Fogo obriga a evacuar Centro Nacional de Reprodução do Lince-ibérico

A aproximação do incêndio que começou a 3 de Agosto obrigou à retirada dos 29 linces-ibéricos do Centro Nacional de Reprodução do Lince Ibérico (CNRLI), situado na Herdade das Santinhas, Silves, anunciou hoje o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

 

“Os animais serão deslocados para instalações dos parceiros espanhóis, que já colocaram à disposição de Portugal todo o apoio necessário”, segundo um comunicado enviado esta tarde à Wilder.

A rede ibérica de reprodução do lince-ibérico em cativeiro é composta por mais quatro centros, além de Silves: El Acebuche (no Parque Nacional de Doñana, na Andaluzia), Zarza de Granadilla (Cáceres, na Estremadura espanhola), La Olivilla (em Jaén, Andaluzia) e Zoo de Jerez (em Jerez de la Frontera, na Andaluzia).

Esta é uma medida preventiva já prevista no Plano de Contingência, ativado desde domingo, 5 de Agosto. “Desde essa altura que estavam no local todos os meios humanos e materiais para defesa e evacuação do CNRLI”.

O incêndio que está a aproximar-se do CNRLI começou a 3 de Agosto na Serra de Monchique. Já terão ardido mais de 20.000 hectares.

 

Fêmea e crias no CNRLI. Foto: Joana Bourgard/Wilder (arquivo)

 

A acompanhar os linces estão técnicos do CNRLI e do ICNF, bem como a equipa de gestão do Centro, constituída por veterinários, tratadores e outros técnicos especializados. No terreno encontram-se ainda equipas de vigilantes da natureza e uma equipa do corpo de fuzileiros da Marinha, entre outros operacionais.

O ICNF desenvolveu, em 2017, ações de gestão de combustível na área envolvente aos cercados, edifícios e na área perimetral do CNRLI, de forma a diminuir o risco de incêndio e estabelecer faixas e mosaicos de proteção ao próprio centro.

 

Lince-ibérico. Foto: Programa de Conservação Ex-Situ

 

O CNRLI, onde já nasceram mais de 100 crias de lince, alberga 29 linces, seis dos quais (quatro fêmeas e dois machos) são crias que nasceram este ano e que terão cerca de cinco meses de idade.

 

O CNRLI

Este é o único centro português que integra a rede ibérica de reprodução deste felino Em Perigo de extinção.

O CNRLI, na Herdade das Santinhas, foi inaugurado a 22 de Maio de 2009, como medida de compensação pela construção da barragem de Odelouca. Para trás ficaram cinco anos de preparação.

A equipa técnica instalou-se no centro a 1 de Junho de 2009 – depois de meses de formação em Espanha – e o primeiro lince, a fêmea Azahar, chegou a 26 de Outubro de 2009, vinda do Zoo de Jerez.

 

 

Lá trabalha uma equipa de 13 pessoas que garante o seu funcionamento e que é coordenada por Rodrigo Serra, veterinário e director técnico. Há 16 cercados, cada um com 1.000 metros quadrados e câmaras de video-vigilância, e com capacidade máxima para 32 linces.

O grande objectivo do CNRLI, que não é visitável, é conseguir crias saudáveis, treiná-las para a liberdade e, meses depois, soltá-las na natureza, para que novas populações de linces voltem aos territórios de onde se extinguiram há décadas.

A primeira temporada reprodutora, que aconteceu em 2009/2010, resultou em três crias que não conseguiram sobreviver. Em oito anos, 74 de 103 crias conseguiram sobreviver. Dessas 74, 11 continuam no programa ibérico de reprodução em cativeiro, distribuídas pelos cinco centros de Portugal e Espanha. As outras 63 foram reintroduzidas na natureza, como reforço das populações selvagens, quase uma média de 11 por ano.

 

Sala de videovigilancia do CNRLI. Foto: Joana Bourgard/arquivo

 

O lince-ibérico tem tido uma história atribulada. No século XIX a população mundial da espécie estava estimada em cerca de 100.000 animais, distribuídos por Portugal e Espanha. Mas no início do século XXI restavam menos de 100. Então, os dois países juntaram-se para recuperar habitats e reproduzir animais. O programa Ex-Situ de reprodução em cativeiro é uma das peças deste quebra-cabeças conservacionista que ainda hoje não está resolvido.

Hoje, esta é uma espécie classificada desde 22 de Junho de 2015 como Em Perigo de extinção, depois de anos na categoria mais elevada atribuída pela União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN), Criticamente em Perigo.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Leia a nossa série “Como nasce um lince-ibérico” e conheça os veterinários, video-vigilantes, tratadores e restante equipa do CNRLI em Silves.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.