Cientistas portugueses encontram microplásticos em pinguins da Antárctida

Oceano Antártico. Foto: José Xavier

Três espécies de pinguins que vivem na Antárctida estão a ingerir microplásticos há mais de 15 anos, revela um estudo internacional coordenado por cientistas portugueses.

Os microplásticos (partículas com menos de 5 mm) foram encontrados no organismo de pinguins de três espécies: pinguim Adelie (Pygoscelis adeliae), pinguim de barbicha (Pygoscelis antarcticus) e pinguim gentoo (Pygoscelis papua).

Oceano Antártico. Foto: José Xavier

Para o descobrir uma equipa internacional de investigadores, liderada por cientistas da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC), recolheu amostras de fezes destes animais, em várias colónias reprodutoras da Antárctida, entre 2006 e 2016.

O resultado da análise a estas amostras foi agora publicado num artigo na revista Science of the Total Environment, um trabalho no qual participaram também investigadores da Universidade de Nova de Lisboa, do Museo Nacional de Ciencias Naturales (Espanha) e do British Antarctic Survey (Reino Unido).

Os investigadores encontraram, concretamente, microplásticos como poliéster e polietileno, entre outras partículas de origem antropogénica e processadas, na maioria fibras. Estas, apesar de serem de origem natural (celuloses), são produzidas artificialmente e podem ter compostos, como tintas, que podem persistir no ambiente. 

Concluíram que há uma “presença generalizada de microplásticos em todas as espécies, colónias e anos do estudo”, revelou um comunicado da Universidade de Coimbra enviado à Wilder.

“Os microplásticos estão cada vez mais difundidos nos ecossistemas marinhos, identificados agora na Antártida, o que é preocupante dada a sua persistência no meio ambiente e a sua acumulação nas cadeias alimentares”, sublinham os autores do estudo. 

Pinguins. Foto: José Xavier

Para Joana Fragão, autora principal do estudo e investigadora do Departamento de Ciências da Vida da FCTUC e do Centro de Ciências do Mar e do Ambiente (MARE), “o mais impressionante dos resultados foi verificar que os microplásticos estavam presentes na dieta das três espécies de pinguins, em vários locais e nos vários anos do estudo (2006, 2007, 2008, 2012, 2013, 2014 e 2016), o que demonstra que estas partículas se encontram já bem difundidas no ecossistema marinho Antártico”.

Mas qual o impacto negativo destes microplásticos para os pinguins? “Este é dos primeiros estudos a avaliar a presença de microplásticos nestas espécies, pelo que ainda não sabemos quais os efeitos negativos que estas partículas podem causar”, respondeu Joana Fragão à pergunta da Wilder.

“O que sabemos de efeitos noutras espécies aquáticas, em estudos realizados em laboratório, é que as partículas podem causar danos físicos (ex. no tracto digestivo). No entanto, as partículas também podem ter efeitos tóxicos nas espécies uma vez que podem libertar determinados aditivos químicos, ou podem absorver componentes do meio envolvente os quais podem colocar as espécies em risco. Posto isto, o próximo passo deste trabalho passa muito por avaliar a presença destas partículas no meio envolvente, como são ingeridas pelas espécies e quais os danos que podem causar às espécies.”

Por enquanto, a equipa afirma que não existe um foco específico para a origem destas partículas. “O próximo passo é avaliar os efeitos destas partículas nestes ambientes”, explicou Filipa Bessa, coautora do estudo e especialista em poluição por microplásticos da UC.

Os resultados obtidos, sublinha José Xavier, autor sénior do artigo científico, “vão certamente ser muito úteis para abrir novas áreas de investigação nesta temática e avançar com políticas para reduzir o impacto da poluição por plásticos no Oceano Antártico no contexto do Tratado da Antártida”.

Estes três cientistas da FCTUC, defendem que “são necessários mais estudos para entender melhor a dinâmica espaço-temporal, destino e efeito dos microplásticos nesses ecossistemas, e controlar a contaminação por plásticos na Antártida”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.