Estas 324 aves passaram o Inverno na Quinta da Atalaia, junto ao Tejo

A vegetação junto às antigas salinas na Quinta da Atalaia, no Estuário do Tejo, foi a escolha de eleição para estas 324 aves de 19 espécies passarem o Inverno. Como sabemos? O Grupo de Anilhagem do Estuário do Tejo esteve lá e contou-nos.

 

Guarda-rios, piscos, felosas, rouxinóis, chapins e muitas outras pequenas aves fazem parte da paisagem de Inverno deste recanto do Estuário do Tejo. Para conhecer melhor as espécies que ali passam os meses mais frios do ano, um grupo de ornitólogos instalou redes e montou mesas de anilhagem em oito sessões, com 15 dias de intervalo, desde 15 de Novembro de 2015 a 15 de Fevereiro de 2016.

 

Guarda-rios
Guarda-rios

 

Estas contagens fazem parte do projecto Monitorização de Aves Invernantes (MAI), a decorrer desde 2011 em vários pontos do país, desde o litoral da zona Centro e Sul ao interior alentejano. Este é o primeiro ano que se fazem anilhagens na Quinta da Atalaia (Alcochete), explicou Afonso Rocha, um dos responsáveis.

 

Local de anilhagem protegido
Local de anilhagem protegido

 

Acabadas as sessões de anilhagem – nas quais participaram, em média, sete pessoas em cada uma -, foram feitas as contas às aves. Segundo os resultados do MAI 2015/2016, conhecidos recentemente, foram capturadas 324 aves, 277 das quais foram marcadas com anilhas metálicas da Central Nacional de Anilhagem (CEMPA).

Um dos números que mais surpreendeu foram as 221 felosas-comuns capturadas. Este número “é muito elevado e superou as nossas expectativas”, contou Afonso Rocha. “O habitat de antigas salinas, com superfícies de águas pouco dinâmicas ladeadas por vegetação de sapal e palustre é muito rico em insectos, o que atrai estas pequenas aves. Esta é a principal razão para a captura de um elevado número de felosa-comum comparativamente a outras espécies”.

 

Felosa-comum
Felosa-comum

 

Além das felosas, o grupo de ornitólogos – desde anilhadores credenciados, a aprendizes e voluntários – capturou 32 rouxinóis-bravos, 19 chapins-azuis, 10 piscos-de-peito-azul, entre muitas outras aves.

Este programa de capturas regulares de aves durante o Inverno e em habitats específicos é importante para ajudar a “compreender a origem geográfica das populações de aves invernantes, avaliar as interacções entre as populações invernantes e residentes e estudar a fidelidade aos territórios de Inverno”, acrescentou o responsável.

 

Lugre e felosa-comum
Lugre e felosa-comum

 

E Portugal não está sozinho. O MAI insere-se no projecto europeu EURO-CES Constant Effort Ringing in Europeuma iniciativa que começou em 1981 pelas mãos de um voluntário em Inglaterra. Em 1986, o projecto passou a ter escala nacional e desde então espalhou-se a vários países europeus. A ideia é muito simples. As aves são um indicador das alterações ambientais e do uso dos solos. Para compreender essas alterações é necessário saber o que está a acontecer às aves. “A anilhagem, feita com método e de forma constante, pode ser muito útil” para conhecermos “a demografia das populações, como as taxas de mortalidade e de nascimentos, por exemplo”, explica o site do EURO-CES.

 

Suporte para as aves capturadas
Suporte para as aves capturadas

 

Segundo Afonso Rocha – que fez parte da equipa que desenvolveu e implementou o projecto em Portugal -, são consideradas prioritárias “as espécies de aves mais abundantes no período de invernada e comummente capturadas no decorrer das sessões de anilhagem, como o pisco-de-peito-ruivo, a felosa-comum, a toutinegra-de-barrete, o rouxinol-bravo e a escrevedeira-dos-caniços”.

 

Pisco-de-peito-azul
Pisco-de-peito-azul

 

 

[divider type=”thick”]Aqui fica a lista de aves invernantes monitorizadas na Quinta da Atalaia:

Guarda-rios (Alcedo atthis) – 3

Lugre (Carduelis spinus) – 2

Rouxinol-bravo (Cettia cetti) – 32

Fuinha-dos-juncos (Cisticola juncidis) – 1

Escrevedeira-dos-caniços (Emberiza schoeniclus) – 2

Pisco-de-peito-ruivo (Erithacus rubecula) – 4

Bico-de-lacre (Estrilda astrild) – 9

Pisco-de-peito-azul (Luscinia svecica) – 10

Pisco-de-peito-azul (Luscinia svecica cyanecula) – 4

Chapim-azul (Parus caeruleus) – 19

Chapim-real (Parus major) – 1

Pardal-comum (Passer domesticus) – 2

Felosa-comum (Phyloscopus collybita) – 221

Frango-d’água (Rallus aquaticus) – 1

Cartaxo-comum (Saxicola torquata) – 1

Toutinegra-de-barrete-preto (Sylvia atricapilla) – 2

Toutinegra-de-cabeça-preta (Sylvia melanocephala) – 3

Melro-preto (Turdus merula) – 6

Tordo-comum (Turdus philomelus) – 1

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.