Botânicos descobrem em Espanha uma nova espécie de planta

A planta de flores brancas Phalacrocarpum oppositifolium esteve “escondida” debaixo dos narizes dos investigadores. Agora foi descrita num artigo publicado na revista Molecular Phylogenetics and Evolution.

Habitualmente, as espécies de plantas que se descrevem como novas permaneceram escondidas da Ciência na natureza devido ao seu pequeno tamanho e vida efémera (como a Gyrocarium oppositifolium) ou à sua raridade, às vezes aliada ao seu mimetismo (como a Gadoria falukeie a Pseudomisopates rivasmartinezii).

No entanto, outras estavam guardadas em colecções científicas, debaixo dos nossos narizes, mas não as reconhecíamos como novas porque, aparentemente, não se distinguem à vista desarmada e não tínhamos informação genética. A estas últimas chamam-lhe espécies crípticas.

Espécie críptica descoberta neste trabalho, na Serra de Toloño (La Rioja). Foto: David Criado Ruiz/RJB-CSIC

Phalacrocarpum é um género de plantas endémico da Península Ibérica, um dos 27 reconhecidos na Flora Iberica. Nesta obra reconhece-se apenas uma espécie com três subespécies. Mas há algumas regiões onde a incerteza taxonómica é revelante e resolver essa incógnita tem sido um dos objectivos ao que se propuseram alguns botânicos.

Utilizando vários marcadores moleculares, uma equipa de investigadores do Real Jardim Botânico (RJB-CSIC) de Madrid revelou a existência de uma espécie críptica, que habita nas serras da província de Burgos, Álava e La Rioja, no Norte de Espanha.

“É muito diferente geneticamente não apenas da subespécie na qual se acreditava estar incluída mas também do resto das populações recenseadas de todo o género”, explicou, em comunicado, Gonzalo Nieto Feliner, investigador do RJB-CSIC. Segundo o botânico, a equipa descobriu também “a existência de processos de hibridação que explicam a incerteza taxonómica que originou a investigação”.

No Vale de Sanabria foi identificada uma zona híbrida, resultado do contacto de duas subespécies (hoffmannseggii e anomalum), que gera populações híbridas com uma gama vasta de variação de características morfológicas e genéticas, tal como se explica no artigo publicado na revista Molecular Phylogenetics and Evolution.

Exemplar de Phalacrocarpum oppositifolium de Covas (Orense). Foto: Gonzalo Nieto Feliner/ RJB-CSIC

Mas o mistério não terminou aqui. Nas serras da Galiza paralelas à fronteira com Portugal e nas zonas limítrofes com o nosso país deduz-se uma hibridação mais antiga moldada por outros processos posteriores, motivados pelas alterações climáticas durante o Quaternário, provavelmente incluindo fragmentação de áreas e deriva genética.

Para entender a distribuição desta espécie críptica, os investigadores do RJB-CSIC contaram com a colaboração e com as colecções científicas de Juan A. Alejandre, grande conhecedor da flora daquela região de Espanha.

A equipa que descobriu esta nova espécie vai agora tentar compreender melhor “os factores que possibilitam as alterações evolutivas nas plantas no Mediterrâneo e na actual diversidade de plantas”, disse Nieto Feliner. 


Já que está aqui…

Apoie o projecto de jornalismo de natureza da Wilder com o calendário para 2021 dedicado às aves selvagens dos nossos jardins.

Com a ajuda das ilustrações de Marco Nunes Correia, poderá identificar as aves mais comuns nos jardins portugueses. O calendário Wilder de 2021 tem assinalados os dias mais importantes para a natureza e biodiversidade, em Portugal e no mundo. É impresso na vila da Benedita, no centro do país, em papel reciclado.

Marco Nunes Correia é ilustrador científico, especializado no desenho de aves. Tem em mãos dois guias de aves selvagens e é professor de desenho e ilustração.

O calendário pode ser encomendado aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.