Lobo-ibérico. Foto: Arturo de Frias Marques/Wiki Commons

Cães de gado vão ajudar lobos e rebanhos a coexistir no sul do Douro

O projecto LIFE WolFlux tem como objectivo aumentar a conectividade desta subpopulação portuguesa de lobo-ibérico, actualmente “em posição precária”.

 

Uma das novas acções deste projecto co-financiado por fundos comunitários passa pela integração de cães de gado com os rebanhos locais, o que já teve início com a entrega do primeiro filhote de Serra da Estrela, baptizado de Leão.

O objetivo é incorporar 100 cães com o gado existente na área abrangida pelo projecto, explicou Sara Aliácar, técnica de conservação da Rewilding Portugal, organização que coordena a equipa do LIFE WolFlux. “Ao reduzir a predação dos lobos e assim promover a coexistência entre as pessoas e o lobo, o Leão e os cães que o seguirem contribuirão para a recuperação da espécie, aumentando a estabilidade, a interacção e a expansão territorial das alcateias já estabelecidas”, acrescentou a mesma responsável, citada em comunicado.

 

O primeiro Serra da Estrela do programa, Leão. Foto: LIFE LIFE WoIFlux

 

Os cães Serra da Estrela são uma das raças caninas mais antigas da Península Ibérica e protegem há vários séculos os gados a sul do Douro contra lobos ibéricos e cães vadios. Esta é todavia uma tradição que se está a perder, especialmente em territórios onde o lobo já quase nunca é avistado.

Ainda assim, a integração destes cães de gado é considerada uma medida fundamental para “o regresso do lobo ibérico ao seu papel de predador de topo na cadeia trófica”.

“Um pastor com cães Serra da Estrela pode proteger-se da predação de lobos com muito mais eficiência do que um que não os utilize”, explica Sara Aliácar. “Os cães detectam invariavelmente a presença dos lobos primeiro. Num habitat rochoso e arbustivo como aquele que caracteriza a área deste projeto, a estratégia que eles utilizam consiste em deitarem- se, esconderem-se e ficarem de vigia”.

 

Desde pequeninos

Para que a iniciativa seja bem sucedida, os cães têm começar a acompanhar rebanhos e manadas quando ainda são filhotes, pois só assim vão criar um vínculo mais forte com os animais que deverão proteger. Antes disso, cabe aos pastores pedirem para aderir ao novo programa.

“A equipa da Rewilding Portugal visita então o pastor para avaliar se o cão é realmente necessário. Se a avaliação for positiva, um cachorro de Serra da Estrela é fornecido gratuitamente, assim como os serviços de seguro, alimentação e veterinário até o animal completar os 18 meses de idade, quando se considera que estará apto a realizar todas as suas funções.”

Os cães são fornecidos pelo Grupo Lobo, uma ONGA (organização não governamental ambiental) portuguesa que trabalha na conservação do lobo-ibérico e do seu habitat. “Se o cão incorporado vier a ter filhotes, o pastor envolvido é incentivado a entregar dois deles ao programa, para que este possa continuar a ajudar mais pastores.”

Prevista está também a entrega de vedações eléctricas a pastores, para aumentar a protecção do gado.

 

Mais corços, menos ataques

A perda de habitat, a pouca conectividade entre grupos e o conflito com humanos são causas para a actual “posição precária” dos lobos-ibéricos a sul do Douro, a que se junta a falta de presas silvestres.

“Actualmente, os lobos a sul do rio Douro dependem fortemente de gado doméstico para alimentação, representando este mais de 90% da dieta de algumas alcateias”, indicam os responsáveis deste projecto financiado por fundos comunitários e co-financiado pelo programa Endangered Landscapes. No entanto, as novas medidas que tentam travar os ataques ao gado só terão sucesso se os lobos tiverem fontes alternativas de alimento, avisam.

Assim, outra acção traduz-se no aumento das populações locais de corço, de forma a que haja presas silvestres em quantidade suficiente. Além da Rewilding Portugal, estão envolvidos neste trabalho os outros parceiros deste projecto LIFE, incluindo a Universidade de Aveiro, a ATNatureza, a associação Zoo Logical e a Rewilding Europe.

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.