Colapso de insectos nesta floresta mostra o que pode estar a acontecer no planeta

O investigador Brad Lister regressou à floresta tropical de Luquillo, em Porto Rico, 35 anos depois e descobriu que 98% dos insectos terrestres tinham desaparecido.

 

“Nos primeiros dias apercebemo-nos de que algo estava em falta”, disse Brad Lister, da Rensselaer Polytechnic University, nos Estados Unidos, citado hoje pelo jornal The Guardian. “Estavamos na floresta e, tanto o Andrés (Garcia, investigador da Universidade Nacional Autónoma do México) como eu, perguntámos: ‘Onde estão as aves?’ Não havia nada.”

O seu regresso à floresta de Luquillo, 35 anos depois, revelou uma descoberta aterradora. A população de insectos que providenciava alimento abundante para as aves deste parque nacional tinha colapsado. Ao nível do solo, 98% dos insectos tinham desaparecido. Lá em cima, na copa das árvores, a percentagem era de 80%.

Estes números foram publicados em Outubro do ano passado num artigo científico na revista Proceedings of the National Academy of Sciences. As causas deste declínio foram atribuídas ao aumento de 2ºC registado nas florestas tropicais do Nordeste de Porto Rico desde meados de 1970.

“Foi um verdadeiro colapso nas populações de insectos naquela floresta”, disse Lister. “Começamos a apercebermo-nos de que isto é terrível, uma descoberta muito, muito, perturbadora.”

Os insectos são um pilar fundamental da cadeia alimentar e deles dependem inúmeros animais. Por exemplo, em Luquillo, “os sapos e as aves também registaram sérios declínios, de entre 50% a 65%”, disse Lister. Na floresta de Luquillo, uma das coisas que Lister notou foi a ausência de borboletas. “Costumavam estar ao longo dos caminhos, especialmente depois de ter chovido, centenas atrás de centenas. Agora não vimos nem uma.”

Os investigadores explicam que os insectos tropicais são muito sensíveis às alterações climáticas porque evoluíram num clima muito estável e não estão adaptados às variações climáticas.

O trabalho em Porto Rico é apenas um dos poucos estudos que estão a avaliar esta questão e cujos resultados são profundamente preocupantes. O número de insectos voadores nas reservas naturais da Alemanha caíram 75% em apenas 25 anos. O desaparecimento virtual das aves numa floresta de eucaliptos australiana foi justificado com uma falta de insectos, causada pela seca e pelo calor. Lister e o seu colega Andrés García também descobriram que o número de insectos numa floresta do México caiu 80% desde os anos 1980.

“Estamos, essencialmente, a destruir os sistemas que suportam a vida e que nos permitem ter a nossa existência no planeta, ao lado de todas as outras formas de vida”, disse Lister. “É simplesmente horrível assistir a como estamos a dizimar o mundo natural desta maneira.”

“Não sei se a maioria das pessoas tem uma visão de sistema do mundo natural, mas está tudo ligado e quando os invertebrados entram em declínio, toda a cadeia alimentar vai sofrer e degradar-se.”

Para compreender a dimensão do problema do colapso dos insectos, do qual ainda só temos um vislumbre, é preciso muito mais informação em muitos mais habitats, defende Lister. “Mais dados, este é o meu mantra.”

O problema é que nas últimas décadas houve poucos estudos sobre o número de insectos para servirem de referência. Ainda assim, Lister insiste. “Não há melhor altura como o presente para começar a perguntar o que está a acontecer.”

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Recorde a entrevista da Wilder à entomóloga Patrícia Garcia-Pereira, “Estamos muito longe de conhecer a fauna de insectos de Portugal Continental”.

 

[divider type=”thick”]Precisamos de pedir-lhe um pequeno favor…

Se gosta daquilo que fazemos, agora já pode ajudar a Wilder. Adquira a ilustração “Menina observadora de aves” e contribua para o jornalismo de natureza. Saiba como aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.