Lobo-ibérico. Foto: Arturo de Frias Marques/Wiki Commons

Inaugurada Casa da Biodiversidade para promover convívio entre Homem e lobo

Hoje é inaugurada a Casa da Biodiversidade de Paredes de Coura (Viana do Castelo) para promover o convívio entre as comunidades locais e as duas alcateias de lobo-ibérico que vivem no território.

 

“A Casa da Biodiversidade não é o espaço do lobo, é o espaço das pessoas que precisam de ajuda para poder lidar com o lobo. Precisam de ajuda para se proteger, conhecendo-o bem e evitando os seus prejuízos e, sobretudo, para saber como devem agir para serem ressarcidas quando não foi possível protegê-las”, explicou ontem à Agência Lusa o presidente da Câmara de Paredes de Coura, Vítor Paulo Pereira, citado pelo Diário de Notícias.

Localizada no Lugar de Corredouras, esta era a antiga sede da Junta de Freguesia da Castanheira, recuperada e transformada agora na Casa da Biodiversidade. É apenas uma das peças do projecto “O Lobo e o Homem”, em curso para tentar resolver o conflito entre as comunidades locais e o último predador de Portugal, o lobo-ibérico (Canis lupus signatus).

“Para nós, neste conflito não existe o lado do lobo e o lado do homem, só existe o lado do problema e o lado das soluções. Nós queremos estar, definitivamente, do lado das soluções”, acrescentou o autarca.

A Casa será um espaço de apoio aos proprietários lesados pelo ataque dos lobos e de investigação científica, servindo de estação de campo do CIBIO-InBIO (Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genético da Universidade do Porto)”.

Além de uma sala ampla, a Casa da Biodiversidade terá instalações cedidas aos investigadores daquele Centro. “Aí faremos uma série de estudos científicos sobre lobo-ibérico e sobre outras espécies que vivem na Paisagem Protegida de Corno de Bico”, no concelho, explicou ontem à Wilder Francisco Álvares, investigador do CIBIO-InBIO que trabalha em lobo há mais de 30 anos.

Além da Casa da Biodiversidade, o projecto “O Lobo e o Homem” tem vindo a implementar várias medidas para apoiar os proprietários lesados pelo lobo, como por exemplo, a doação de cães de gado, e para conservar o habitat do lobo.

Hoje, durante a cerimónia de inauguração da Casa da Biodiversidade será assinado o protocolo de gestão florestal gratuita entre a ACHLI – Associação da Conservação do Habitat do Lobo Ibérico e a Comunidade Local do Baldio de Castanheira, espaço com cerca de 100 hectares. O objectivo é recuperar o bosque autóctone e os animais que lá vivem.

“Este é o resultado de uma junção de vontades, de pessoas que querem fazer coisas”, comentou Francisco Álvares. São os primeiros passos de um “modelo pioneiro de desenvolvimento sustentável do território.”

Na região vivem duas alcateias de lobos, com uma média de seis lobos adultos. “Não são alcateias como as da Peneda-Gerês, são muito mais pequenas”, explicou. Uma desapareceu entre 2002 e 2008 e recolonizou o território, naturalmente, a partir de 2009. Esta alcateia (a Sul de Paredes de Coura) em 20 anos (de 1996 a 2015) apenas se reproduziu em quatro anos. A outra alcateia (a Norte de Paredes de Coura) esteve ausente entre 1997 e 2009. Em 2010 voltou, mais uma vez, naturalmente.

Ainda no domingo passado, um lobo-ibérico foi encontrado morto numa armadilha ilegal em Paredes de Coura. A GNR está a investigar o caso.

O lobo-ibérico é uma espécie protegida em Portugal, desde que a Lei nº90/88, de 13 de Agosto, estabeleceu pela primeira vez as bases para a protecção desta espécie. Em 2005 foi classificado com o estatuto de Em Perigo (Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal).

É o único membro que resta da família dos grandes predadores de Portugal. Hoje apenas existem lobos no Alto Minho, Trás-os-Montes e numa região a Sul do Douro.

A população ibérica está estimada em cerca de 2.000 lobos em 350 alcateias, num território de 140 mil quilómetros quadrados. Esta população sofreu um declínio severo desde o início do século XX até aos anos 1970 por causa da perseguição intensa. Nas últimas décadas, a população tem vindo a expandir-se. Mas nem em todos os locais.

Parte da população ibérica continua em declínio, especialmente a Sul do Douro e na Serra Morena.

Em Portugal, o mais recente censo nacional ao lobo-ibérico, de 2002/2003, identificou 63 alcateias (51 confirmadas e 12 prováveis) no Norte e Centro do país. A população foi, então, estimada entre 220 e 430 animais. Mais tarde, estudos compilados entre 2003 e 2014 deram conta da existência de 47 alcateias (41 confirmadas e seis prováveis).

Na cerimónia estarão presentes o ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, e a Secretária de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza, Célia Ramos.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Recorde a crónica de Miguel Dantas da Gama dedicada ao lobo-ibérico e o fotógrafo que seguiu durante meses os lobos da Peneda-Gerês.

 

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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.