Fundo financia conservação de corais, berbigão e lapa gigante em Portugal

Três projectos estão prontos para começar a conhecer e a conservar espécies e habitats de invertebrados marinhos. Conheça os vencedores da 3ª edição do Fundo para a Conservação dos Oceanos anunciados ontem em Lisboa.

Nos últimos três anos, o Fundo para a Conservação dos Oceanos atribuiu 400.000 euros a oito projectos para conhecer e conservar a vida marinha. O primeiro ano foi dedicado às raias e tubarões, o segundo às espécies ameaçadas. Este ano, os invertebrados marinhos foram os escolhidos: “Invertebrados marinhos. Proteger no mar, o futuro na Terra”.

Mas, apesar da sua importância para os oceanos, os invertebrados marinhos “são um nicho. Por isso não sabíamos se iríamos receber muitas candidaturas. Acontece que recebemos 23, um recorde!”, comentou João Falcato, CEO do Oceanário do Lisboa e administrador da Fundação Oceano Azul.

O responsável falava ontem à tarde no auditório do Oceanário de Lisboa na sessão onde foram anunciados os três projectos vencedores da 3ª edição do Fundo, com um total de 150.000 euros. Estes foram escolhidos por um júri de especialistas nacionais e internacionais na área da conservação.

Vencedores desta edição do Fundo. Foto: Fundação Oceano Azul

O projecto que recebeu a maior fatia, 59.700 euros, é o DEEPbaseline, dedicado a melhorar o conhecimento sobre os corais e as esponjas que vivem em zonas entre os 20 e os 750 metros de profundidade, na plataforma continental portuguesa.

As esponjas e os corais formam habitats como “jardins”, agregações e recifes, especialmente em zonas profundas. O seu papel no equilíbrio dos ecossistemas marinhos é “extremamente importante”, disse ontem Joana Xavier, investigadora do Ciimar (Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental) da Universidade do Porto.

“São reservatórios de biodiversidade, contribuem para a reciclagem de nutrientes e são zonas de alimentação, habitat e maternidade para inúmeras espécies de peixes.”

Nos dois anos e meio do projecto DEEPbaseline, a equipa – da qual fazem também parte o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) e a Universidade dos Açores – vai criar um mecanismo para a criação de uma base de conhecimento sobre a diversidade de corais e esponjas.

Esse conhecimento será construído com a ajuda de pescadores e com vários métodos de recolha de dados para criar um mapa das principais ocorrências daquelas espécies.

O grande objectivo é usar essa informação para promover acções sustentáveis de conservação e gestão de corais e esponjas e dos ecossistemas onde vivem. Segundo Joana Xavier, esses dados ficarão disponíveis para todos, de forma gratuita.

Isto porque, frisou a investigadora, estes “são ecossistemas extremamente vulneráveis”, principalmente aos impactos causados pela pesca, exploração petrolífera e alterações climáticas.

Berbigão em Aveiro e lapa gigante nas Selvagens

O COACH é outro dos projectos que recebeu financiamento para avançar, mais concretamente, 56.775 euros. O que se propõe fazer é descobrir qual o estado da população de berbigão (Cerastoderma edule) da Ria de Aveiro. Os investigadores do CESAM (Centro de Estudos do Ambiente e do Mar) da Universidade de Aveiro vão determinar a sua distribuição, abundância, dinâmica e saúde reprodutiva, além de identificar as maiores causas do seu declínio/sucesso e promover o desenvolvimento sustentável da apanha de berbigão.

Luísa Magalhães, investigadora da Universidade de Aveiro que apresentou o projecto, lembrou que existe apanha ilegal de berbigão na Ria de Aveiro. “Não há um uso sustentável do berbigão. Mas hoje é muito difícil fazer planos de gestão eficazes porque não há informação sobre a biologia da espécie, incluindo informação sobre o seu ciclo reprodutor, por exemplo.”

A acrescentar à pesca ilegal, o berbigão enfrenta outras ameaças, como doenças, sobrepesca, gestão ineficiente e degradação das condições ambientais.

A lapa gigante das ilhas Selvagens é a espécie alvo do outro projecto escolhido pelo Fundo para a Conservação dos Oceanos, com um financiamento de 33.525 euros.

O projecto The Selvagens’ Limpet Project quer responder a várias perguntas: será a lapa Patella candei uma espécie exclusiva das ilhas Selvagens ou é a mesma que existe nas ilhas Canárias, cuja população está praticamente extinta? “Esta clarificação será determinante na definição de um estatuto de conservação para a espécie (…) e na implementação de medidas concretas de conservação”, segundo os responsáveis pelo projecto.

A lapa gigante das ilhas Selvagens, de cor clara, é talvez um dos invertebrados marinhos mais ameaçados do Atlântico Nordeste. Vive na zona entre marés e alimenta-se de algas, o que lhe dá um papel fundamental no controlo do crescimento dessas mesmas algas.

Outrora, esta lapa era comum nas Selvagens, na zona entre marés. Era frequente encontrar-se uma grande abundância de lapas de grandes dimensões (10 a 15 centímetros). No entanto tornou-se rara por causa da apanha para consumo.

Agora, este projecto – coordenado pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias e que conta com a participação do Museu de História Natural do Funchal, do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve e do Instituto Português de Malacologia – vai estudar esta espécie do ponto de vista genético para descobrir se é uma espécie diferente ou não.

Outro dos objectivos é “identificar quais os locais que devem ser considerados habitats prioritários, com medidas de conservação”, explicou Gonçalo Calado, investigador da Universidade Lusófona que apresentou o projecto.

A lapa gigante das Ilhas Selvagens é apenas uma peça do puzzle dos invertebrados marinhos de Portugal. E estes são apenas parte da riqueza dos oceanos.

O Fundo para a Conservação dos Oceanos – lançado em 2017 pelo Oceanário de Lisboa e pela Fundação Oceano Azul – é atribuído todos os anos e financia projetos científicos que contribuam para a conservação dos oceanos.


Saiba mais.

Recorde aqui os vencedores da 1ª edição do Fundo e aqui os vencedores da 2ª edição.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.