Gonçalo Santos descobriu uma nova espécie de orquídea para a Irlanda

Epitactis dunensis. Foto: Gonçalo Santos

Licenciado em Química e apaixonado por Botânica, este português de 28 anos está a viver em Dublin e dedica-se ao registo de espécies de plantas selvagens da Europa.

Foi em 2014 que Gonçalo Santos foi por acaso a um horto e deparou com uma enorme variedade de espécies. Desde essa data, nunca mais parou de aumentar o seu conhecimento sobre o mundo das plantas.

“Descobri que a minha verdadeira paixão é a botânica”, contou à Wilder. Nesse mesmo ano, começou por cultivar plantas aromáticas na varanda, mas o pouco espaço disponível inspirou-o a procurar outras possibilidades.

Foi assim que, depois de obter o acordo dos vizinhos, Gonçalo aproveitou um terreno baldio junto ao prédio onde morava, perto de Lisboa, e começou a construir um jardim. “No pico da sua existência, contava com mais de 500 espécies diferentes”, incluindo númeras espécies de hortelãs, oregãos, sálvias e muitas outras plantas.

Seguiu-se em 2016 a criação de um blogue, Something in the Yard, tal como perfis no Facebook, Twitter e Instagram. “Tudo isso permitiu-me divulgar o meu trabalho e a minha paixão, bem como criar novos contactos”, explica este português.

Dois anos depois, em busca de melhores condições de vida, partiu para Dublin, na Irlanda. Teve de deixar o jardim que tinha criado em Portugal, mas foi na capital irlandesa que se passou a dedicar em exclusivo ao registo de espécies selvagens europeias, enquanto continuava – e continua – em busca de um trabalho na área botânica.

Gonçalo Santos numa expedição nas dunas de Portmarnock, na Irlanda, junto a plantas da espécie Centranthus ruber.

No que respeita às orquídeas, por exemplo, definiu duas grandes missões: “Rever o maior número de espécies diferentes das que já vi até hoje e encontrar espécies em estado selvagem nunca antes vistas por mim”, explicou num texto publicado no blogue, em 2019. Nesse ano, por exemplo, visitou seis países entre Maio e Agosto – Portugal, Irlanda, Áustria, Hungria, Polónia e Eslováquia – onde fotografou 37 espécies de orquídeas, de 13 géneros diferentes.

Graças ao Instagram

Foi em Julho de 2019 que Gonçalo, durante mais uma saída de campo em busca de orquídeas silvestres, deparou com uma nova espécie para a flora irlandesa. “Chama-se Epipactis dunensis e até à data era endémica do Reino Unido”, contou à Wilder, referindo-se a uma orquídea que em Inglaterra é conhecida pelo nome comum “heleborina-das-dunas” (‘dune helleborine’, em inglês).

Orquídea da espécie Epipactis dunensis. Foto: Gonçalo Santos

Foi através do Instagram, aliás, que soube qual era a verdadeira identidade desta planta. “Naquele dia, após a minha saída de campo, publiquei a fotografia no Instagram como sendo uma Epipactis helleborine. Rapidamente Mike Waller entrou em contacto comigo explicando que aquela espécie era uma Epipactis dunensis.”

Alertado para o facto de ter nas mãos a descoberta de uma orquídea que até então só era conhecida no Reino Unido, Gonçalo regressou ao local. “Nos dias seguintes continuei à procura de novas populações e no final da época das orquídeas, contabilizei algumas dezenas de plantas ao longo de uma área de cerca de 10 quilómetros ao longo de um rio.”

Epitactis dunensis. Foto: Gonçalo Santos

O passo seguinte foi contactar um horticultor e especialista em orquídeas do Jardim Botânico de Glesnevin, em Dublin, Brendan Sayers. Em 2020, ambos publicaram um artigo científico sobre a descoberta.

Mas este apaixonado por botânica não se ficou por aqui. Junto do local onde se tinha deparado com a nova espécie para a Irlanda, encontrou também “uma nova pequena população da rara orquídea Epipactis phyllantes, com duas plantas”.

Orquídea da espécie Epipactis phyllanthes. Foto: Gonçalo Santos

“Ambas as populações descobertas por mim destas duas orquídeas estão a ser monotorizadas pelo Rare Plant Monitoring. Infelizmente em 2020 não obtivemos resultados conclusivos e realistas, devido à pandemia que limitou muito as nossas deslocações para as saídas de campo.”

Já este ano, foi convidado para participar na conferência de Primavera da Botanical Society of Britain and Ireland, transmitida online, onde deu a conhecer a sua história. Uma das maiores preocupações que tem, revelou, é quanto ao futuro das orquídeas que descobriu. “Estas duas espécies ocorrem em zonas suburbanas de comércio e lazer e são vulneráveis à actividade humana. Por isso devemos manter estes locais o mais secretos possível”, comentou, ouvido por uma centena de interessados nas floras britânica e irlandesa.

Gonçalo apelou também a que mais pessoas partilhem em redes sociais como o Instagram as imagens das plantas selvagens que encontram, para que aumente a troca de informações e mais histórias como a sua possam acontecer.


Saiba mais.

Fique a conhecer melhor as experiências botânicas de Gonçalo Santos no seu blogue Something in the Yard e ouça também a entrevista que deu no podcast Nature Magic.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.