um picanço-barreteiro
Foto: Michele Lamberti

Conferência internacional em Évora junta especialistas em contagens de aves

A conferência “Bird Numbers 2019: counting birds counts” realiza-se esta semana na Universidade de Évora. A Wilder falou com João Eduardo Rabaça, ligado à organização, e diz-lhe cinco assuntos principais que fazem parte do encontro internacional.

 

Realiza-se de três em três anos e vai ser a primeira em Portugal. A 21ª edição da conferência organizada pelo European Bird Census Council (EBCC) realiza-se desta vez em parceria com o LabOr – Laboratório de Ornitologia, ligado à Universidade de Évora.

“Esta conferência tem uma mensagem forte – ‘a contagens de aves conta’ para a sociedade – que está ligada à história desta conferência, desde sempre focada na ecologia das aves e na utilização das aves como indicadores ambientais, uma questão muito particular”, disse à Wilder João Eduardo Rabaça, responsável científico do LabOr e um dos organizadores deste encontro.

Assim, durante a próxima semana mais de 200 delegados de 40 países da Europa, América, África e Ásia vão reunir-se em Évora para apresentar e debater várias questões ligadas a este tema, incluindo os resultados mais recentes de alguns dos grandes projectos coordenados pelo EBCC.

Fique a conhecer cinco dos temas que vão ser falados e debatidos durante o encontro, entre esta segunda-feira, 8 de Abril, e o próximo sábado.

 

1. PECBMS – Esquema Pan-europeu de Monitorização de Aves Comuns:

Pardal-comum. Foto: Tim/Pixabay

 

Tem 1980 como ano de referência e quase 40 anos de escala temporal e é como se fosse uma “pérola” entre os projectos do EBCC. “É um projecto único no mundo, tendo em conta o número de anos de duração, numa escala transnacional como esta”, nota João Eduardo Rabaça, que é também docente na Universidade de Évora.

Por toda a Europa, ao abrigo deste projecto conhecido pela sigla inglesa PECBMS e que se realiza em parceria com a BirdLife International, fazem-se todos os anos contagens de aves comuns nidificantes. Em causa estão espécies “com uma ampla distribuição e uma abundância relativamente elevada”, e que as autoridades não consideram prioritárias no que respeita à conservação.

O problema é que várias destas espécies, como indicam os resultados das contagens, “têm vindo a decrescer de forma sustentada” nos últimos anos. É o que se passa principalmente com espécies associadas ao meio agrícola, como algumas cotovias, chapins, picanços-barreteiros e até mesmo o pardal, por exemplo, nalguns países europeus. Em causa estão mudanças como as rápidas alterações de paisagem e de processos agrícolas durante as últimas décadas.

“Isto é um grande motivo de preocupação, até porque se trata de aves relativamente comuns”, alerta o mesmo responsável.

 

2. Atlas Europeu das Aves Nidificantes:

Cegonhas. Foto: Gilles Pretet/Wiki Commons

 

João Eduardo Rabaça explica que o primeiro atlas europeu foi publicado em 1997 pelo EBCC e baseou-se na compilação de informações de vários países, por vezes recolhida de forma diferente. Quanto à segunda edição, outro dos grandes projectos desta associação europeia, deverá ser lançada em breve, pois o trabalho de campo já terminou e a fase de análise está também no final.

Desde já, sabe-se que esta versão vai ter algumas diferenças em relação à primeira, adianta o responsável científico do LabOr. “Foi elaborada a partir de uma metodologia de registos mais avançada que a anterior”, uma vez que foram seguidos os mesmos métodos de contagens para todos os países. Em causa estiveram cinco anos de trabalho de campo dedicados a mais de 500 espécies nidificantes em mais de 50 países europeus, incluindo Portugal, entre 2013 e 2017.

Uma das principais novidades é que vai incluir toda a parte continental da Rússia, “o que demonstra que ao nível das aves é possível alcançarmos uma dimensão verdadeiramente pan-europeia”, pois o projecto estende-se desde aquele território até às ilhas dos Açores. As páginas deste novo volume vão também incluir espécies da Turquia e do Cáucaso e resultam do esforço conjunto de mais de 50.000 voluntários na recolha de informação, incluindo muitos milhares de cidadãos-cientistas e ornitólogos profissionais.

 

3. Novo portal EuroBird:

um picanço-carreteiro
Picanço-barreteiro. Foto: Michele Lamberti/Wiki Comuns

 

A conferência em Évora vai ser o palco do lançamento da nova versão do EuroBird Portal, na terça-feira, dia 9. Este portal compila informação a partir de registos de observações de aves recolhida em várias plataformas online, como por exemplo o eBird, e está por isso muito assente em ciência cidadã.

Os dados tratados através deste projecto do EBCC permitem analisar os movimentos migratórios de mais de uma centena de espécies e resultam do trabalho de cerca de 100.000 voluntários e de 40 milhões de registos.

“Através do portal, podemos ver por exemplo quando é que os primeiros picanços-barreteiros – o símbolo da conferência deste ano – começam a chegar à Europa e quais os países onde vão sendo observados ao longo dos meses”, explicou o mesmo responsável, adiantando que a nova versão vai ser “graficamente mais apelativa e muito mais intuitiva para os utilizadores”.

 

4. Aumentar o número de cidadãos-cientistas:

Foto: Helena Geraldes

 

A importância dos resultados de monitorização das aves para a tomada de decisões em políticas públicas na Europa – na Política Agrícola Comum, por exemplo – e a forma de envolver mais cidadãos nas contagens vão ser outros temas em cima da mesa.

João Eduardo Rabaça lembra que actualmente mais de metade da população mundial vive em grandes cidades, pelo que “a ligação à dimensão natural tem vindo a perder-se”. Assim, a contagens de aves e outros projectos de ciência cidadã ligados à biodiversidade são a forma encontrada pelas pessoas “para tentarem retomar essa ligação à natureza, tão importante para o seu bem-estar.” Ao mesmo tempo, “sentem que estão a dar o seu contributo para a resolução de alguns dos principais problemas, como as alterações climáticas e a perda da biodiversidade.”

Uma das vantagens das aves é que “muitas espécies vêem-se e ouvem-se, ao contrário por exemplo de muitos mamíferos, para os quais só é possível encontrarmos vestígios.”

 

5. Dar a conhecer o Sul de Portugal: 

tronco de uma árvore com musgo
Foto: Helena Geraldes

 

Os participantes na conferência “Bird Numbers 2019: counting birds counts” vão também participar em excursões no Sul do país, esta quinta-feira, com saídas de campo programadas para as regiões de Évora e de Castro Verde e ainda para a zona do Estuário do Tejo, com o apoio de várias autarquias, adianta o docente da Universidade de Évora. “Esta será uma excelente oportunidade para dar a conhecer o património natural e também o património cultural destas regiões”, concluiu.

 

[divider type=”thin”]Saiba mais.

Leia mais sobre o programa e a organização da conferência “Bird Numbers 2019: counting birds counts”, aqui.

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Here you can read this article in English.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.