grande plano de águia perdigueira de perfil
Águia-de-Bonelli. Foto: T. R. Shankar Raman/Wiki Commons

Correcção de linha eléctrica em Coruche evita morte de mais águias-perdigueiras

Foi a morte de Vega, uma jovem águia-perdigueira seguida por GPS a partir de Espanha, que chamou a atenção para a falta de segurança de uma linha eléctrica com 3,2 quilómetros de extensão no vale do Sorraia.

Nascida em 2017 e libertada em Junho desse ano em Madrid, depois de marcada com um emissor pelo GREFA – Grupo de Rehabilitación de la Fauna Autóctona y su Hábitat, Vega morreu passados apenas quatro meses, a muitos quilómetros dali. Encontrada a 50 metros de uma linha eléctrica no vale do rio Sorraia, próxima de Coruche, acabou por não resistir aos ferimentos provocados por uma electrocussão.

Mas a partir de agora, na sequência de um alerta feito junto da EDP Distribuição, episódios como o desta águia-perdigueira não se deverão mais repetir nesta zona do Ribatejo.

“A linha eléctrica que levou à morte de Vega está agora equipada com protecções para evitar que outras aves sejam electrocutadas”, anunciou em comunicado a Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), ONG responsável por esta alteração em conjunto com a EDP Distribuição. Esta empresa gere a rede de distribuição eléctrica de média tensão, em Portugal.

“A morte de Vega, ainda que acidental, não terá sido completamente ao acaso. Os nossos técnicos fizeram uma prospeção que, juntamente com informação fornecida por outros observadores, indicou que muitas aves corriam risco de eletrocussão nesta linha”, acrescenta a SPEA.

A região do Vale do Sorraia é utilizada com frequência por juvenis de águias-perdigueiras na altura em que dispersam – como foi o caso de Vega – afastando-se da zona em que nasceram para conhecer outros territórios. “É uma zona com muita diversidade, com áreas agrícolas diversas, zonas de rio e de bosques e com muito alimento para estas aves com menos experiência, que ali conseguem caçar com algum sucesso”, explicou à Wilder Joaquim Teodósio, coordenador do Departamento de Conservação Terrestre da ONG.

Outras espécies ameaçadas que corriam riscos junto desta linha eram a cegonha-preta, o milhafre-real, o açor e o bufo-real.

O maior perigo? Esticar as asas

Os trabalhos de correcção da linha, que terminaram este mês, demoraram cerca de uma semana e traduziram-se na colocação de protecções em 18 postes de transporte de electricidade. “São mangas plásticas que isolam as linhas na parte em que as aves estão quando pousam e quando levantam voo”, indicou. É nestas alturas, em que as aves esticam as asas, que há mais risco de electrocussão, uma vez que podem tocar em duas linhas diferentes ao mesmo tempo.

Um dos postes da linha eléctrica já corrigido. Foto: Miguel Joaquim

O perigo é maior para espécies de média e grande dimensão, como é o caso das águias-perdigueiras, e depende também da configuração das linhas eléctricas. “Depois de visitarmos o sítio, percebemos que eram postes com uma configuração perigosa, com os apoios muito próximos”, notou o mesmo responsável, lembrando que por todo o país ainda há outras situações semelhantes.

A correcção de linhas eléctricas pela EDP Distribuição começou em 2003, quando entrou em vigor o primeiro Protocolo Avifauna. Esta parceria envolve a empresa, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, a SPEA, a Quercus e a Liga para a Protecção da Natureza e tem como objectivo a identificação e correcção de linhas eléctricas mais perigosas para as aves, em especial as espécies mais sensíveis. “É bom ver este trabalho conjunto que temos com as empresas de electricidade em Portugal; em Espanha tem sido mais difícil.”

E quem se deparar com situações recorrentes de aves electrocutadas junto a uma linha eléctrica, incluindo proprietários ou ‘birdwatchers’, sublinhou Joaquim Teodósio, deve avisar sempre – contactando por exemplo a SPEA, através deste formulário. “Mesmo que estejam a ser afectadas apenas espécies mais comuns, isso significa que espécies ameaçadas também o podem ser.”


Saiba mais.

Espreite uma parte do trabalho que é feito para correcção de linhas eléctricas, neste vídeo da SPEA.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.