Em Portugal são capturados 1,5 milhões de raias e tubarões por ano

Foto: Jorge Fontes

A primeira avaliação sobre tubarões e raias no mar português revelou ontem que o nosso país é o terceiro da Europa que mais captura estes animais. Cerca de metade das espécies estão ameaçadas.

Portugal surge depois de Espanha e de França na lista dos três países que mais capturam tubarões e raias por ano, revelou o relatório “Tubarões e Raias: Guardiões do oceano em crise”, o primeiro estudo abrangente sobre o estado das populações de tubarões e raias em Portugal, sobre a sua pesca, comércio e políticas, feito pela ANP (Associação Natureza Portugal)/WWF, com o apoio da Fundação Oceano Azul.

“A sobrepesca e uma proteção inadequada estão a ameaçar as 117 espécies de tubarões, raias e quimeras (peixes cartilagíneos) existentes no mar português, apesar destas espécies-chave serem essenciais à saúde e bem-estar do oceano”, segundo um comunicado da ANP/WWF enviado à Wilder. 

Estima-se que até 1,5 milhões destes animais estejam a ser capturados no nosso país por ano, número que coloca Portugal no 3º lugar da lista europeia e em 12º lugar no ranking mundial. Em todo o mundo são capturados 100 milhões.

Ainda de acordo com este relatório, Portugal é o oitavo país do mundo que mais importa e exporta carne de tubarão e o sexto em relação à carne de raia.

“A procura de raia no mercado nacional apresentou um pico de consumo em 2018 (dados estimados entre 2012 e 2019), tendo o preço da raia aumentado 40% nos últimos 30 anos.”

“Um oceano sem tubarões e raias é um oceano vazio e moribundo”, disse Ana Henriques, especialista em Oceanos e Pescas na ANP|WWF e principal redatora do relatório. “Estas espécies são fulcrais para uma boa gestão dos ecossistemas marinhos. São verdadeiros guardiões do oceano.”

Ângela Morgado, diretora executiva da ANP|WWF, sublinha que “a nossa forma de pescar está a ameaçar os nossos tubarões e raias”. Na sua opinião, “para evitar um oceano sem tubarões e raias, o Governo português deve tomar a liderança europeia nesta questão, avançando para uma pesca de baixo impacto e seletiva, e tornando-se o primeiro Estado-Membro a criar um Plano de Ação Nacional para estas espécies”.

Mas até que este plano nacional seja implementado, “a redução do consumo é a única proteção possível, pelo que pedimos a todos os consumidores que assumam e assinem o compromisso proposto pela ANP|WWF dizendo ‘Não’ ao consumo de tubarão e raia”.

Para a Fundação Oceano Azul, é “insustentável“ a forma “como gerimos o oceano e colocamos em risco, no mar português, espécies tão importantes para o funcionamento dos sistemas marinhos como os tubarões e as raias”, segundo o mesmo comunicado.

Também esta fundação pede ao país “medidas efetivas para inverter esta situação” e para “garantir a proteção destes animais marinhos”.

Nos últimos 30 anos, um quarto de todos os desembarques (em peso) da frota portuguesa correspondem a espécies que atualmente estão ameaçadas, três quartos das espécies pescadas têm as suas populações em declínio e sete espécies historicamente pescadas estão agora criticamente em perigo, a um passo da extinção. 

Para contrariar esta tendência, a ANP|WWF aponta a necessidade urgente de criação de um Plano de Ação Nacional para a gestão e conservação dos Tubarões e Raias.

Para tal diz ser necessário minimizar as principais ameaças – a nível da pesca, comércio e governança, bem como as capturas acidentais -, melhorar a monitorização e controlo da pesca e implementar boas práticas a bordo que melhorem a sobrevivência dos indivíduos libertados ao mar.

A ONG de conservação da natureza recomenda ainda melhorar a qualidade dos dados científicos da pesca, proibir a captura, o comércio e o consumo de espécies ameaçadas e regulamentação mais restrita das espécies comercializadas a nível internacional, a par com a definição de zonas santuário que protejam habitats essenciais e sejam refúgios para estas espécies. 

O consumidor deverá também ter um papel ativo, “evitando comer raia ou tubarão, pelo menos até que a pesca seja comprovadamente sustentável, informando-se sobre as espécies que está a comprar, e estando atento à composição de certos produtos que existem no mercado, nomeadamente cremes hidratantes ou complexos vitamínicos que contêm esqualeno e óleo de fígado de tubarão”.

Para Ana Henriques, “reduzir o seu consumo, reduzir capturas acidentais, aumentar o conhecimento sobre as espécies e formular um Plano integrado, fundamentado no melhor conhecimento disponível e que contemple as várias ameaças a par com a sua conservação é uma abordagem estratégica, urgente e muito necessária”. 


Agora é a sua vez.

Pode assumir o compromisso de dizer #TubarãonoPratoNão ou #TiraAraiaDestaAlhada no site da organização ANP/WWF.                                                                                                                                                              

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.