Sudan, deitado
Foto: OI Pejeta

Há uma nova esperança em laboratório para o rinoceronte-branco-do-norte

Pensava-se que já estaria definitivamente condenado à extinção, mas os cientistas ainda guardam uma última réstia de esperança para o rinoceronte-branco-do-norte, anunciaram esta semana.

 

Quando em Março passado Sudan morreu de velhice, desapareceu o último macho de rinoceronte-branco-do-norte em todo o mundo, e esta subespécie parecia ter os dias contados. Afinal, sobrevivem apenas duas fêmeas inférteis.

Mas uma equipa de cientistas anunciou, num artigo publicado esta quarta-feira na Nature Communications, que conseguiu fazer crescer embriões onde está preservado o ADN do rinoceronte-branco-do-norte – uma última luz ao fundo do túnel, mas também uma verdadeira corrida contra o tempo.

O habitat natural situava-se nalguns países africanos que têm sido atingidos fortemente por conflitos armados e pela caça furtiva, como a República Democrática do Congo, o Sudão e a República Central Africana. Isso levou ao rápido declínio de uma população que já na década de 1960 se resumia apenas a 2.000 destes animais.

A partir de uma nova técnica de reprodução assistida, acreditam agora que seja possível reconstruir uma população viável. “O nosso objectivo é termos em três anos a primeira cria nascida”, disse aos jornalistas o gestor de reprodução do Leibniz Institute for Zoo and Wildlife Research, em Berlim, Thomas Hildebrandt.

“Tendo em conta que são 16 meses de gravidez, temos pouco mais de um ano para conseguirmos uma implantação de sucesso”, explicou Hildebrandt, citado numa notícia da Phys.org.

A equipa de cientistas utilizou um aparelho com cerca de dois metros para extrair os óvulos que deram origem a estes embriões, os primeiros de rinoceronte produzidos in vitro, dentro de um laboratório, e por agora crio-preservados. Para já trata-se de embriões híbridos, resultado do esperma congelado de machos de rinoceronte-branco-do-norte e de óvulos de fêmeas de rinoceronte-branco-do-sul, mantidas em zoológicos. Desta última subespécie, também afectada pela caça furtiva, sobrevivem cerca de 21.000 indivíduos na natureza, no Sul de África.

 

fêmea de rinoceronte deitada
Recolha de óvulos numa fêmea de rinoceronte-branco-do-sul. Foto: Leibniz-IZW

 

O próximo passo é repetir o mesmo processo, mas com óvulos que seriam recolhidos das duas fêmeas que restam de rinoceronte-branco-do-norte. Najin e Fatu, a filha e a neta de Sudan, vivem actualmente num parque nacional do Quénia. A equipa já pediu autorização às autoridades locais e espera fazê-lo antes do final do ano.

 

Quais seriam os riscos?

“Temos de fazer uma anestesia total, o animal tem de ficar deitado durante duas horas, e é uma situação muito arriscada”, ainda mais com apenas duas fêmeas ainda vivas, admitiu o cientista alemão. “Temos muito receio de que algo de inesperado aconteça, isso seria um pesadelo.”

Se tudo correr bem, os embriões vão ser implantados em fêmeas de rinoceronte-branco-do-sul.

Outro risco é a falta de diversidade genética – com sémen preservado de apenas quatro machos já mortos e só duas fêmeas vivas – que coloca em questão a viabilidade de qualquer nova população, avança a equipa.

Neste caso, a esperança dos investigadores assenta nas células de pele congeladas de 12 machos de rinoceronte-branco-do-norte, que não eram aparentados entre si. A partir dessas células, recorrendo à tecnologia de células estaminais, esperam desenvolver novos óvulos e esperma em laboratório, o que “iria alargar substancialmente a diversidade genética fundadora da futura população”, afirmam, num comunicado do Leibniz Institute for Zoo and Wildlife Research.

Se a nova estratégia tiver sucesso, a esperança pode estender-se além deste mamífero, hoje o mais ameaçado do mundo.

“Combinar a pesquisa em células estaminais com as técnicas de reprodução assistida agora desenvolvidas vai fornecer uma pista sobre como salvar espécies altamente ameaçadas, que já baixaram para números em que os esforços convencionais de conservação se revelam impossíveis”, sublinham os cientistas.

 

 

 

 

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.