Jonathan, uma tartaruga gigante das Seicheles, tem uma idade estimada de cerca de 190 anos. Foto: Kevsten/Wiki Commons

Estudo confirma que muitas tartarugas “enganam” o relógio do envelhecimento

Uma equipa liderada por uma cientista portuguesa analisou os dados relativos a 52 espécies de tartarugas em zoos de todo o mundo e chegou a conclusões surpreendentes.

A senescência, que se traduz no aumento do risco de mortalidade associada ao envelhecimento do organismo, começa em muitos animais quando é atingida a maturidade reprodutiva. É o caso dos humanos e dos outros mamíferos, por exemplo. É como se o relógio do envelhecimento começasse a funcionar quando ganham a capacidade de se reproduzir.

Todavia, essa não é a história de muitas tartarugas: à medida que os anos passam mantêm praticamente o mesmo risco de morrer, ou conseguem mesmo diminuir esse risco, confirmou uma equipa de cientistas liderada por Rita Silva, do centro de investigação CIBIO-InBIO/BIOPOLIS, da Universidade do Porto. Os resultados do estudo foram esta semana publicados na Science.

“O que fizemos foi medir a taxa de envelhecimento das populações de 52 espécies de tartarugas guardadas em zoos”, descreveu a investigadora à Wilder, que na altura do estudo trabalhava na Universidade de Southern Denmark. A partir das datas de nascimento e morte das tartarugas analisadas, com uma grande variedade de tamanhos e características, a equipa desenhou a trajectória de mortalidade dos machos e fêmeas de cada espécie. Objectivo: perceber qual o risco de morrer dessas tartarugas ao longo que o tempo passava.

“Em traços gerais, analisámos quantos indivíduos ainda estavam vivos quando tinham 10 anos de idade; quantos desses estavam vivos aos 20 anos de idade; e assim por diante”, explicou Rita Silva.

Os resultados confirmaram que as tartarugas envelhecem mais devagar: 75% registaram uma senescência extremamente baixa e 80% com valores abaixo dos humanos. Ainda assim, isso não impede que acabem por morrer, por exemplo devido a doenças ou a predadores.

Rita Silva lembra que o animal terrestre mais velho em todo o mundo é uma tartaruga gigante das Seicheles, Jonathan, que terá cerca de 190 anos, embora ninguém saiba realmente quantos anos tem, uma vez que o nascimento não foi devidamente registado.

Foto: Kevsten/Wiki Commons

Uma das teorias que ajuda a explicar o envelhecimento mais lento destes répteis é o facto de continuarem a crescer ao longo da vida, à semelhança de alguns peixes e árvores. Dessa forma, “alocam energia na reparação celular e dos tecidos, enquanto outros organismos perdem essa capacidade”.

Os investigadores fizeram ainda duas comparações. Em primeiro lugar, compararam os resultados obtidos com as tartarugas em zoos com tartarugas no meio natural, a partir de dados disponíveis para três espécies.

Como resultado, perceberam que as tartarugas em cativeiro “ficam vivas até mais tarde”. “Isso pode ser explicado por terem mais acesso a alimento e estarem mais protegidas, pelo que acabam por investir mais energia no não envelhecimento”, nota Rita Silva.

Nos humanos, em contrapartida, diversos estudos já realizados indicam que o facto de estarem em ambientes mais protegidos não impede que comecem a envelhecer, embora diminua por exemplo a taxa de mortalidade em bebés e juvenis.

A equipa comparou também a longevidade de machos e fêmeas e concluiu que eles vivem em média mais tempo do que elas, enquanto nos humanos e em muitos outros mamíferos é ao contrário.

Ainda assim, nalgumas espécies de tartarugas em que as fêmeas são maiores do que os machos, são elas que têm uma esperança média de vida maior. “Uma hipótese apontada para esta vantagem evolutiva das fêmeas, ou seja, terem maior longevidade do que os machos quando são fisicamente maiores, é o facto de serem capazes de atrasar a maturação sexual e desta forma terem um crescimento mais lento, vivendo mais anos”, considera a investigadora.

Rita Silva acredita que são necessários ainda mais estudos nesta área. “Para desvendar os segredos da longevidade precisamos ainda de mais estudos comparativos e em grupos filogenéticos historicamente menos estudados, como é o caso dos répteis”, sublinha.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.