Desvendado mistério de como sapos escondidos debaixo da terra sabem que está a chover

Até agora, não era claro como é que os sapos, escondidos em refúgios a mais de meio metro de profundidade, sabem que estava a chover para, assim, subirem à superfície e começar novo ciclo de reprodução. Uma equipa de investigadores espanhóis desvendou o mistério.

 

Nas zonas áridas, a chuva é uma questão de vida ou morte para os sapos. Durante os períodos secos, estes anfíbios escondem-se em refúgios subterrâneos, que mantêm a humidade, de onde saem apenas quando regressa a chuva. Só então se começam a reproduzir.

Mas como podem estes pequenos animais saber que está a chover quando estão abrigados a profundidades de cerca de meio metro?

Uma equipa internacional, coordenada por Rafael Márquez investigador do Museu Nacional espanhol de Ciências Naturais (MNCN), publicou um estudo na revista Current Biology, que demonstra que os sapos têm órgãos especiais no ouvido interno que os ajudam a saber quando podem sair dos seus refúgios.

“Trabalhávamos com a hipótese de que os sapos são capazes de detectar vibrações de baixa frequência e elaborámos uma experiência para prová-lo”, disse Márquez, em comunicado divulgado hoje pelo MNCN.

Os investigadores trabalharam nas dunas de areia no Parque Natural de Doñana, em Huelva (Andaluzia), com sapos de duas espécies diferentes – sapo-de-unha-negra (Pelobates cultripes) e sapo-corredor (Bufo calamita). Em noites sem chuva, utilizaram um dispositivo capaz de imitar o som das gotas de chuva, enterrado a 10 centímetros de profundidade. Depois, ficaram à espera para ver o que acontecia.

Os sapos de ambas as espécies expostos ao estímulo da vibração emergiram muito mais rapidamente do que os sapos que não foram expostos. Além de emergiram antes, o número total de sapos que saiu dos seus refúgios foi maior nos grupos com estímulo.

Rui Rebelo, investigador especializado em anfíbios da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e do Centro para a Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais (cE3c), explicou hoje à Wilder que este estudo ajuda a saber mais sobre a ecologia destes animais. “Ninguém sabia muito bem como é que os sapos, enterrados a meio metro de profundidade ou mais, saem para a superfície quando começa a chover.” Isto porque “a água da chuva demora mais tempo a infiltrar-se no solo e a chegar aos sapos nos seus refúgios do que estes demoram a chegar à superfície”, acrescentou.

“Os sapos têm bom ouvido para barulhos muito suaves. Mas não saem quando está a chover pouco; só decidem sair quando chove bem, com gotas grossas”.

Rafael Márques entende que “esta investigação permite entender o papel dos órgãos especiais de detecção de vibrações que os sapos têm no ouvido interno”. “Os resultados sugerem que a detecção de pequenas vibrações é biologicamente relevante e provavelmente generalizada em anfíbios de zonas áridas. A dimensão sísmica do mundo sensorial das rãs e dos sapos pode ter consequências importantes para medir o impacto que as actividades humanas podem ter neste grupo de vertebrados tão ameaçado”, concluiu Márquez.

 

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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.