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Ribeira. Foto: Helena Geraldes (arquivo)

Conheça os vencedores do primeiro prémio dedicado aos rios de Portugal

Os casos que se destacam por cuidarem bem ou mal dos rios e ribeiras de Portugal estão escolhidos. Os vencedores da primeira edição dos prémios Guarda-Rios, do GEOTA, foram anunciados hoje. Saiba quais são.

 

Foram 1.219 os votos recolhidos online, entre 14 de Março (Dia Internacional de Acção pelos Rios) e 22 de Abril, para escolher os projectos e as pessoas com impacto nos rios e ribeiras do país.

A Liga para a Protecção da Natureza (LPN) e a conservação do peixe saramugo ganhou o prémio do público Guarda-Rios de boas práticas, de um conjunto de nove projectos nomeados. Este projecto está a trabalhar para melhorar as condições do habitat natural do saramugo nas ribeiras do Sul de Portugal.

O GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e do Ambiente também fez as suas escolhas. O Guarda Rios para as boas práticas foi para os Passadiços do Paiva, projeto turístico no município de Arouca. Segundo o GEOTA, esta infraestrutura teve um papel “na proteção e valorização da paisagem de um rio livre” e é um “elemento potenciador do desenvolvimento económico à escala local e regional”.

“Estes passadiços, apesar de terem algumas consequências negativas, transformaram a forma como olhamos para um rio livre”, explicou hoje à Wilder Ana Brazão, coordenadora do projecto Rios Livres do GEOTA. “Abriram a porta a uma nova experiência das pessoas com um rio próximo do estado selvagem, tumultuoso. Mostraram como um rio pode ser uma mais-valia para uma região sem ser alterado por infra-estruturas cinzentas e com benefícios sócio-económicos”, acrescentou.

A Comunidade da Aldeia do Sistelo, no Minho, recebeu uma menção honrosa. “Este foi um exemplo de como o povo se uniu contra a mini-hídrica proposta para o rio Vez e a favor do que tinha, do rio que usam para irrigar as culturas em socalcos, conhecidas como o ‘Tibete português'”, explicou Ana Brazão. Hoje, a paisagem cultural da aldeia de Sistelo é monumento nacional.

A outra categoria destes prémios, o Guarda-Rios de Luto, que destaca exemplos de más práticas, foi atribuída pelo público à CELTEJO, empresa de celulose em Vila Velha de Ródão por causa das descargas no rio Tejo, pondo em risco fauna, flora e populações.

O Guarda-Rios de Luto escolhido pelo GEOTA foi para os vários ministros do Ambiente, desde o Governo de José Sócrates até ao atual. Segundo o GEOTA, esses políticos são responsáveis de aprovarem, “atrapalhadamente, a barragem de Foz Tua” e todo o Programa Nacional de Barragens. Destaca também “a gestão do caso do armazém de resíduos da central nuclear de Almaraz e os casos de poluição da água, sobretudo no Tejo”.

A menção desonrosa coube à central hidroelétrica da Ribeira Grande, na Ilha das Flores, Açores.  “apesar dos vários pareceres negativos recebidos em sede de consulta pública, entre eles do GEOTA, a obra acabará por avançar a não ser que algo de maior peso coloque o dedo na ferida.”

Os prémios Guarda-Rios querem “fazer um balanço daqueles que têm sido os bons e maus exemplos na gestão dos recursos hídricos em Portugal, dando voz aos rios através dos cidadãos que os defendem”, segundo a organização.

E esta é a apenas a primeira edição. “Este foi apenas um primeiro passo. Queremos que os prémios sejam anuais e que passem a distinguir o que foi feito pelos rios no ano anterior”, adiantou.

 

O estado dos rios portugueses

Os rios e ribeiras são como artérias e veias da paisagem que transportam água fresca e limpa por todo o país, antes de chegar ao seu destino final: o mar.

São cruciais para a vida selvagem e deles dependem espécies como as enguias, lontras, melros-d’água, guarda-rios e libélulas e libelinhas. Estas precisam dos rios para se alimentarem e beberem, para se reproduzir e nidificar, para se refugiar de predadores e para se deslocarem de um lugar para outro, usando-os como corredores naturais.

Mas, na opinião de Ana Brazão, há muito por fazer para recuperar os rios. “Hoje os nossos rios e ribeiras estão numa situação muito pouco promissora”, contou. De um lado há a construção de grandes barragens, além das cerca de 7.000 já existentes, entre pequenas e grandes, e o plano nacional de regadios; depois há os casos de poluição das águas pelas indústrias e por origens difusas, como os pesticidas que acabam nos rios.

“Ainda não há uma mudança na forma como olhamos para os rios, até agora vistos como meios de descarga”.

Para começar é preciso ter informação sobre qual o estado de saúde dos rios. E os problemas podem começar já aqui. “Para muitos rios não sabemos qual o estado químico da água, nem onde existem barragens e açudes. E se não sabemos como está o rio não podemos saber o que fazer para o recuperar”, notou Ana Brazão.

Mas há coisas que se podem fazer. Criar escadas para peixes nas barragens e açudes, remover infraestruturas obsoletas ou abandonadas, recuperar a vegetação das margens dos rios e resolver problemas de poluição nas proximidades dos cursos de água são algumas das sugestões deixadas pela responsável do GEOTA.

Outra coisa que os cidadãos podem fazer é adoptar troços de rios, através do Projecto Rios da ASPEA – Associação Portuguesa de Educação Ambiental.

“Nos anos 70, 80, quando os rios foram muito afectados pela poluição da indústria, deu-se um desfasamento entre as pessoas e os cursos de água. Deixámos de aprender a nadar nos rios. Mas hoje sinto que esta quebra na ligação começa lentamente a diminuir”, acrescentou Ana Brazão. “Há uma forte vontade de ligação à natureza, de sair da cidade e de acampar, de fazer rafting, por exemplo.”

Para ajudar a esta mudança, o projecto Rios Livres está a identificar e inventariar os Rios Livres Excepcionais de Portugal, ou seja os rios e/ou trechos de rios nacionais que corram livres e não estejam poluídos.

“É um processo complexo e moroso. Começámos pela Bacia do Douro porque era a mais ameaçada, com casos de poluição e de novas barragens em construção, nomeadamente no Alto Tâmega.” Até agora estão inventariados seis rios e ribeiras: ribeira de Guadramil, ribeiro de Resinal, ribeiro do Medreiro, rio Assureira, rio de Curros e o rio Paivô. “Queremos fazer o mesmo para as outras bacias hidrográficas e adensar o trabalho no Douro”, adiantou.

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Descubra mais sobre os vencedores dos prémios Guarda-Rios aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.