Descobertas duas novas espécies de moluscos marinhos que viveram há 3,6 milhões de anos em Portugal

Exemplar da espécie Lepidochitona rochae: concha do animal em diferentes vistas. Imagem: Dell’Angelo et al. (2022) [Journal of Paleontology]

Os pequenos moluscos marinhos – Lepidochitona rochae e Ischnochiton loureiroi – viviam na zona que corresponde hoje às regiões de Pombal, Marinha Grande e Caldas da Rainha e que nessa época de aquecimento global estavam submersas.

Esta descoberta para a Ciência foi publicada a 8 de Março na revista Journal of Paleontology e, segundo os investigadores, “permite obter informações importantes sobre o clima da Terra no passado e antever possíveis alterações no futuro”, segundo um comunicado da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa enviado a 22 de Abril à Wilder.

Lepidochitona rochae e Ischnochiton loureiroi  – identificadas com base em fósseis de quítones pliocénicos com cerca de 3,6 milhões de anos de idade -, têm menos de um centímetro de comprimento e estão associadas a ambientes costeiros de águas subtropicais do Pliocénico, na zona de Portugal que corresponde atualmente às regiões de Pombal, Marinha Grande e Caldas da Rainha e que nessa época de aquecimento global se encontravam submersas, dado que o nível médio do mar era mais elevado do que na atualidade.

Exemplar da espécie Lepidochitona rochae: concha do animal em diferentes vistas. Imagem: Dell’Angelo et al. (2022) [Journal of Paleontology]

Os quítones são pequenos moluscos marinhos da classe dos poliplacóforos que ocorrem sobretudo sobre rochas em ambientes de pequena profundidade, nomeadamente na zona entremarés. Alimentam-se de material orgânico animal e vegetal variado, existente à superfície de rochas e conchas submersas. São pacatos e de pequenas dimensões, com apenas alguns centímetros de comprimento e, por isso, passam frequentemente despercebidos.

Estes fósseis foram descobertos entre cerca de 500 quilos de sedimentos da Bacia do rio Mondego analisados pelos investigadores, que tentavam saber mais sobre a diversidade de espécies de quítones que viveram ali naquele tempo.

Até ao momento estas novas espécies apenas são atribuídas ao Pliocénico de Portugal, país estrategicamente posicionado entre o Mediterrâneo e as costas atlânticas do norte da Europa.

“Este estudo é particularmente importante. Contribui para entender que efeitos a tendência de aquecimento global poderá ter na fauna e geografia futuras, ao dar a conhecer um mundo no qual as temperaturas das águas marinhas costeiras eram mais elevadas e o nível médio do mar superior ao atual”, explicou Carlos Marques da Silva, professor do Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (Ciências ULisboa) e investigador do Instituto Dom Luiz (IDL) e um dos autores deste artigo.

Para Carlos Marques da Silva é essencial conhecer a biodiversidade do passado, a partir das faunas dos mares miocénicos e pliocénicos – mais quentes que a atualidade -, para se entender como se chegou à atual distribuição de espécies. “Muitas das espécies de moluscos representadas no registo fóssil do Pliocénico de Portugal ocorrem hoje em dia apenas das costas da Mauritânia para sul, em mares subtropicais a tropicais”, conclui Carlos Marques da Silva.

Os nomes escolhidos para estas duas espécies – Lepidochitona rochae e Ischnochiton loureiroi – querem homenagear Rogério Bordalo da Rocha (1941-2018), paleontólogo, diplomado pela Ciências ULisboa, professor da Universidade Nova de Lisboa e antigo presidente da Sociedade Geológica de Portugal; e João de Loureiro (1717-1791), jesuíta, missionário, botânico e autor de um dos primeiros textos portugueses sobre fósseis.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.