Cientistas já sabem por que algumas aves marinhas comem tanto plástico

Uma equipa de cientistas quis saber por que tantas aves marinhas cometem o erro de ingerir plásticos. A resposta é que este lixo marinho cheira a comida, segundo um estudo publicado a 9 de Novembro na revista Science Advances.

 

O plástico marinho é uma armadilha olfactiva para as aves marinhas. Tudo porque emite o cheiro de um composto sulfuroso que algumas aves marinhas usam há milhares de anos para saber onde encontrar alimento, revela a equipa de investigadores da Universidade da Califórnia. Esta dica olfactiva engana as aves, fazendo-as confundir o plástico marinho pelas suas presas naturais.

Estima-se que cerca de 60% de todas as espécies de aves marinhas do mundo tenham plástico no seu organismo e que 90% de todos os indivíduos de aves marinhas vivos hoje já ingeriram algum tipo de plástico.

“Normalmente os animais têm uma razão para tomar as suas decisões”, disse Matthew Savoca, principal autor do estudo, em comunicado. “Se queremos compreender verdadeiramente a razão pela qual os animais estão a comer plásticos nos oceanos, temos de pensar sobre como é que eles encontram o alimento”, acrescentou.

Para descobrir a que cheira o plástico marinho, os investigadores colocaram pequenas contas, com entre quatro a seis milímetros de diâmetro, feitas de três tipos comuns de plástico no oceano (HDPE, LDPE, and PP) em Monterey Bay e em Bodega Bay, ao largo da costa da Califórnia. Três semanas depois recolheram essas contas de plástico.

 

Matthew Savoca. Foto: Matthew Savoca/UC Davis
Matthew Savoca. Foto: Matthew Savoca/UC Davis

 

Graças a um dispositivo para análise química, a equipa confirmou que as três variedades de plástico – que representam 60% de todos os plásticos produzidos no mundo – adquiriram o cheiro ao composto sulfuroso sulfureto de dimetilo (DMS) menos de um mês depois de estarem no oceano, em concentrações que as aves marinhas podem detectar.

Este DMS funciona como uma pista para muitos animais marinhos saberem onde há alimento. O DMS é libertado quando animais microscópicos, krill, ingerem as algas que crescem junto à superfície dos oceanos. Este DMS acaba por chegar às narinas de muitas aves marinhas, especialmente albatrozes e pardelas, que utilizam o olfacto para encontrar alimento. Para estas aves, este cheiro é sinónimo da presença de grandes massas de plâncton, alimento preferido do krill que, por sua vez, é o alimento preferido de muitas aves. Mas às vezes, esta dica olfactiva está errada e as consequências são desastrosas.

Todos os anos, oito milhões de toneladas de plásticos acabam a boiar nos oceanos. Mais cedo ou mais tarde estas superfícies sólidas ficam cobertas de algas.

O estudo descobriu também que as aves marinhas que seguem o cheiro do DMS para encontrar as suas presas têm seis vezes mais probabilidades de comer plásticos do que aquelas aves que não o fazem.

“Pensamos que estas aves são como pequenos humanos voadores com os nossos sentidos, mas não são”, disse a investigadora Gabrielle Nevitt à revista norte-americana The Atlantic. “A sua acuidade visual é mais pobre que a nossa, e este mundo dos cheiros é extremamente importante”, acrescentou.

Os autores do estudo lembram que mais de 200 espécies de peixes, mamíferos, tartarugas e aves marinhas consomem plásticos nos oceanos. As aves marinhas estão especialmente em risco; um recente modelo sugere que mais de 99% de todas as espécies de aves marinhas terão ingerido lixo plástico em 2050.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Pode ler aqui o estudo científico destes investigadores.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.