Turfeira (próxima de Vila Real), um dos habitats sensíveis à eutrofização. Foto: Maria Alexandra Oliveira

Eutrofização ameaça 14% da Rede Natura da Península Ibérica Ocidental

Esta forma de poluição pode ter graves consequências para a biodiversidade e há espécies de plantas que podem mesmo desaparecer, alerta um novo estudo científico.

 

A eutrofização é causada pela presença em excesso de azoto e outros nutrientes, fenómeno gerado pela queima de combustíveis fósseis associados aos transportes e actividades industriais.

Esses nutrientes, como o azoto, depositam-se à superfície (através da chuva ou sedimentação) e levam ao crescimento em excesso de plantas que toleram o azoto e ao desaparecimento de outras, menos tolerantes.

 

Espécie de planta carnívora, muito sensível ao excesso de azoto, do género Drosera. Foto: Maria Alexandra Oliveira

 

Pelo menos 14% dos locais da Rede Natura 2000 da Península Ibérica Ocidental estão em risco de eutrofização, revela um novo estudo publicado na revista científica Atmospheric Environment.

Estes resultados surgem graças aos mapas da concentração e deposição de compostos de azoto e enxofre desenvolvidos por uma equipa de investigadores, coordenados pela investigadora Maria Alexandra Oliveira, do cE3c (Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Estes mapas têm o maior nível de detalhe até agora existente para Portugal Continental, com uma resolução espacial de 5km por 5km, quando os mapas anteriores tinham uma resolução de 10km por 10km a 50km por 50km. “Esta elevada resolução é crucial para identificar áreas em maior risco, onde os níveis críticos de deposição de poluentes estão a ser ultrapassados”, explica hoje um comunicado do cE3c.

“Os nossos resultados indicam que pelo menos 14% dos locais da rede Natura 2000 na Península Ibérica Ocidental estão em risco de eutrofização – mais do triplo do que se conhecia com os modelos anteriores”, comentou Maria Alexandra Oliveira.

 

Lobélia-acre (Lobelia urens). Foto: Sergio Chozas

 

A Rede Natura 2000 é uma rede de áreas protegidas composta por cerca de 26.000 locais que representam um quinto do território europeu, oferecendo proteção a espécies e habitats ameaçados da Europa.

Mas a área em risco de eutrofização poderá ser ainda mais elevada.

Isto porque para 64% dos locais da rede Natura 2000 ainda não existe informação sobre a capacidade crítica dos seus ecossistemas em tolerar excedências de azoto”, explicou.

Os novos mapas estão agora disponíveis online a todos os interessados. “Este é um importante contributo que agora está disponível. Apesar de a eutrofização ser considerada um dos factores mais associados às alterações globais, mapas com elevada resolução da deposição de azoto não existiam para Portugal”, acrescentou.

Conhecendo exatamente os locais com níveis elevados de poluentes e, por isso, em maior risco, é possível actuar com medidas concretas.

A investigadora acredita que estes mapas “poderão apoiar a implementação da Directiva Europeia de Tetos de Emissões (NEC) renovada em 2019, que ‘obriga’ os países da União Europeia a estabelecer limites máximos de emissões de alguns poluentes”.

Os investigadores disponibilizaram​ esta informação melhorada sobre a concentração de poluentes atmosféricos e deposição junto da Agência Portuguesa do Ambiente, para que possam ser implementadas medidas de gestão dos ecossistemas.

Este estudo resultou da colaboração de investigadores do Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais – cE3c e do Instituto Superior de Agronomia (ULisboa) e do Centro de Ecologia e Hidrologia do Reino Unido (UKCEH), no âmbito do projeto europeu NitroPortugalStrengthening Portuguese research and innovation capacities in the field of excess reactive nitrogen (2015-2018).

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.