Este é o primeiro dodô a ser leiloado em 100 anos

O dodô, ave que se tornou num ícone da extinção das espécies, foi descoberto e desapareceu da face da Terra no século XVII. Hoje são muito raros os exemplares deste animal que apenas viveu nas ilhas Maurícias e se extinguiu em 1662. Na semana passada foi anunciado o leilão de um esqueleto de dodô quase completo, algo que não acontecia há um século.

 

A própria Summers Place Auctions, especializada em leilões de História Natural, nem queria acreditar. “Já leiloámos dinossauros, um mamute, fósseis fascinantes e vários trabalhos de taxidermia mas nunca sonhámos que poderíamos leiloar uma das espécies extintas mais icónicas de sempre, um dodô”, escreve a leiloeira num documento enviado à Wilder.

 

 

O leilão foi anunciado na semana passada. A 22 de Novembro, na galeria da Summers Place Auctions em Billingshurst, Sussex (Sul de Inglaterra), será leiloado um esqueleto de dodô (Raphus cucullatus) com 61 centímetros, composto por ossos do século XVI e anteriores, recolhidos nas Maurícias, vendidos no século XIX e montados ao longo dos últimos 40 anos.

“A leiloeira foi contactada por um colecionador privado que disse querer vender o dodô”, disse à Wilder Silke Lohmann, assessor de imprensa da leiloeira.

Foi nas décadas de 1970 e 1980 que este colecionador comprou ossos de dodô em leilões e a outros colecionadores. No início dos anos 2000 apercebeu-se que tinha ossos suficientes (só lhe faltava parte do crânio e um conjunto de garras, que foram reconstruídos) para construir um esqueleto. Então, montou meticulosamente os ossos para criar um espécime tão completo quanto possível. Segundo a leiloeira, está 95% completo.

 

 

Esta será a primeira vez que um esqueleto de dodô vai ser vendido desde que em 1914 o taxidermista britânico James Rowland Ward (1848-1912) vendeu um exemplar ao Museu de Cardiff.

“Devido à raridade deste grande ícone da extinção, o dodô deverá ultrapassar os valores já atingidos nestes leilões especializados”, estima a leiloeira que, em 2013, vendeu um esqueleto de dinossauro Diplodocus ao Museu de História Natural dinamarquês de Copenhaga por 500 mil libras (cerca de 586 mil euros).

Actualmente apenas existe um único esqueleto de dodô feito com os ossos de um único animal. Este espécime foi recolhido no início dos anos 1900 num vale de montanha das Maurícias e hoje está guardado em Port Louis, naquela ilha. Os outros (só existe uma dezena que estão relativamente completos) são composições de ossos de vários indivíduos. “Os esqueletos de dodô são extremamente raros”, comentou Errol Fuller, curador da leiloeira e especialista nesta espécie de ave. Na sua opinião, “os melhores exemplares estão no Museu de História Natural de Londres, no Museu de Zoologia de Cambridge, no Museu de Ciências Naturais de Durban, no Museu Naturalista de Leiden, no Museu de História Natural de Paris e no Smithsonian, em Washington”.

 

 

Mas a maioria dos museus já adquiriu os seus dodôs há muitos anos.

O dodô era uma ave grande, que não voava. Vivia nas ilhas Maurícias no Oceano Índico, tinha cerca de um metro de altura e deveria pesar entre 10 e 20 quilos. Terá sido descoberta para a Ciência em 1598, com a chegada dos navegadores holandeses. Mas, passados cerca de 70 anos, acabou por se extinguir por causa da predação.

Durante quase dois séculos quase nenhuns vestígios deste animal apareceram. Mas em 1865, George Clark, um professor local das Maurícias, encontrou uma zona pantanosa chamada Mare aux Songes, com cerca de dois hectares, perto do que hoje é o aeroporto das Maurícias. Clark acreditou que este local poderia conter ossos preservados de criaturas já extintas. Por isso, contratou homens que trabalhavam na plantação de açúcar local para desenterrar ossos. Foram recuperados centenas de ossos de dodôs e de outras espécies já extintas. Clark enviou alguns dos ossos para o Museu de História Natural de Londres e outros para Paris e Cambridge. E assim começava o fascínio que ainda hoje dura por esta espécie.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.