Laurissilva
Floresta Laurissilva. Foto: João Sousa/Wiki Commons

Descoberto na Madeira o fóssil mais antigo do mundo da família das cenouras

Esta cenoura selvagem, que se tornou gigante e hoje pode medir até três metros, é o registo fóssil mais antigo do mundo de uma planta da família das cenouras.

 

Nas clareiras da floresta Laurissilva da ilha da Madeira vive o aipo-da-serra (Melanoselinum decipiens).

Apesar de ser uma planta lenhosa, que pode chegar aos três metros de altura, esta espécie endémica da ilha da Madeira começou por ser uma cenoura selvagem, descobriu o investigador Carlos A. Góis-Marques e os seus colegas (Lea de Nascimento, José María Fernández-Palacios, José Madeira e Miguel Menezes de Sequeira).

 

 

Fotos: FCUL

 

O investigador, aluno de doutoramento em Geologia na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, chegou a esta conclusão depois de estudar frutos fósseis com 1,3 milhões de anos.

Esses fósseis foram encontrados preservados em sedimentos perto de Porto da Cruz, no concelho de Machico.

“Apesar do nome comum ser aipo, hoje sabe-se, através de estudos moleculares, que se trata de uma cenoura (género Daucus) que evoluiu para um hábito lenhoso insular, tornando-se numa cenoura gigante”, segundo um comunicado da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Isto foi possível por causa do clima ameno da ilha e da ausência de herbívoros e competição pela luz solar, tudo condições favoráveis vividas pelos antepassados destas plantas.

Estes, ao chegarem à ilha da Madeira, ficaram assim “livres da obrigatoriedade de cumprir o seu ciclo de vida anual, tornando-se progressivamente em plantas perenes com crescimento lenhoso”.

O fenómeno do gigantismo em plantas de ilhas oceânicas é comum a nível mundial. Charles Darwin, no seu livro “A Origem das Espécies” de 1859, foi o primeiro a propor a evolução destas plantas arbustivas a partir de antepassados herbáceos.

Mas, até ao momento, não se conhecia nenhum fóssil de uma planta com gigantismo insular que desse pistas sobre quando é que os seus antepassados chegaram e evoluíram em contexto insular.

Os fósseis de frutos agora descritos são morfologicamente idênticos aos de Melanoselinum decipiens (ou Daucus decipiens) e sugerem que esta planta já teria evoluído para um porte arbustivo há 1,3 milhões de anos.

“Isto implica a chegada de uma cenoura selvagem (do género Daucus) à ilha da Madeira antes dessa data. Trata-se, portanto, da primeira prova de hábito lenhoso insular encontrado no registo fóssil.”

Além disso, os fósseis de plantas da família das cenouras (Apiaceae) são raros, o que torna os fósseis agora descritos no registo conhecido mais antigo de cenouras a nível mundial.

Os investigadores esperam contribuir para melhorar o conhecimento sobre “as origens evolutivas das cenouras e dos grupos de plantas relacionados, um importante elemento da alimentação humana”. Os peritos em paleobotânica acreditam também ajudar a “compreender melhor a evolução das plantas insulares lenhosas”.

O resultado desta investigação foi publicado online pela Wiley Online Library a 14 de janeiro e será um dos destaques do jornal científico TAXON, editado pela International Association for Plant Taxonomy.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Há cerca de um ano, a mesma equipa de investigadores descobriu fósseis de uma planta já extinta, a planta Eurya stigmosa, uma pequena árvore da família do chá (Theaceae), que vivia na ilha da Madeira há 1,3 milhões de anos.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.