Andorinha-das-chaminés (Hirundo rustica). Foto: Standbild-Fotografie/WikiCommons

Cerca de 40% das aves comuns de Espanha estão a tornar-se cada vez mais raras

Actualmente, 37% das aves comuns de Espanha estão em situação desfavorável. Neste grupo estão a laverca, a codorniz, o andorinhão-preto ou o melro-das-rochas, revela a SEO/Birdlife.

Todas as Primaveras há já 25 anos, mais de 1.000 voluntários saem de casa com um objectivo: registar as aves de Espanha, no âmbito do programa de Seguimento e Estudo das Aves Comuns na Primavera (Sacre) da Sociedade Espanhola e Ornitologia (SEO/Birdlife).

São mais de 1.000 pessoas que “calçam as botas e reivindicam o papel fundamental da ciência cidadã na conservação da natureza à escala mundial”, comentou Asunción Ruiz, directora-executiva da SEO/Birdlife.

Este programa de ciência cidadã “oferece dados consolidados e validados cientificamente sobre o estado de conservação de mais de 100 espécies de aves” mais comuns de Espanha.

Andorinha-das-chaminés (Hirundo rustica). Foto: Standbild-Fotografie/WikiCommons

Segundo os dados mais recentes relativos aos últimos 25 anos, divulgados a 27 de Abril, 44% das espécies têm uma tendência populacional positiva e 19% têm uma tendência estável. Entre estas aves está o pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula), que registou um aumento de 44,4%, muito explicado pelas reflorestações de bosques e pelo abandono da actividade agrícola e florestal em algumas zonas. 

Mas estes números não satisfazem a SEO/Birdlife.

Ainda segundo os dados de 25 anos do Sacre, 37% das aves comuns – incluindo espécies tão conhecidas como a perdiz ou a andorinha-das-chaminés – estão numa situação de conservação desfavorável. Porquê? A SEO/Birdlife aponta o dedo às alterações climáticas e às práticas agrícolas insustentáveis.

Este é, na opinião de Asunción Ruiz, “um sinal de alarme que deve activar políticas e acções claras para responder à crise ecológica que sofremos e para a qual espécies tão populares como o pardal-comum, a perdiz ou o andorinhão-preto, Ave do Ano 2021, nos têm vindo a alertar há demasiado tempo”. 

Para a SEO/Birdlife, esses 37% são uma percentagem elevada, “sobretudo se tivermos em conta que 26 delas (62% das que estão em declínio) registaram um declínio superior a 30% desde 1998”.

Pardal-comum. Foto: Tim/Pixabay

Algumas destas espécies em declínio estão presentes em grande parte do território: picanço-real (Lanius meridionalis), laverca (Alauda arvensis), calhandra-real (Melanocorypha calandra), codorniz (Coturnix coturnix), chasco-cinzento (Oenanthe oenanthe), chasco-ruivo (Oenanthe hispanica), toutinegra-do-mato (Curruca undata), escrevedeira-amarela (Emberiza citrinella), escrevedeira-de-garganta-cinzenta (Emberiza cia), andorinha-das-chaminés (Hirundo rustica), gralha-de-nuca-cinzenta (Corvus monedula) e perdiz-vermelha (Alectoris rufa).

Por exemplo, o melro-das-rochas (Monticola saxatilis), uma espécie ligada à alta montanha, registou uma impressionante descida de 95,3% nas suas populações desde 1998. A diminuição dos seus efectivos é uma das mais altas registadas entre as aves comuns. “As alterações climáticas podem ser um dos causadores deste declínio porque é na alta montanha que este fenómeno está a causar alterações na fauna e na flora a maior velocidade”, segundo a SEO/Birdlife.

Melro-das-rochas. Foto: Imran Shah/WikiCommons

Já para o picanço-real (Lanius meridionalis), que regista um declínio de 62,6%, a maior ameaça é o uso de produtos químicos para acabar com as “ervas daninhas” nas explorações agrícolas mas que acabam por matar também grande parte da vida animal das mesmas, como gafanhotos, grilos e pequenos vertebrados que são cada vez mais escassos.

O andorinhão-preto (Apus apus), espécie comum que desde há séculos está depende de construções humanas para pôr os seus ovos, é cada vez mais raro por causa da poluição, falta de locais onde criar e por falta de alimento. Esta espécie registou uma tendência negativa de 27,2%.

“Surpreende-nos ver na lista dos declínios aves que fazem parte do nosso imaginário colectivo porque são aves que sempre nos acompanharam”, comentou Asunción Ruiz.

Em Portugal, a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) tem a decorrer o seu Censo de Aves Comuns (realizado de 1 de Abril a 31 de Maio no Continente e de 15 de Maio a 15 de Junho nos Açores). Segundo este censo, que foi lançado em 2004, as três espécies de aves mais observadas em Portugal Continental entre 2004 e 2019 foram o pardal-comum (Passer domesticus), o pombo-doméstico (Columba livia) e a andorinha-das-chaminés (Hirundo rustica). Mas esta última, tal como acontece em Espanha, também regista em Portugal uma tendência negativa, com um “declínio acentuado” ao longo dos 16 primeiros anos do censo. 

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.