Coruja. Biodiversidade. Foto: KevinsPhoto/Pixabay

Comissão Europeia aprova a sua proposta de Lei de Restauro da Natureza até 2050

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Os Estados membros terão de cumprir objectivos juridicamente vinculativos para restaurar 80% dos habitats em mau estado e recuperar a natureza de todos os ecossistemas, desde as terras agrícolas, às florestas e aos mares.

A proposta de Lei de Restauro da Natureza, para reparar os danos causados à natureza europeia até 2050, “é um passo crucial para evitar o desaparecimento dos ecossistemas e prevenir piores consequências das alterações climáticas e de perda de biodiversidade”, explica Bruxelas em comunicado.

Coruja. Biodiversidade. Foto: KevinsPhoto/Pixabay

A natureza europeia está num estado de deterioração alarmante. Mais de 80% dos seus habitats estão em mau estado. As zonas húmidas, as turfeiras e os habitats de dunas estão entre os mais afectados. Além disso, 71% das populações de peixes e 60% das populações de anfíbios diminuíram na última década. Estima-se que entre 1997 e 2011, a perda de biodiversidade tenha representado uma perda anual de entre 3,5 e 18,5 mil milhões de euros.

Hoje, a Comissão Europeia propôs a primeira legislação da história a propor explicitamente restaurar a natureza da Europa. Assim, “serão aplicados a todos os Estados membros objectivos juridicamente vinculativos para o restauro da natureza em diferentes ecossistemas que complementarão a legislação vigente”.

O objectivo é que as medidas de restauro da natureza alcancem, pelo menos, 20% das zonas terrestres e marítimas da União Europeia (UE) até 2030 e se estendam a todos os ecossistemas que precisem de ser restaurados até 2050.

O restauro será conseguido através de técnicas de renaturalização, reflorestação, enverdecimento das cidades e eliminação da contaminação para permitir a recuperação da natureza.

Bruxelas explica também que “restauro da natureza não equivale a protecção da natureza e não implica, automaticamente, a criação de mais áreas protegidas”. “Ainda que as áreas protegidas também precisem de ser restauradas, devido ao estado em que estão cada vez mais deteriorado, nem todas as zonas restauradas se converterão em áreas protegidas.”

Estuário do Tejo. Foto: Joana Bourgard/Wilder

Isto porque o restauro não exclui a actividade económica e consiste em “viver e produzir em harmonia com a natureza, recuperando mais biodiversidade em todas as partes incluindo nas zonas onde se desenvolvem actividades económicas”.

O investimento no restauro da natureza soma entre 8 e 38 euros no valor económico a cada euro gasto, graças aos serviços dos ecossistemas, que garantem a segurança alimentar por exemplo, e à presença da natureza no dia-a-dia, com benefícios para a saúde e bem-estar.

A Lei de Restauro da Natureza vai estabelecer objectivos e obrigações de restauro num amplo leque de ecossistemas terrestres e marinhos. As prioridades serão os ecossistemas que têm maior potencial para eliminar e armazenar carbono e prevenir ou reduzir o impacto das catástrofes naturais.

A nova Lei baseia-se na legislação vigente mas cobre todos os ecossistemas, não apenas as áreas protegidas pela Directiva Habitats e a Rede Natura 2000. Contará com um financiamento substancial da UE: o actual quadro financeiro plurianual destinará cerca de 100.000 milhões de euros à Biodiversidade, incluindo o restauro.

canoa no rio tejo
Foto: Joana Bourgard

Entre os objectivos estão o travar da diminuição dos polinizadores até 2030 e o seu aumento a partir desse ano; o travar da perda de espaços verdes urbanos até 2030, o aumento de 5% até 2050, o coberto mínimo de árvores de 10% em todas as cidades e o aumento de espaços verdes integrados em edifícios e infra-estruturas; o aumento da biodiversidade nos ecossistemas agrícolas (em especial as borboletas e as aves); aumento geral da biodiversidade nas florestas; o restauro de habitats marinhos como as pradarias marinhas e o aumento de espécies como golfinhos, tubarões e aves marinhas; e eliminação das barreiras fluviais para que, pelo menos, 25.000 quilómetros de rios passem a ser rios de caudal livre até 2030.

Para alcançar estes objectivos, a Lei exigirá aos Estados membros a elaboração de planos nacionais de restauro, em estreita colaboração com investigadores, as partes interessadas e os cidadãos. E imporá normas específicas quanto ao acompanhamento, avaliação, planificação, apresentação de relatórios e execução.

Esta proposta é a principal contribuição da UE para as negociações em curso sobre um quadro mundial para a diversidade biológica posterior a 2020, que será adoptado na Conferência das Partes da Convenção sobre a Diversidade Biológica (COP15), a acontecer em Montreal de 7 a 15 de Dezembro deste ano.

“Os europeus disseram-no claramente: querem que a UE actue em favor da natureza para que volte a ocupar um lugar nas suas vidas”, comentou o comissário europeu do Ambiente, Oceanos e Pesca, Virginijus Sinkevičius.

Foto: Johan Hansson / Wiki Commons

“Os cientistas também o disseram claramente: não há tempo a perder. E também é claro o argumento comercial: cada euro gasto no restauro da natureza dar-nos-á, pelo menos, oito. Esta proposta histórica trata disso mesmo, de restaurar a biodiversidade e os ecossistemas para que possamos viver e prosperar em harmonia com a natureza”, acrescentou.

“É a primeira lei deste tipo à escala mundial e esperamos que possa inspirar um elevado compromisso internacional para a protecção da biodiversidade na próxima COP15.”

Agora, a proposta de Lei será avaliada pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho Europeu. Quando for adoptada, as suas consequências serão progressivas, sendo que as medidas de restauro da natureza devem estar em vigor até 2030.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.