Milhafre-real. Foto: Vnyyy/Wiki Commons

Cinco dos milhafres-reais libertados em Espanha estão agora no Alentejo

Acção com aves provenientes do Reino Unido destinou-se a reforçar a população de casais nidificantes desta espécie. Prevêem-se novas libertações até ao final de 2024.

Os cinco milhafres-reais (Milvus milvus) fazem parte de um grupo de 30 aves da mesma espécie que foram libertadas em Julho passado no sudoeste de Badajoz, na região espanhola da Extremadura, muito perto da aldeia da Amareleja e da Zona de Protecção Especial Moura-Mourão-Barrancos, explicou à Wilder Alfonso Godino, que está ligado ao LIFE Eurokite.

“A atracção pelo Alentejo é muito similar à atracção que os milhafres do centro da Europa sentem para vir para Portugal desde latitudes mais setentrionais”, indicou o mesmo responsável, que trabalha na organização espanhola AMUS-Acción por el Mundo Salvaje, uma das entidades parceiras do projecto europeu. “As zonas do Alentejo com uma paisagem ondulada, com vegetação dispersa e pouco densa dos montados junto às áreas de culturas de cereal e estepárias, são um habitat óptimo para o milhafre-real.”

Zonas aproximadas onde os 5 milhafres-reais foram localizados, sendo que o ícone mais à direita destina-se a assinalar o local da libertação, junto à fronteira. Imagem: AMUS/LIFE Eurokite

Desde há várias semanas que cinco das aves libertadas em Julho atravessaram a fronteira e permanecem agora na região alentejana. E poderão não ser um caso único, pois esta libertação em Espanha insere-se num processo que se vai estender até ao final de 2024, com a introdução na natureza de um total de 100 milhafres. “Estes milhafres-reais procedem das populações de Inglaterra, dado que esse país mantém populações muito grandes da espécie, cerca de 6000 casais, e por isso o risco de afectar a população doadora é inexistente”, notou Alfonso Godino. Além do mais, é possível que as aves britânicas tenham antepassados espanhóis.

A necessidade de reforçar a presença do milhafre-real no sul de Espanha deve-se à situação “precária” das populações reprodutoras da espécie. O último censo realizado no país, em 2014, apontou para um total de 2300 a 2500 casais nidificantes, sendo que destes menos de 50 estavam no sul do território. A situação é ainda mais grave em Portugal, onde parece confirmada a extinção do milhafre-real como reprodutor a sul do Tejo.

Milhafres-reais no dia da libertação. Foto: D. Lindo

Ainda assim, é cedo para perceber se os milhafres que dispersaram para o território nacional irão reproduzir-se deste lado da fronteira. Só em 2024 é que as primeiras aves começarão a nidificar, no seu terceiro ano de vida.

Envenenamentos preocupam

No entanto, permanecem alguns receios quanto ao futuro destes e de outros milhafres-reais no Alentejo. No âmbito do LIFE Eurokite, que faz o seguimento por GPS de várias aves da espécie, encontraram-se desde Outubro de 2020 um total de 10 milhafres mortos nesta região, dos quais cinco nos primeiros meses.

“É provável que sejam mais, juntando as aves detectadas pelo SEPNA (Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente) da GNR, pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas ou pelas várias ONG que estão a trabalhar no sul do país”, acrescenta Alfonso Godino, que acrescenta que segundo vários estudos, “as aves encontradas mortas são uma percentagem muito inferior e às vezes mínima das que realmente morrem”. “O número real de milhafres-reais mortos no Alentejo, neste período, pode ser de várias dezenas”, acredita.

Para já, para 8 de Janeiro, está prevista em vários países europeus a contagem invernal de milhafres-reais, que em Portugal se faz em colaboração com a SPEA – Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves. E pode ser que os cinco milhafres recém-chegados de Espanha constem dos resultados. “Apelo a todas as pessoas que queiram participar ou que conheçam dormitórios da espécie a que se juntem. Serão mais que bem-vindos”, afirmou Alfonso.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.