugerem que isso se deve a limitações na capacidade do sistema respiratório das aves para controlar o fluxo de ar e gerar som.

A descoberta oferece ainda outro exemplo das consequências da selecção sexual. A selecção sexual acontece quando os machos competem entre si, elevando a evolução a patamares bizarros e exagerados, incluindo a cauda de um pavão e o canto extremamente alto da araponga.

Em futuros estudos, disse Cohn-Haft, ele quer estudar melhor “as estruturas físicas e anatómicas e os comportamentos que permitem às arapongas produzir sons tão elevados e sem sofrerem danos na audição”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.